Você sabe o que é 'greenlighting'? Entenda o conceito e o que isso tem a ver com você

Algumas companhias adotam práticas artificiais para se posicionar diante da crise climática, mas não estão dispostas a investir nem a redirecionar a cultura organizacional

Legenda: No Brasil, a prática publicitária é fiscalizada pelo Conselho Nacional Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (Conar)
Foto: Shutterstock

O dito e o (não) feito expõem as contradições de uma empresa, sobretudo em relação à agenda ambiental. Nas redes sociais, inclusive, é comum a associação de algumas marcas ao meme “enfim, a hipocrisia”. Com essa linguagem irônica e popular, o consumidor traduz a essência do “greenlighting”, uma tática de comunicação para mostrar características sustentáveis para camuflar os impactos empresariais negativos.

É o caso de uma petroleira, por exemplo, um dos setores que mais gera dióxido de carbono (CO₂), quando faz publicidade para evidenciar utilizar 100% da energia renovável. Segundo estudo do “think tank inglês Influence Map”, no mundo inteiro, somente 57 empresas de petróleo, carvão e setores convergentes foram responsáveis por 80% das emissões globais de CO₂, desde o Acordo de Paris, em 2015. 

Veja também

Para o diretor do Núcleo de Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral (FDC), Heiko Hosomi Spitzeck, nesse exemplo da petroleira, o engajamento por parte da empresa representa uma parcela “muito pequena” do portfólio do negócio. 

“A onda do ESG (Ambiental, Social e Governança, na sigla em inglês) contribuiu para muitas empresas sentirem a necessidade de comunicar o que estão fazendo de bom, mas acabam errando pela comunicação e não pela ação”, observa, ponderando acreditar não ser necessariamente de forma intencional. 

O "greenlighting”, no entanto, também gera prejuízo reputacional porque dificilmente alguns clientes saberão distinguir a má-fé da falta de informação. 

"Estou cansado de ver empresas falando que as ações de ESG estão no seu DNA, mas, quando questionadas sobre os produtos e serviços mais sustentáveis, não conseguem responder. Então, deveriam ajustar [a comunicação] porque não estão no DNA. Se não estão na receita, são uma atividade periférica"
Heiko Hosomi Spitzeck
Diretor do Núcleo de Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral (FDC)

Para Heiko, não é eficaz “um lindo relatório de sustentabilidade” quando não há informações sobre os indicadores usados e quem vai auditá-los, por exemplo.

Na avaliação do ambientalista e professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Alexandre Araújo Costa, também “não adianta a empresa dizer não ter emitido carbono e que foi o consumidor responsável pela queima da gasolina, como se ela não tivesse nada a ver com isso, fazendo um tipo de contabilidade criativa”. 

Conforme Araújo, é preciso considerar os três escopos para o cálculo de produção de gases do efeito estufa (GEE), contabilizando as emissões diretas (1), indiretas pelo uso da energia (2) e pelas atividades ao longo da cadeia de valor (3). 

ESG deve ser levado a sério pelos setores privado e público

Mas, no Brasil, não é só o setor privado que está desalinhado com a emergência climática. O governo brasileiro também. No começo deste mês de abril, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que continuará explorando petróleo para ter recursos para “descarbonizar a economia”. A declaração foi dada em entrevista à Folha de S. Paulo. 

Será que continuar aquecendo o planeta para investir na transição energética é uma escolha inteligente, ministro? Será que teremos todo esse tempo para agir? Os dados indicam haver urgência.

Conforme o Observatório do Clima, o planeta chega “perigosamente perto” do limite de 1,5 °C de aquecimento, determinado pelo Acordo de Paris. A temperatura média global está 1,45 °C acima dos níveis pré-industriais (com margem de erro de 0,12 °C para mais ou para menos).  

Para ler, clique em cada tópico O que você precisa saber

Veja 5 dicas para identificar o marketing verde falso:

O “greenlighting” é um dos diferentes tipos de “greenwashing”, expressão que significa “maquiagem verde” ou “lavagem verde”. Ou seja, marcas que demonstram ser sustentáveis, mas não são.

O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) tem um manual para auxiliar o consumidor a identificar a conduta. Veja 5 dicas:

  1. Não confie em produtos que possuem afirmações ambientais vagas como “ecológico”, “sustentável” ou “amigo do meio ambiente”. Termos amplos como esses não podem ser usados nas embalagens dos produtos, conforme prevê a Norma ABNT ISO 14.021/2017. Se você encontrar, é greenwashing;
     
  2. É comum encontrar imagens e desenhos que parecem selos, mas, na verdade, são uma jogada de marketing da empresa. Se você nunca viu antes aquele símbolo, desconfie e pesquise. Há muitas empresas que usam símbolos que parecem selos, mas são criados pela própria empresa e que passam uma imagem equivocada de certificação independente de terceiros;
     
  3. Muitas empresas colocam recomendações e sugestões em suas embalagens, como “Preserve o Meio Ambiente, ele agradece”, “Economize água”, “Por favor, recicle essa embalagem”, mas carecem de política socioambiental e de ações voltadas à sustentabilidade de seus produtos. Ao encontrar mensagens desse tipo nas embalagens, pesquise as práticas da empresa e sua política socioambiental e, no caso da carência de provas, cobre por explicações e mudanças;
     
  4. Não adianta um fabricante declarar que seu produto é vegano, não testado em animais, que gera 70% economia de água ou é 100% biodegradável: ele precisa entregar provas concretas de tais afirmações. Se você encontrou uma autodeclaração ambiental e quer confirmar sua veracidade, entre em contato com o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) da empresa (o e-mail ou telefone precisa estar informado no rótulo) e solicite provas concretas de tais afirmações;
     
  5. Há muitas organizações da sociedade civil que, como o Idec, trabalham com o tema do "greenwashing" e a responsabilidade socioambiental das empresas e são fonte confiável para sua pesquisa. Além disso, há também conteúdo nos sites de diversas certificadoras internacionais independentes que trabalham verificando tais declarações.   

Veja 3 dicas do especialista para evitar praticar "greenlighting"

O diretor do Núcleo de Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral (FDC), Heiko Hosomi Spitzeck, explica como os gestores podem evitar praticar “greenwashing” e proteger a reputação da empresa. Veja:

  • É importante sair da autodeclaração e ter uma visão crítica do negócio;
  • Busque formas de demonstrar confiança na comunicação;
  • Crie um comitê para ouvir críticos externos antes do lançamento de uma campanha.  
Este conteúdo é útil para você?


Assuntos Relacionados