O ódio mata e o amor cuida e salva
Como um órgão tão sensível como o coração pode ser fonte de duas forças tão poderosas?
Ódio e amor são dois sentimentos intensos que nos acompanham desde Adão e Eva. Um destrói, mata, causa dor e sofrimento, enquanto o outro cuida, cura e salva. Os dois são alimentados pelo coração humano. Como um órgão tão sensível como o coração pode ser fonte de duas forças tão poderosas? Como um coração ferido pode querer destruir alguém que já foi seu amigo, companheiro e fez parte de seu convívio? Qual é a razão para tanta violência, que pode machucar e até matar alguém?
Qual é a razão pela qual uma emoção adormecida é despertada? O ódio que se dirige a alguém não atinge apenas o indivíduo em questão, mas também aqueles que o alimentam em seu coração. Existem indivíduos que, por meio de suas ações, palavras e atitudes, despertam memórias inconscientes devastadoras no outro. De que maneira elas chegaram até mim? Qual é o motivo pelo qual o sentimento de vingança persiste durante anos?
Seria uma memória herdada dos nossos antepassados? Será que esse sentimento surgiu em mim? Por que parece maior que eu? Seria parte integrante da natureza humana?
Judas, que compartilhava o pão com Jesus, que era fonte de amor puro, como pode ter um ódio tão intenso ao ponto de traí-lo e vendê-lo por 30 denários? Após a traição, motivado pela culpa e pelo arrependimento, ele ainda tirou a própria vida. Atribuir a causa desse sentimento a um ser externo conhecido como diabo, satanás ou espírito maligno seria fugir da responsabilidade. É importante compreender que o diabo faz parte da natureza humana e que devemos ter em mente que podemos ser fontes de morte e de vida. Responsabilizar um ser diabólico fora de mim não me deixa isento da responsabilidade.
Ao criar o mundo, Deus criou Adão e Eva, os quais tiveram dois filhos, Caim e Abel. Esses dois irmãos, criados pelo amor, um deles matou o outro. Quando Deus viu o gesto, perguntou: Caim, onde está teu irmão? Com essa pergunta, Deus responsabilizou Caim e todos os seus descendentes. Todos nós temos responsabilidade para com os nossos semelhantes. Nascemos com o objetivo de cultivar a terra árida, cultivar as virtudes, valores fundamentais para a criação, e cuidar uns dos outros, incluindo todo o planeta.
O lado divino que habita cada criatura pode ser fonte de vida ou morte, de criação ou destruição. Não seria a função da família e das religiões transmitir os valores construídos ao longo da história, de nos ensinar a pensar e refletir sobre o que a humanidade tem aprendido ao longo dos séculos? Deixar de culpabilizar para se responsabilizar. Muitas maneiras foram usadas para burlar a lei do criador, limpar a consciência e se livrar da culpa, usando violência para destruir pessoas e nações.
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Em nome de Deus, a inquisição matou muitos inocentes e, mesmo que fossem culpados, não tínhamos permissão de Deus. Chamaram de guerra santa uma guerra cruel que aniquilou pessoas que professavam fé em outro deus. Vejam o absurdo, para salvar um túmulo, o de Cristo, se matou milhares de pessoas. Passaram-se os anos e somente agora percebemos que não foi o amor a Deus que os motivou, mas sim o desejo de alcançar um poder terreno absoluto, usando o nome de Deus em proveito próprio.
O que aprendemos com aquilo tudo? Ampliou nossa consciência de que não podemos mais nos dar o direito de matar, destruir o diferente? Jung afirmava que o oposto do amor não é o ódio, mas o uso do poder. O Deus cristão não é caracterizado pela destruição, mas sim pela criação, pelo amor. Como podemos, hoje, usar a fé para combater o diferente, usar toda a minha fé cristã para impor um poder material que nos corrompe facilmente?
Qual é o poder que as igrejas devem ter para criar um novo ser humano? Não se trata de almejar o poder político ou terreno, mas sim de desenvolver o potencial transformador de cada um de nós e, consequentemente, de toda a sociedade. Os dogmas religiosos que, ao longo da história, foram usados para justificar a violência, a morte e a opressão, não se sustentam hoje. A fé não pode ser distorcida em nome de um poder terreno absoluto, o que resultaria na destruição em vez da construção de uma sociedade pacífica.
Precisamos ensinar a amar e ser solidário com nossas famílias e comunidades. Não é possível realizar grandes mudanças sociais e externas sem modificar nossos corações. Ele precisa estabelecer diálogos com o cérebro, examinar e aprender com os acertos e equívocos dessas vidas e da nossa história. A mente, guiada pela lógica, deve estender a mão ao coração sensível. O satanás não está fora de nós, mas sim escondido em nossos corações sofridos.
Quando compreendermos isso, o mundo será diferente, as mudanças necessárias serão realizadas e o reino de Deus poderá começar entre nós, já neste mundo. É imperativo iniciarmos uma campanha para criarmos uma cultura de paz entre nós mesmos, com os outros e com o planeta, onde as nossas armas sejam o amor e o respeito por todos os seres vivos. O amor não é arma que fere ou mata, mas sim um sentimento gravitacional que une, aproxima.
O amor não é egoísta nem possessivo, ele multiplica, partilha e nunca exclui. É o amor que dá sentido e direção à nossa vida pessoal e social. O amor é incondicional, sem limites e, por ser a única energia do universo que o ser humano ainda não aprendeu a controlar, nos causa medo. O amor é Deus e Deus é amor. O coração de cada um é uma bomba de amor, esperando que seja liberada para se espalhar e criar uma cultura de paz consigo, com os outros, com Deus e com o planeta.
O amor constitui um contraponto que nos impede de nutrir o ódio e destruir vidas.
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Aqueles que amam incondicionalmente acolhem-se mutuamente, fornecendo os fundamentos para a aceitação do outro e o reconhecimento das diferenças. Como posso acolher e amar o outro sem aceitar a minha história, a minha cor, o meu gênero e o meu legado? Que mecanismos uso para me blindar emocionalmente? A racionalização? Uma ideologia que me torna superior aos outros?
A somatização ou a anestesia por meio de medicamentos para tratar o mal-estar que surge nas ressonâncias da convivência? Esta nova cultura, enraizada no amor e na solidariedade, não apenas transformará as nossas vidas individuais, mas também será a chave para a construção de um futuro mais pacífico e harmonioso para toda a humanidade e para o planeta. Essa visão de um mundo melhor é um convite à reflexão e à ação, estimulando cada um de nós a cultivar a paz dentro de si e a espalhá-la ao nosso redor.
Nessas eleições, temos falado muito em mudanças. A verdadeira mudança começa dentro de cada um de nós, quando cultivamos o amor, o respeito aos outros, podemos contribuir para construir uma cultura de paz, um mundo mais pacífico e justo. Como pode um coração cheio de ódio, que tem o hábito de desrespeitar o outro, ser o promotor das mudanças que uma sociedade precisa? Julga-se um homem capaz de realizar grandes coisas, pela atenção que ele tem às pequenas coisas.