Seleção fez política da arminha e tabelou com Bolsonaro

Legenda: Os jogadores da Seleção Brasileira divulgaram manifesto contra a Copa América após o jogo contra o Paraguai pelas eliminatórias
Foto: Lucas Figueiredo/CBF

Na retranca da quarentena, com pavor do Coronavírus e ainda sem a vacina, o camarada se põe carente e acredita em tudo nesse mundo, inclusive que sairia um posicionamento mais corajoso da Seleção Brasileira sobre a realização da Copa América. Ao não citar nem mesmo quase 500 mil brasileiros mortos pela Covid-19, a equipe fez uma tabelinha, em matéria de negacionismo e insensibilidade, com o governo federal. Se o objetivo era não se meter em política, como pretendia, o time errou feio na defensiva e simplesmente se lambuzou de bolsonarismo. Das chuteiras até à faixa do capitão.

A essa altura a singela cartinha, com adornos patrióticos, já evaporou do “story” da rapaziada. Sumiu do Instagram, mas ficará na memória como uma omissão histórica de personalidades que poderiam contribuir para esse momento triste do país. Nem um genérico reforço sobre a campanha de vacinação foi mencionado. Nada de viva o SUS. Um não-manifesto de um grupo que se diz coeso, porém se revelou anestesiado dos problemas de saúde pública.

“Quando nasce um brasileiro, nasce um torcedor”, diz a nota oficial. E quando morre quase meio milhão desses mesmos possíveis fãs da Seleção Brasileira? É só uma dúvida de quem leva em conta a influência de vocês para milhões de jovens que amam futebol e querem ficar vivos, apesar das autoridades crentes nas receitas do charlatanismo e na imunidade de rebanho.

A singela cartinha se revelou tão alienada quanto uma missiva que a dona Lúcia remeteu ao Felipão e ao Parreira depois do 7x1 da Copa de 2014. Quase plágio, em matéria de desligamento do mundo real. Até a crítica do grupo à Conmebol pareceu um cordial puxão de orelha de uma vovó nos seus netinhos.

Nesse trecho, porém, prevaleceu o puro creme da vaidade: “Nos manifestamos, também, para evitar que mais notícias falsas envolvendo nossos nomes circulem à revelia dos fatos verdadeiros”. Que notícias? No país em que o próprio presidente da República espalha fake news como se fabrica pílulas de cloroquina, não há cabimento especular sobre o medo de fofocas futebolísticas.

Fiquei pistola, confesso. Esse zelo com a imagem do grupo, no entanto, me pareceu mais para a tragicomédia narcisista. Ao ponto de me lembrar do Coalhada, o craque (injustiçado) do elenco do cearense Chico Anysio. Conhecido também como Otávio Arlindo Antunes do Nascimento, o personagem diria: “Mas hein, mas hein? Que o Coalhada é isso, que o Coalhada é aquilo”. Quem lembra da figura?

*O texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.



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