7 pesquisadores negros e negras que transformam a ciência e o pensamento social

Pensadores se destacaram pela diversidade de campos de atuação, desde o ativismo político e cultural até a excelência acadêmica e científica.

Escrito por
Ítalo Henrique producaodiario@svm.com.br
Legenda: Profissionais são referência e inspiração para jovens negros e negras do país.
Foto: Lia Castro/Pexels.

A ciência e o pensamento intelectual foram espaços historicamente destinados a pessoas brancas, em sua maioria homens de famílias nobres e eruditas, desenvolvendo-se assim, como um espaço de exclusão para pessoas negras e outros grupos socialmente impostos a condições de marginalidade.

Segundo uma pesquisa desenvolvida pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com dados do Censo do Diretório de Grupos de Pesquisa (DPG) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), apenas 22,6% dos líderes de grupos de pesquisa no Brasil são negros (pretos e pardos).

Mesmo com os avanços dos últimos anos, ainda temos uma sub-representação considerável de pessoas negras em posições de liderança dentro da produção científica nacional, além de ainda termos, também, uma invisibilidade de pesquisadores negros em outras posições de pesquisa, como na iniciação científica (IC), mestrado, doutorado e pós-doutorado. 

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Por isso, é fundamental trazer esse tema para que possamos pensar, construir e cobrar mais políticas afirmativas nas posições de pesquisa e fiscalizar a aplicação dessas políticas. Além da necessidade de se valorizar mais a carreira científica no Brasil, com mais investimentos, e, principalmente, direitos trabalhistas dignos, tendo em vista que os pesquisadores do Brasil a nível de mestrado e doutorado não recebem a efetivação desses direitos.

Ainda assim, mesmo com todos esses desafios, muitos pesquisadores e intelectuais negros e negras fizeram contribuições inestimáveis para a ciência e o pensamento intelectual brasileiro. Por isso, na coluna da semana, escolhi homenagear 7 deles:

1. Sônia Guimarães (Física, pesquisadora, professora e ativista)

Sônia Guimarães foi pioneira em quase todos os espaços que ocupou. Foi a primeira mulher negra brasileira doutora em Física e também a primeira mulher negra a se tornar professora no prestigiado Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), em uma época em que mulheres ainda nem podiam estudar lá.

Realizou pesquisas muito importantes na linha de semicondutores, contando inclusive com uma patente em seu nome. Além da dedicação à pesquisa e à docência, também participa de diversas ações e eventos defendendo a inclusão de mais mulheres e pessoas negras nas ciências exatas.

Um retrato em cores da física Sonia Guimarães, a primeira mulher negra brasileira doutora em Física. Ela tem cabelos crespos loiros/grisalhos e veste um blazer branco, sorrindo abertamente, com as mãos sob o queixo e brincos turquesa longos.
Legenda: Sonia Guimarães fez carreira no Instituto Tecnológico de Aeronáutica.
Foto: Larissa Isis/Divulgação.

2. Milton Santos (Geógrafo, pesquisador, escritor e professor)

Milton Santos foi um dos maiores nomes da geografia brasileira e também reconhecido internacionalmente pelos seus trabalhos relacionados à geografia urbana e à globalização. Realizou o doutorado em Geografia na França, na Universidade de Estrasburgo, durante os anos 1950, tendo retornado ao Brasil e contribuído para a solidificação do pensamento geográfico e social em território nacional. 

Em 1994, ganhou o Prêmio Internacional de Geografia Vautrin Lud, o maior prêmio da área, considerado por muitos como o “Nobel da Geografia”. 

Uma foto em preto e branco do geógrafo Milton Santos, sentado em uma mureta que exibe as palavras GEOGRAFIA e HISTÓRIA. Ele está sorrindo, vestindo uma camisa de manga curta e calças escuras, com um prédio moderno e árvores ao fundo.
Legenda: Geógrafo Milton Santos chegou a vencer o maior prêmio mundial de sua área de estudo.
Foto: Jorge Maruta/USP Imagens.

3. Jaqueline Goes de Jesus (Biomédica, pesquisadora e professora)

Jaqueline Goes de Jesus foi responsável por atuar na coordenação da equipe que sequenciou o genoma do primeiro caso do vírus da Covid-19 no Brasil, em 48 horas – tempo recorde em comparação a outros países, na mesma época.

O feito foi celebrado pelos brasileiros e pela comunidade científica, alcançando reconhecimento nacional e internacional. Além dos trabalhos relacionados ao vírus da Covid-19, Jaqueline é mestra e doutora em patologia humana, tendo atuado também no estudo de importantes surtos, como o da dengue, chikungunya e zika.

A biomédica Jaqueline Goes de Jesus, que participou do sequenciamento do genoma do coronavírus no Brasil, sorri vestindo um jaleco de laboratório. Ela segura uma boneca à sua imagem, vestida com um jaleco e calças jeans, em um fundo verde.
Legenda: Jaqueline Goes de Jesus se destacou pelas pesquisas durante a pandemia da Covid-19.
Foto: Cefet-RJ.

4. Abdias do Nascimento (Escritor, professor, pesquisador e ativista)

Abdias do Nascimento foi um dos principais nomes para consolidação do Movimento Negro no Brasil, tendo escrito livros que são referência dentro e fora do movimento, como "O Genocídio do negro brasileiro: Processo de um racismo mascarado".

