Minha única história com Pelé, o Rei do futebol

Ele se despiu de sua camisa branca, de número 10, do Santos FC, e a entregou a mim, na beira do gramado do Estádio Presidente Vargas. A peça foi leiloada pelo Lions Clube de Maranguape.

Legenda: Pelé doa sua camisa, usada no jogo contra o Ceará em dezembro de 1972 no PV, para o Lions Clube de Maranguape
Foto: Acervo Biblioteca Pública Estadual do Ceará/Jornal Tribuna do Ceará

Ela exalava um cheiro de suor e perfume. Era toda branca, inclusive a gola, feita também de puro algodão, detalhe que tornava mais elegante quem a vestia. Eram pretos o símbolo do clube, o Santos FC, e o número 10 às costas. 

Quando, em um domingo de dezembro de 1972, o juiz encerrou o jogo do Santos com o Ceará Sporting no Estádio Presidente Vargas, em Fortaleza, Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, já denominado Rei do Futebol, correu até a beira do campo, despiu-se de sua famosa camisa e a entregou a mim sob o olhar incrédulo de mais de 20 mil pessoas que lotavam o velho e hoje remodelado PV.

Uma semana antes, em Porto Alegre, onde eu estivera em missão do “Diário de Pernambuco”, vi Pelé sentar-se à mesa do restaurante para o café da manhã no Hotel São Rafael - onde se hospedava o Santos. 

Não acreditei no que vi. Levantei-me de onde estava e fui em direção ao Rei.

“Pelé, bom dia, sou jornalista do Ceará, estou aqui a serviço do meu jornal, mas pertenço ao Lions Clube de Maranguape, a terra do Chico Anísio. Nós temos um trabalho social importante lá e precisamos ampliá-lo, e por isto venho pedir-lhe a camisa que você usará no próximo domingo em Fortaleza, no jogo com o Ceará. Vamos leiloá-la e o produto do leilão será revertido em benefício do nosso trabalho social”, foi o que eu disse a ele mais ou menos com estas palavras.

Pelé fez um sinal com a cabeça, como se me mandasse sentar. Atendi-o com o coração batendo descompassadamente. Senti a mesma emoção de milhares de pessoas que tiveram a chance de chegar perto dele e conversar com ele. 

Surpresa! Pelé disse a mim que entregaria sua camisa após o jogo, desde que eu o informasse onde me encontraria na beira do gramado. Tomei a providência de, antes de começar a partida vencida pelo Ceará por 2x1 (Pelé fez o gol do Santos logo aos 11 minutos do primeiro tempo, mas Dacosta e Samuel, com seus gols, derrotaram os santistas), correr até ele e apontar para o lugar onde eu estaria.

Quando Pelé entregou-me a camisa, uma, duas ou três lágrimas caíram dos meus olhos. 

“Muito obrigado, Pelé. O Lions de Maranguape ser-lhe-á grato para sempre”, foi a frase que pronunciei.

Ele – o Atleta do Século XX – retirou-se, nu da cintura para cima, trotando como um puro alazão em direção ao então acanhado vestiário do estádio, que hoje está modernizado. 

Duas semanas depois, o Lions maranguapense fez uma festa para promover o leilão da camisa número 10 de Pelé. 

A peça, arrematada por um grande valor da época, foi antes lavada e engomada por minha mãe, Maria Alice, mãe de mais 13 filhos, que morreu em março do ano passado, aos 100 anos.

Pelé, que eu vi, pessoalmente, em março de 1961, fazer o famoso gol de placa no Maracanã, depois de driblar metade do time do Fluminense, foi e será para sempre o maior jogador de futebol que o mundo já conheceu. E que eu vi jogar.

Pelé, descanse em paz. Obrigado por tantas alegrias. Obrigado pela sua inimitável arte.