Ao Centro de Fortaleza

Quando era um garoto, ainda no início dos anos 1990, lembro de ir, junto a minha mãe, resolver uma sorte de necessidades no centro de Fortaleza. Morávamos em Aquiraz, tomávamos um ônibus bem cedo e, depois de aproximadamente uma hora e trinta minutos, chegávamos àquelas ruas margeadas por lojas e repletas de pessoas. Para mim, e por muito tempo, o Centro representava a cidade.

Hoje, essas lembranças afetivas me são muito úteis para tratar da centralidade tradicional da metrópole alencarina. Dada a sua importância econômica, histórica e cultural, há sempre um tema nas páginas dos jornais a discuti-la.

Muitos até defendem a sua revitalização. Mas, como explica o geógrafo José Borzacchiello da Silva, não se pode revitalizar o que nunca perdeu a vida.

Nas últimas semanas, falou-se bastante da proposição de construção de um bonde elétrico. O meio de transporte circularia por dois quilômetros e ligaria o Theatro José de Alencar ao Centro Cultural Dragão do Mar. Como todos sabem, o projeto foi temporariamente cancelado. Pessoalmente, não acredito na eficácia de tal projeto para reestruturação econômica ou renovação dos usos no Centro. Há outras saídas e prioridades.

Uma constatação importante: a cidade não é mais só cidade; é uma metrópole policêntrica. Porém, se há outras parcelas da cidade a ofertar comércios e serviços, a centralidade tradicional apresenta diferenciais, sobretudo, em razão da acessibilidade por transporte coletivo e pelo conjunto de infraestruturas historicamente acumulado. Não à toa, além do comércio, funções antigas vêm sendo redefinidas. Aí está o caminho: habitação, serviços especializados, cultura e religião.

No que tange à habitação, é essencial projetar e incentivar modelos alternativos de crescimento de habitações ocupadas por estratos sociais diversos. Para o trabalhador, seria ótimo morar em área com boas condições urbanas e próxima a seu lugar de labuta.

Os hospitais, as clínicas médicas populares, as escolas profissionalizantes e as faculdades são claros exemplos de serviços modernos e adaptados aos fluxos atraídos pelo Centro. É possível ainda fomentar a ocupação dos prédios por startups e/ou outras empresas vinculadas ao terciário superior (marketing, propaganda, computação...).

Com seus espaços públicos, teatros, museus e monumentos, as atividades de lazer podem atender gostos populares ou clássicos; de um bom forró na Praça dos Leões à Orquestra Sinfônica no José de Alencar. E as práticas religiosas? O Centro abriga grandes templos religiosos a atrair milhares de fiéis. É um espaço eclético.

O Centro é uma referência para a cidade, para sua economia e para a memória coletiva. Não há projeto miraculoso capaz de transformá-lo da água para o vinho. O melhor é pensar adaptações sem desprezar a sua popularidade, a sua diversidade e seu charme. Nada de elitização!

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.