Também lecionou em grandes universidades e realizou importantes contribuições tanto no meio artístico, como ator, dramaturgo e poeta, quanto na política, como deputado federal e senador.

Uma foto em preto e branco de Abdias Nascimento, político, artista e ativista do movimento negro brasileiro. Ele aparece em um plano de médio-close-up, de perfil, vestindo um terno e gravata, com barba e óculos. Ele olha pensativo para a esquerda.
Legenda: Abdias Nascimento foi um importante pensador e senador brasileiro.
Foto: Agência Senado.

5. Conceição Evaristo (Linguista, escritora, pesquisadora e professora)

Conceição Evaristo é considerada uma das maiores escritoras da contemporaneidade brasileira, contando com contribuições inestimáveis para a literatura nacional. É formada em Letras e é mestra e doutora em literatura comparada.

É uma das vozes mais representativas da literatura afro-brasileira, com livros que atravessaram as fronteiras sociais e físicas do Brasil, como "Ponciá Vicêncio", "Olhos d’água" e "Poemas de recordação e outros movimentos" que foram traduzidas para o inglês, francês, espanhol, árabe e italiano. É responsável por cunhar o termo “escrevivência” que refere-se a escrita que nasce da experiência vivida, principalmente de mulheres negras, em suas ancestralidades, memórias, dores e afetos.

Um close-up da escritora Conceição Evaristo, sorrindo para a câmera. Ela usa uma roupa branca e uma tiara escura em seu cabelo crespo grisalho. Ao lado, uma placa exibe uma foto e uma citação sua.
Legenda: Conceição Evaristo ganhou notoriedade na literatura brasileira ao refletir sobre o conceito de escrevivências.
Foto: Faculdade de Letras/UFMG.

6. Djamila Ribeiro (Filósofa, pesquisadora, escritora e professora)

Djamila Ribeiro é um dos nomes mais conhecidos do pensamento social brasileiro contemporâneo, tendo contribuições essenciais sobre racismo estrutural, lugar de fala e feminismo negro. Seu livro “Pequeno Manual Antirracista” ganhou o Prêmio Jabuti  de 2020, na categoria Ciências Humanas, e se tornou um best-seller com milhares de cópias vendidas por todo o país.

Seu pensamento também ultrapassou as fronteiras nacionais, tendo seus livros traduzidos para o francês, italiano e inglês, além de sua atuação como professora convidada em importantes instituições, como a New York University (NYU) e o Massachusetts Institute of Technology (MIT). 

Um retrato em cores da filósofa e ativista Djamila Ribeiro, vestida com um conjunto de calça e blusa cor de telha. Ela sorri para a câmera, com tranças longas e brincos em evidência, em um ambiente interno com quadros pendurados na parede atrás dela.
Legenda: Pensamento de Djamila Ribeiro ultrapassou fronteiras do Brasil e chegou a universidades americanas.
Foto: Site Djamila Ribeiro.

7. Katleen da Cruz Conceição (Médica dermatologista, pesquisadora e professora)

Katleen Conceição, médica dermatologista, foi pioneira em uma área que por muitas décadas foi negligenciada no Brasil: a dermatologia para pele negra. Diversas condições dermatológicas, como psoríase e dermatite atópica, por exemplo, podem se manifestar de modo diferente na pele negra e o não reconhecimento dessas especificidades colabora com o não diagnóstico precoce dessas condições, fazendo com que a doença possa se agravar e causar mais danos.

Assim, Katleen publicou o primeiro livro de dermatologia para pele negra do país e co-fundou o primeiro Departamento de Pele Étnica da Sociedade Brasileira de Dermatologia do Rio de Janeiro (SBDRJ). Além disso, também dedica sua carreira a essa missão na docência e na pesquisa, sendo chefe do setor de pele negra do Instituto de Dermatologia Prof. Rubem David Azulay, da Santa Casa do Rio de Janeiro, e tendo publicado e apresentado importantes pesquisas sobre o tema em eventos como o Skin of Color Update em Nova York, o maior congresso do mundo de dermatologia para pele negra e peles de cor (skin of color). 

Um retrato em cores da dermatologista Katleen Cruz. Ela tem longos cabelos escuros, veste uma camisa clara de colarinho e sorri. Ela está sentada em uma mesa, com relógio e anéis em destaque.
Legenda: Dermatologista Katleen Cruz se especializou em pesquisas e atendimentos da pele negra.
Foto: Divulgação.

Escolher esses 7 nomes para representar os feitos de pesquisadores negros e negras do Brasil foi, para mim, um ato simbólico de resistência, ancestralidade, reinvenção e inovação, mostrando que pessoas negras estão em todos os espaços, inclusive nas ciências, mesmo com todos os desafios e desigualdades estruturais existentes no nosso país.

E para além de ocupar espaços, que historicamente foram negados à população negra, esses pesquisadores das mais diversas áreas da ciência, abrem portas para muitos e muitas. E aqui, encerro citando Conceição Evaristo: “O importante não é ser o primeiro ou a primeira. O importante é abrir caminhos”.

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.

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