O resultado das urnas, no dia 2 de outubro, mais uma vez reacendeu a polêmica envolvendo as pesquisas eleitorais. O que circulou nas redes sociais nessa última semana foi a tentativa da criminalização de levantamentos estatísticos e institutos que há anos atuam no mercado e na política. Falam até em Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).
O grande questionamento se dá em torno da diferença do que apontavam os números de institutos de pesquisa quanto às intenções de voto na candidatura presidencial de Jair Bolsonaro (PL). Para muitos, houve fraude na tentativa de esconder a preferência do eleitorado do presidente da República.
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O deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), aliado do presidente, se movimenta para emplacar um projeto de lei na Câmara dos Deputados que transforma em crime a publicação de pesquisas eleitorais que divulgue números fora da margem de erro em comparação com o resultado eleitoral.
Segundo a proposição do parlamentar, o profissional estatístico é quem vai responder criminalmente pela "irregularidade". O projeto prevê a prisão do responsável pelo levantamento que pode variar entre 4 e 10 anos, além de multa.
Nesta terça-feira (18) está na pauta da Câmara dos Deputados a análise do Projeto de Lei do deputado federal Rubens Bueno (Cidadania-PR) que define uma teoria para “pesquisa fraudulenta” e estabelece multas que variam entre R$ 500 mil a R$ 1 milhão para a institutos que divulguem levantamentos fora da margem de erro a cinco dias da eleição.
É compreensível que uma parcela significativa do eleitorado desconheça o funcionamento das pesquisas estatísticas – mas não para os parlamentares que têm obrigação de fundamentar projetos de lei.
O sistema de captação social acaba se “popularizando” apenas em épocas de levantamentos para medir a preferência do eleitorado entre as candidaturas postas – o que ocorre de dois em dois anos.
Mas na realidade, as pesquisas estão campo todos os dias – mesmo quando não temos eleições –abordando políticas sociais e mercado.
Não é nada simples transmitir ao grande público o que é margem de erro, nível de confiança e metodologia. Podemos falar em erro de pesquisa? É um campo infinito a explorar.
A imprensa ainda não abriu amplo espaço para esse debate. Nas escolas o assunto passa longe de ser abordado como uma necessidade de conhecimento. Em uma disputa eleitoral extremamente equilibrada, pesquisas estatísticas, que nada mais são do que ciência, entram no rol da polarização.
Por conta do distanciamento com o tema, surgem questionamentos. O problema é que aparecem também ataques a profissionais e instituições sérias que atuam no mercado sem polêmicas quando não estão produzindo em períodos eleitorais.
O (e)leitor, ao esperar que uma pesquisa lhe entregue o percentual exato do resultado eleitoral, encontrará sempre uma frustração no caminho. Ou quase sempre. A estatística não é matemática. O compromisso é outro.
A estatística trabalha probabilidades, faz previsões, indica tendências. Nesse processo, há várias maneiras de obter essas informações.
Em uma pesquisa eleitoral, por exemplo, esses dados podem ser colhidos por telefone ou no formato presencial, por exemplo. A quantidade de pessoas entrevistadas também varia de acordo com a proposta oficializada entre o contratante e contratado.
Teorias são aplicadas para garantir uma avaliação científica e segura para o contratante. Não existe pesquisa estatística sem o amparo teórico. Fora isso, não é estatística.
A ciência é sempre movimento. A estatística, claro, pode ser contestada a fim de melhorá-la. Assim é a ciência. Mas jamais para criminalizá-la sem provas.
Se recorrermos aos institutos sérios que publicaram levantamentos para as eleições presidenciais no primeiro turno, não é honesto apontar "erro" por não haver exatidão no que revelaram as urnas.
Na véspera da eleição, o Ipec, contratado pela TV Globo, indicava Lula (PT) com 51%, Jair Bolsonaro (PL), com 37%, Ciro Gomes (PDT), com 5% e Simone Tebet (MDB), com 5%. O cenário, portanto, em votos válidos.
No dia 26 de setembro, Lula (PT) tinha 52% e Bolsonaro (PL) aparecia com 34%. No intervalo de cinco dias, o petista oscilou para baixo e o presidente subiu 3 pontos percentuais.
A leitura que se pode fazer é a existência de uma tendência de crescimento por parte da candidatura do presidente da República – o que acabou se confirmando. Inclusive com a redução nos índices de Ciro e Tebet, que encerraram com 3% e 4% respectivamente.
A avaliação que se pode fazer é uma migração ainda no primeiro turno dos votos que seriam dados na senadora e no ex-ministro. Do ponto de vista da estatística, é extremamente natural que essas movimentações ocorram. Não é de hoje que esse fenômeno é percebido.
Se a tendência captada pelo instituto estava de fato acontecendo, o índice de Lula (48%) e Bolsonaro (43%) é completamente previsível dentro do que os números estavam indicando na semana anterior do primeiro turno da eleição – considerando a margem de erro.
Embora o instituto não tenha cravado os números – já que nunca foi obrigação do levantamento – os estatísticos responsáveis pelo estudo acertaram a tendência de vitória do Lula na disputa de domingo (2). O voto útil que estava sendo demandado pela campanha do ex-presidente petista também funcionou para a candidatura de Bolsonaro.
É claro que em uma disputa com muitos candidatos e um índice ainda alto de indecisão, como é o caso em pleitos para o Senado, a movimentação pode ser mais espaçada, mas sempre precisa ser observada do ponto de vista da tendência, do que os números estão indicando.