Informar para a vida, não para a morte

Um amigo brigadista informou que estava no ônibus voltando para casa, quando presenciou uma vizinha debatendo com o marido a importância de ir ao hospital, pois os sintomas que manifestava como dor nos olhos, tosse seca e febre, eram característicos da Covid-19. Ao descer do ônibus, na mesma parada do casal, curioso, ainda os acompanhou por curta distância e ficou chocado ao escutar daquele homem que não iria ao hospital, pois temia injetarem veneno no seu corpo para aumentar o número de mortes e contabilizá-lo na “conta da Covid-19”. E não foi mesmo.

Três dias depois encontrou novamente a vizinha na rua, voltando do hospital, com sintomas parecidos ao do marido. Meu amigo a reconheceu e logo perguntou sobre a situação de seu marido. Triste e com os olhos marejados a mulher informou que ele havia falecido. Ou seja, uma verdadeira tragédia, um homem pela desinformação, digo, pela disponibilidade de informações falsas, veio a óbito e contaminou sua esposa.

Em pesquisa realizada pela CUFA, Instituto Locomotiva e Data Favela, entre os dias 09 e 11 de fevereiro de 2021, com 2.087 pessoas, entre homens e mulheres moradores de favelas das cinco regiões do Brasil, os dados obtidos confirmam o fenômeno acima descrito. Inclusive, analisamos com preocupação os resultados da pesquisa, em um cenário sem calendário certo para vacinação da maioria da população e bombardeado cotidianamente pela guerra de falsas informações.

As chamadas Fake News estão inundando a internet, particularmente, os grupos de WhatsApp, com todo tipo de receita mirabolante para prevenção e cura da Covid e teorias conspiratórias sobre as vacinas, a partir de argumentos mágicos e mentirosos, e, porque não dizer, mortais.

Na citada pesquisa, 74% dos moradores de favelas querem receber vacinas contra o coronavírus, o que é positivo, apesar das campanhas sistemáticas de notícias falsas nos aplicativos de conversas instantâneas. 46% relatam ter recebidos fake news relacionada à vacina pelas redes sociais. Esse quadro se agrava, quando constatamos que 84% dos entrevistados informaram que um parente ou amigo já foi infectado. Embora, 96% considerem a vacina um mecanismo importante para a recuperação econômica do país e 99% dos moradores acreditem que a Covid-19 é um problema sério e que deve ser tratado com muito cuidado, alguns dados foram reveladores sobre o perigo das Fake News.

Quando questionados sobre os medos que permeiam os moradores de favela em relação à imunização, 58% têm medo da vacina não imunizar contra as novas variantes, 53% temem que a vacina não faça efeito ou as protejam do vírus e 46% têm medo de ter algum tipo de reação, ou passar mal com a vacina. Contudo, outros medos são preocupantes e revelam a tsunami de desinformação, pasmem: 31% têm medo de que a vacina faça com que contraia o vírus e 22% têm medo que a vacina altere o seu DNA ou instale um chip no seu próprio organismo.

Diante desse cenário, fica evidente que tão importante quanto à vacina, é uma ampla campanha de informação para possibilitar leituras concretas sobre a realidade e a capacidade de discernimento na população. E como a CUFA acredita que a colaboração coletiva é o caminho, aceitamos o convite para compor o Movimento Unidos pela Vacina, articulação da sociedade civil liderada pela empresária Luíza Trajano, e dialogando com lideranças como Celso Athayde e Edu Lyra,  vamos propor a organização de Comitês nas favelas que contribuam para promoção da informação e da vacinação nestes territórios, onde movimentos e organizações como UNEGRO, além de líderes como Katiana Pena, Renê Silva e Raul Santiago, só para citar alguns, são fundamentais nesse movimento cívico e apartidário que têm como foco a vida.  Juntas, essas inteligências e expertises, em torno do firme combate ao negacionismo e às notícias falsas e pela valorização da ciência, são definidoras de morte ou vida.

Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor