Hidrogênio verde: expectativa de hoje e realidade que ainda não chegou

Tudo depende da existência do marco regulatório do H2V, que ainda tramita no congresso Nacional. Mas o economista Marcos Holanda pede cautela aos que mostram euforia em demasia

Legenda: Pelo porto do Pecém (foto) será exportada a produção cearense do hidrogênio verde
Foto: Carlos Marlon

Por enquanto, o que há mesmo em torno do projeto do Hub do Hidrogênio Verde do Pecém é um Monte Fuji de expectativas, e a culpa não é, digamos assim, da Parceria Público Privada (PPP) – Federação das Indústrias, Governo do Estado, Universidades – que se dedica com muito esforço ao desenvolvimento desse empreendimento, o qual, agora, está mais perto da linha de partida, uma vez que o aguardado Marco Regulatório da Produção do Hidrogênio Verde chegou mais perto de ser aprovado pelo Senado, que o encaminhará a uma nova apreciação da Câmara dos Deputados, onde o seu texto teve origem.

Quando dezembro chegar, trará com ele essa regulação e seu leque de incentivos fiscais – a iniciativa privada brasileira, grande parte dela, não respira se não for pelo aparelho das isenções tributárias, mas isto são outros quinhentos.

O grande evento ocorrido na última terça-feira, 25, no principal auditório da Federação das Indústrias (Fiec) foi revelador do que se pode chamar de alinhamento perfeito dos vários grupos com direto interesse no projeto do Hub do H2V do Pecém.

Por exemplo:  a Agência de Desenvolvimento Econômico do Ceará (Adece), liderada por Danilo Serpa, citada por todos os oradores e instruída pelo governador Elmano de Freitas, bancou, em parceria com a Fiec, os custos dos estudos feitos pelo IXL Center. Foram investidos R$ 6 milhões – R$ 5 milhões da Adece e R$ 1 milhão da Fiec.

Esta coluna, de tanto ouvir informações de representantes desses grupos de interesse, pode informar, com absoluta segurança, que – tão logo o Congresso Nacional dê ao país o Marco Regulatório do Hidrogênio Verde – o Ceará liderará, nacionalmente, as obras de construção das primeiras indústrias na ZPE do Pecém.

Os empreendedores, entre os quais a brasileira Casa dos Ventos e a australiana Fortescue, já têm garantida a energia renovável – solar fotovoltaica ou eólica onshore – à produção do seu H2V, que será feito por eletrólise. A soma dos investimentos dos projetos dessas duas empresas alcança US$ 13,5 bilhões.

Essa mesma garantia de fornecimento de energia renovável também  têm as outras empresas que, igualmente, se declaram aptas a iniciar a implantação de suas unidades industriais na geografia da ZPE do Ceará, no Pecém. Seus investimentos ultrapassarão os US$ 15 bilhões.

Como disse Hitendra Pantel, do IXL Center, de Boston, que liderou os estudos sobre os impactos do H2V na economia do Ceará, “haverá uma revolução socioeconômica neste estado”.

Preparando-se para essa revolução, o Senai e o Sesi – integrantes do Sistema Fiec – já dispõem de um Centro Tecnológico para a Transição Energética, localizado na Barra do Ceará, cujo time de especialistas prepara mão de obra qualificada para as empresas de geração de energias eólica e solar já instaladas ou a instalar-se no Ceará. Nesse mesmo centro, também serão qualificados os técnicos que trabalharão nas empresas que produzirão o Hidrogênio Verde na ZPE.

Isto quer dizer que a iniciativa privada, por meio dos organismos especializados da Fiec, faz o que lhe cabe: treinar, qualificar e transmitir conhecimento teórico e prático a quem, com nível técnico ou graduação superior, pretende participar dessa revolução tecnológica que se aproxima.

“Anotem: o Ceará de hoje terá pouco a ver com o Ceará de 2030. Ou seja, dentro de sete anos, a economia cearense conviverá com a ponta tecnológica das energias renováveis, algo que ela já domina, e da produção do combustível do futuro – o hidrogênio verde”, como tem dito e repetido, com outras palavras, o presidente da Fiec, Ricardo Cavalcante, que assumiu – com o respaldo público do próprio governador Elmano de Freitas – a liderança desse processo revolucionário.

Aqui, no Brasil e no mundo todo, o custo de produzir uma tonelada de H2V é ainda muito alto, mas, quando sua tecnologia ganhar escala, esse custo será reduzido, como se reduziu o custo de geração das energias renováveis.

Hoje, a geração de 1 MW de energia solar fotovoltaica é semelhante ao gerado pela energia hidráulica, como revela o CEO da Fortescue, Luís Viga, na opinião de quem sua empresa espera, somente, o marco regulatório para implantar o seu projeto de hidrogênio verde no Pecém.

MARCOS HOLANDA PEDE CAUTELA COM H2V

Ex-presidente do Banco do Nordeste, economista pela Unifor e engenheiro civil pela UFC, Marcos Holanda transmitiu a esta coluna um curto comentário a respeito da matéria aqui publicada ontem sob o título “Na Fiec, o Ceará explode de entusiasmo com o Hidrogênio Verde”.

Na opinião de Holanda, é aconselhável um pouco de cautela aos que se mostram hoje eufóricos em demasia. Diz ele em sua mensagem:

“Sonhar com um novo Ceará a partir do H2V é fácil pois tem custo zero.

“Investimento real em projetos de H2V é difícil, pois custa muito.

“Recente relatório patrocinado pelo próprio governo da Holanda (onde fica Roterdã) mostra que um quilo do Hidrogênio Verde custa atualmente € 13,00, ou seja, seis vezes mais do que custa o quilo do hidrogênio normal.

“Quem comprará o mesmo insumo por um preço seis vezes maior?

“Repito que não sou contra o H2V, mas insistir nessa fantasia de que ele vai transformar a economia do estado e resolver nossa pobreza é um grande erro.”

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