Acordei no meio da madrugada e de súbito levantei-me. Pensei que havia amanhecido e eu tivesse perdido a hora. Não domino mesmo o tempo, lembrei. Como sempre estou a postos, despertei de uma vez. Acalmei corpo e mente. Não sentia sono. Nem calor, nem pressa. Sentia outras coisas. Cruzava novas emoções e esperava o amanhecer encontrar-me liberta. Solta mesmo, feito os ruídos do vento na porta da sala.
Deslizei pra esquerda a cortina-blecaute do quarto e vi o céu ainda (um pouco) estrelado. Eu já tinha dormido bastante, mas, realmente, ainda não era dia. Bebi água, olhei a hora no celular e, diante das 3h45, entendi que eu precisava/podia retomar o sono - de onde parei? Postei-me na cama como se ninho fosse e fechei os olhos. Em vão: estava desperta.
Não desisti. Virei-me virada, com as costas para cima, e relaxei braços e pernas. Estava pronta para pegar no sono. Segundos depois... irrompe uma batida simétrica, constante e inabalável. Sempre esqueço, quando deito a cabeça de modo que o ouvido fica pressionado na cama, sem travesseiro, passo a ouvir o tum-tum-tum do meu coração. Barulho mesmo. Não a metáfora.
Nos últimos tempos, o inverso tem se repetido. Não é exatamente o barulho do meu coração que escuto. Mas a metáfora que esse pulsar representa. Parece que a sensação de deixar-me sentir o presente tem-me feito expandir o processo de reconhecimento que nós, humanos domesticados, temos tentado alcançar ao longo dos nossas dias. Apesar dessa eterna necessidade que temos de domar os nossos pensamentos, a fim de descobrir caminhos. Estamos sem rumos?
Essa metáfora do pulsar, da batida que nos desperta, remonta uma espécie de memória que tem o nosso coração. Catálogo de afetos. De encontros, partidas. De dores e deleites que se acumulam ao longo da vida. Das alegrias que agora fazem festa na memória. A nossa sorte também é nosso tempo, dono de tudo que em nós se renova e abre espaço para mais e novos sentimentos, outras felicidades.
Outras felicidades...
Um eco que cura nossos ouvidos - e nosso espírito - , erguendo laços que se formam e se desfazem de maneira tão natural que viver transita entre ser e estar - mas não permanecer -, num movimento que ora nos liberta, ora nos assusta. Porque não temos como organizar em gavetas os sentimentos trazidos no peito. Não temos? A gente sonha, a gente espera. E para. E raciocina com pele, coração e mente. E desejamos aprender a lidar com essa ansiedade coletiva pelo amanhã (por outras felicidades) porque temos tecido nossos enredos de vida ganhando tempo, muito tempo. Em compensação, nem sempre escolhemos datas.