Supermercados Moranguinho: conheça a rede do Ceará que vende fiado e está entre as 300 maiores do País

Nascido em 2002, o negócio mantém as características das mercearias e bodegas genuinamente nordestinas

Legenda: Fachada do Supermercado Moranguinho Conceito, em Pacajus, inaugurado em 2014. Loja conta com 2.100 m² de área de venda
Foto: Arquivo Pessoal/Supermercado Moranguinho

De origem europeia, o morango é uma fruta apreciada em todo o mundo e ganhou a mesa do cearense. Geralmente cultivada em regiões mais frias, o avanço tecnológico permitiu que a fruta tivesse condições de produzida no Estado, onde, historicamente, uma planta precisa suportar climas nada amenos (exceto nas serras) para sobreviver.

Poderíamos dizer que o nome “morango” hoje tem mais a ver com o Ceará e com o Nordeste, como provam dois elementos: a música “Moranguinho do Nordeste”, de composição pernambucana de 1987, e uma empresa que tem tudo de cearense: um supermercado que nasceu do trabalho de um camelô, passou por bodega, mercantil e hoje está entre os 300 maiores varejistas do País, em uma lista que conta também com os conterrâneos Pague Menos, Coco Bambu e Mercadinhos São Luiz.

No ranking dos 300 maiores varejistas do Brasil, da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), o Supermercados Moranguinho aparece na 295ª posição com faturamento de R$ 408 milhões no ano passado.

Assim como as grandes redes supermercadistas do Estado, o Moranguinho incorporou as transformações digitais que atravessaram o varejo - inclusive antes mesmo da pandemia, a exemplo do aplicativo de compras online.

Mas o que é difícil de se ver atualmente é uma empresa que consegue sobreviver e ainda crescer mantendo tradições tão antigas - e fortemente presentes no imaginário alencarino, principalmente no Interior. No Moranguinho, ainda há quem compre fiado, conforme contou, com orgulho, a esta coluna, o presidente da empresa, José Albecir da Silva.

Legenda: José Albecir da Silva, presidente do Supermercado Moranguinho, contando que faz todas as contas e a gestão do negócio prioritariamente "à mão", assim como fazia antes do computador
Foto: Kid Junior

Digo orgulho porque há muito por trás dessa postura e isso é possível entender ao longo de algumas horas de conversa. Albecir conta que essas pessoas que ainda compram fiado na loja de Pacajus foram “os clientes que o trouxeram até onde ele está”. “O pessoal se 'extrema', diz que não pode mais vender assim e eu digo que pode, que para tudo tem um jeito. Eles compram fiado e eu pago, porque hoje tem o sistema, depois eles me pagam”.

“Como eu vou deixar de vender a quem, quando eu tinha um botequim, ia lá e fazia uma feirinha boa só para me ajudar? Aí hoje, que eu estou com o supermercado, vou deixar de vender a essa pessoa?”, questiona Albecir.

O “caderninho do fiado” não é a única curiosidade tradicional acerca do Moranguinho. O supermercado também dispõe de um ônibus para que os moradores de áreas mais afastadas possam fazer suas compras. E disponibiliza outro veículo para levar as compras desses moradores. “Às vezes me perguntam se compensa, mas eu continuo mandando. Isso tem uma gratidão lá de trás. Essas pessoas compram minha mercadoria hoje, mas eles também compraram quando eu era pequeno”.

Legenda: Mercadorias prontas para embarcarem em um caminhão rumo às residências dos consumidores. O Moranguinho busca e deixa os clientes em casa e manda deixar as mercadorias
Foto: Kid Junior

Camelô, bodega, mercantil e supermercado

O supermercado, hoje com unidades presentes em Horizonte, Pacajus, Barreira, Pindoretama, Beberibe e Cascavel, e atuação no varejo e no atacarejo (sob a bandeira Jangada) nasceu (com o nome Moranguinho) oficialmente em 2002, mas a gratidão da qual Albecir fala vem de muito antes: década de 1980, quando ele era camelô e recebia o carinho de quem lhe comprava cheiro-verde, manga e outros produtos que vendia.

