Uma das grandes características dos cantos cearenses é a originalidade da voz de seus intérpretes, muitas vezes não compreendida pela crítica, mas sempre louvada pelo sensível público. A voz de Antônio Carlos Belchior, por exemplo, é diferente de tudo já visto, assim como a de Raimundo Fagner, Rodger Rogério, Fausto Nilo, Calé Alencar e tantos outros que levam a identidade do Ceará em sua arte.
Dentre esses fiéis representantes do estado está uma jovem senhora de olhar doce, sorriso largo e com uma vitalidade enorme. Lúcia Menezes, a quem muitos chamam carinhosamente de Lucinha, possui uma característica própria e que consegue projetar uma força e um amor enorme pelo que ali representa e que neste 2020 anuncia boas notícias.
No próximo mês, a cantora lançará, pela gravadora Atração, um álbum com treze faixas de músicas selecionadas especialmente receber a interpretação dolente da artista. O novo trabalho, que conta com a produção de José Milton, foi gravado no final do ano de 2019 e deve sair até o dia 20 de Dezembro, terá músicas inéditas de ninguém menos que Cristóvão Bastos e João Lira, além de uma canção composta pelo próprio filho de Lucinha, o cordelista Eduardo de Menezes Macedo.
O álbum irá passear pelos mais variados gêneros. “Eu falei para o João Lira que a coisa estava criando forma. Tem uma marcha-rancho, tem uma toada, tem um desafio de viola e aí pedi para ele fazer uma ciranda para mim, e na hora ele fez a música lá em casa e me deu”, contou a cantora orgulhosa.
Como um pré-lançamento do novo trabalho e também para conter os fãs ansiosos, no próximo dia 27, a cearense deve lançar um single com uma das faixas do álbum, e mesmo sem revelar qual a música, promete surpreender o público. “Eu estava tão sem ânimo de gravar, tava tudo tão ruim, o mundo...Aí o José Milton mandou para mim uma música do Miguel Rabelo e eu fiquei animadíssima e comecei a pensar em um disco novo, repleto de coisas de amor, vindas do coração, de humanidade e assim fizemos”, afirmou Lucinha.
Uma artista cearense
A cantora, em mais de três décadas de carreira, leva uma cearensidade fora do comum, e neste lançamento não pode ser diferente. Natural do município de Itapipoca, cidade que une praia, serra e sertão, a artista incorpora em seu cantos esses elementos do estado que até hoje se fazem presentes nos seus shows.
Lúcia Menezes carrega consigo uma teatralidade fantástica o que se faz digna de ser chamada artista. Sua preocupação com o figurino, por exemplo, é algo tão surpreendente que por vezes não é visto como uma forma de respeito ao público, de saber a responsabilidade que tem de se portar diante seus espectadores.
Seja por uma meia diferente, um vestido colorido ou um chapéu meio extravagante, Lucinha sabe se fazer brilhar, e quem a admira compreende esse cuidado.“Eu comecei em 1988 no coral da UFC (Universidade Federal do Ceará) e eu meio que já me fantasiava, e tinha gente que já me olhava assim pelo avesso por certo exagero, pelas roupas diferentes, meio esquisita, eu não conseguia cantar com uma roupa bem bonitinha que eu ia para missa”, disse rindo.
O que poucos sabem e deve ser levado em conta é que tais referências estavam no imaginário da artista que se espelhava na Carmem Miranda, a qual homenageou em disco gravado ao vivo em 1996 com sucessos de carnaval da portuguesa. Aliás, Assis Valente, um dos compositores favoritos da Carmem, também se faz presente nesse próximo lançamento. O que já nos deixa curioso pelo que está por vir.
Outra inspiração para a cantora foi seu amigo Antônio Carlos Belchior. O compositor era amigo de seu irmão e frequentava muito a casa da família Menezes, já aqui em Fortaleza. Lúcia conheceu aquele rapaz latino americano e se encantou! Observando a moça estudando geometria, Bel voltando para casa compôs a música “Paralelas”, que viria a se tornar um dos grandes sucessos da saudosa Vanusa.
Belchior confidenciou para a amiga que iria escrever “no Karmann-ghia a cem por hora” mas visando imortalizar a letra substituiu por “dentro do carro” e marcou gerações. De forma mais pessoal, Lúcia agradece o compositor por sua carreira, que se existe é graças a ele: “Bel que impulsionou meu primeiro disco, ele que arrumou tudo e me fez cantora, é um amor infinito”.
Incansável defensora da arte de cantar
Durante uma hora, tive o prazer de conversar com Lúcia Menezes, e sempre que essa oportunidade existe fico empolgado diante do tamanho amor e dedicação pelo seu ofício de ser uma fiel operária do canto. Tudo isso me deixa ansioso para ouvir seus novos trabalhos que já estão saindo do forno.
Essa eterna menina que vive dentro da mulher nos embriaga de um Ceará delicado, boêmio e delirante. A cantora bebe de várias fontes e alcança o inovador, aquele que exige atenção para ser entendido.Hoje morando no Rio de Janeiro, a cantora leva em sua maleta a suavidade da brisa marinha, o clima ardente do sertão e o frescor dos picos de serra.
Longe das gravadoras desde 2017, quando gravou um dos seus melhores trabalhos na Biscoito Fino de nome “Lúcia”, no qual canta com ninguém menos que Chico Buarque e Miúcha, a cearense prepara álbum delicado e versátil, um sinônimo no qual ela vem querendo buscar e vai acertando.
Lucinha será sempre chamada no diminutivo, pois é assim que o Ceará a vê, como uma filha pequenina, repleta de vida luz e entusiasmo próprio. Que faz arte dos pequenos gestos e se deixa brilhar por uma personalidade única e incontestável. Aplausos!