Perto dos cem anos de vida, recolhida dos eventos e aparições públicas, Lygia Fagundes Telles é e sempre será uma das maiores escritoras em Língua Portuguesa. São muitos anos criando narrativas, publicando livros, concedendo entrevistas, pensando a relação entre a vida e a palavra.
Temos muito a aprender com Lygia. Algumas das suas constatações sobre viver e escrever estão reunidas no livro “Durante aquele estranho chá”, crônicas de memória com feição de contos, no estilo sofisticado e elegante que é a sua marca.
A primeira lição que aprendemos com ela é de valor inestimável: a coisa mais importante de uma carreira são os amigos que fazemos, as relações de afeto e admiração trazidas pela profissão.
Este livro é, também, uma homenagem aos grandes amigos de Lygia e a alguns encontros que marcaram sua trajetória.
Ela conta, com amor e graça, dos seus momentos com Clarice Lispector, Hilda Hilst, Monteiro Lobato, Simone de Beauvoir, Mario de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Jorge Luís Borges, entre outros nomes que atravessaram o seu pensamento de forma definitiva, deixando suas marcas.
Da convivência com Clarice, há a segunda lição: o de não se levar a sério demais, não partir do pressuposto da superioridade.
Em um congresso de escritores em Cali, na Colômbia, as duas estranharam as caras muito sisudas, a pose, o peito estufado, a vaidade, a fala rebuscada dos colegas. Trocaram tudo isso por uma rodada de vinho e espumante, uma conversa leve. Lygia foi ao evento preparada para dizer que a literatura é como os anjos, não tem gênero, mas, ao invés disso, teve de explicar para a plateia colombiana que brasileiros falam português.
A terceira lição é sobre a pressa que os jovens escritores tem de aparecer de qualquer maneira. Ela mesma se arrepende dos livros que publicou cedo demais, custeando a edição. É mais prudente ter paciência, deixar que a vida mostre as coisas que o autor precisa saber para que o texto tenha profundidade, camadas, sentido.
“Um escritor desesperado é uma contradição”, ela disse.
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A quarta lição ela aprendeu com Jorge Luís Borges: o mais importante da vida é o sonho. Quando ela pergunta que mensagem ele poderia deixar naquela despedida, ele comenta sobre um amigo que desistiu de viver quando desaprendeu a sonhar. Isso é central, importante, é dínamo perpétuo.
A quinta lição aparece quando ela conta a reação de Carlos Drummond de Andrade às críticas que Mario de Andrade fez à sua poesia. Apenas seguiu. “A vida não era uma ordem? Então, toca a prosseguir implacável, fiel consigo mesmo numa caminhada não sobre nuvens, mas na dureza do asfalto. Acariciando não a cabeleira da fantasia, mas agarrado aos ásperos cabelos do cotidiano e no qual se há radiosas estrelas”.
Amar os amigos; não derrapar no orgulho e na vaidade; ter paciência; acreditar nos sonhos e aceitar a vida como uma ordem, sendo fiel a si mesmo. São apenas cinco das muitas coisas que aprendemos lendo Lygia Fagundes Telles, uma brasileira que nos faz lembrar do valor imenso do nosso País.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião da autora.