Posteriormente, experimentou a gratidão mais uma vez quando, depois de ganhar experiência na bodega do avô, na adolescência, e de abrir um pequeno mercantil com o tio, resolveu colocar o próprio negócio. Sem dinheiro suficiente para tocar a empreitada, contou com a ajuda e a confiança de alguns amigos e clientes pelo caminho para conseguir prosperar.

Legenda: Antes do Supermercado Moranguinho, Albecir foi camelô, trabalhou em bodega até chegar ao mercantil e, posteriormente, ao Supermercado Moranguinho
Foto: Arquivo Pessoal

“Eu apartei com (o negócio do) meu tio em 1991. Aí eu digo: ter conhecimento e relacionamento é fundamental na vida de um ser humano. O dono do depósito de frente a esse mercantil que eu tinha com meu tio chegou e disse: eu estou sabendo da situação, mas eu aluguei um ponto ali para você”, lembra Albecir.

De São Francisco a Moranguinho

Na época, o negócio se chamava Mercantil São Francisco. Pode ser óbvio pensar que o nome “Moranguinho” teria alguma relação com a música “Moranguinho do Nordeste”, mas não. Albecir conta que, um dia, reunido com família e amigos, um deles tentou falar a palavra “morango” e saiu “morongo”.

A situação se tornou uma brincadeira entre eles, até que Albecir viu que da brincadeira sairia o novo nome do negócio: Supermercado Moranguinho.

Legenda: Caminhão saindo para levar mercadorias dos consumidores de áreas mais afastadas do supermercado
Foto: Kid Junior

“Em um domingo, a família estava em um sítio. Numa brincadeira, um amigo tinha trazido uns morangos e ele não sabia chamar, chamava de ‘morongo’. Aí eu disse: rapaz, sabe que eu devia botar (o nome do supermercado) morango, mesmo? Vou colocar mercantil Moranguinho. Aí tem um cara que pinta fachada aqui e eu pedi a ele para pintar 10h da noite, para amanhecer já como Moranguinho”.

O marketing a partir do impacto e de um nome ‘estranho’

Ele lembra que as pessoas passavam em frente ao supermercado e estranhavam o nome, que havia mudado de São Francisco para Moranguinho. “As pessoas falavam, achavam o negócio esquisito a gente mudar de São Francisco para Moranguinho. Aí de as pessoas falarem que era estranho, foi pegando e pegou”, conta Albecir.

Entre percalços, fechamentos e reaberturas, o Moranguinho hoje possui 15 lojas, 1.500 funcionários - fora prestadores e promotores - e inaugurou quatro unidades em 2023. 

Legenda: Hoje, grupo conta com cerca de 1.500 funcionários
Foto: Kid Junior

Questionado sobre as perspectivas para novas aberturas em 2024, Albecir revela que ainda está avaliando as possibilidades, mas afirma que Fortaleza, pelo menos por enquanto, não está na rota de expansão do negócio. “Não adianta só abrir loja, tem que reforçar, fazer os alicerces. Abrir e não olhar para trás é deixar o seu negócio sucateado”, ensina.

Dentre as novidades para o ano que se aproxima, porém, está a transformação de uma das unidades de atacarejo em varejo. Se trata da loja Jangada de Horizonte, que vai passar a ser Moranguinho em 90 dias. A mudança, de acordo com Albecir, está ligada à filosofia do Moranguinho.

“É que a gente tem muito forte essa atenção ao cliente. No atacarejo, eu não tenho condições de dar essa atenção maior para o meu consumidor, então fica um pouco vazio para mim”, pontua o empresário.

“No meu presente, eu me espelho no meu passado. A gente teve erros, a gente não teve só acertos. Tivemos altos e baixos, mas a minha vantagem sempre foi a coragem de trabalhar e fazer por amor. Então, para mim, não existe dificuldade, nem de noite, nem de dia. E nem ambição. Prazer pelo que eu faço. Se for pra eu viver no meu supermercado sem andar no chão de loja, vendo meus clientes, para mim não tem sentido”, arremata Albecir.

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