Faroeste da semana em Brasília: “Por um punhado de dólares”

Legenda: Protesto em Brasília contra suposto esquema de corrupção na compra de vacinas
Foto: Evaristo Sá/AFP

Os escândalos do governo Bolsonaro esta semana em Brasília me levaram direto ao escurinho do Cine Eldorado, em Juazeiro do Norte, quando vi, pela primeira vez, nos anos 1970, “Por um punhado de dólares”, clássico do “western spaguetti” dirigido por Sérgio Leone, filme com o ator Clint Eastwood no papel do cavaleiro solitário que matava por encomenda.

No faroeste caboclo da capital federal, a morte de muitos brasileiros estaria ligada à propina da vacina — um dólar por cada dose do imunizante, segundo relato de Luiz Paulo Dominguetti Pereira, representante da empresa Davati Medical Supply, à repórter Constança Rezende, da Folha de S. Paulo. 

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A proposta foi feita por Roberto Ferreira Dias, ex-diretor de logística do Ministério da Saúde, em um restaurante chique de um shopping brasiliense, mas bem que poderia ter acontecido em um saloon do velho Oeste.

De dólar em dólar, a fatura ficaria em U$ 400 milhões, levando-se em conta o lote da vacina AstraZeneca que havia sido oferecido. De agora em diante, só o duelo ao sol na CPI da Pandemia – entre estes e outros personagens – nos dará as respostas na poeira do centro-oeste.

Na tentativa de pagar de mocinho, o caubói Jair Bolsonaro, em seus “Dias de Ira” (para seguir no estilo western spaguetti) alvejou os investigadores do Senado: “Não conseguem nos atingir. Não vai ser com mentiras ou com CPI, integrada por sete bandidos, que vão nos tirar daqui”.

Filme Por um Punhado de Dólares
Legenda: Cena do clássico "Por um Punhado de Dólares"
Foto: Reprodução

Para forçar o xerife da Câmara, Arthur Lira, a aceitar a ideia do impeachment do chefe dos federados, até mesmo a carruagem dos bolsonaristas arrependidos se juntou à diligência da oposição no cerco ao forte governista.

Comparações ao faroeste à parte, a nostalgia cinematográfica me trouxe a sensação de um “Cinema Paradiso” com as sessões vespertinas de sábados e domingos. Sempre no Eldorado ou no cine Plaza. Os terrenos de ambos, no centro de Juazeiro, hoje servem de lojas e estacionamentos. Pena. Quando passo na frente, ainda escuto as trilhas de Ennio Morriconne se espalhando por todo aquele vale do Cariri, pradarias e estepes do Araripe.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.