Deus e o Nobel da Paz

O prêmio do Nobel da Paz de 2019 foi entregue a Abiy Ahmed, primeiro-ministro da Etiópia e cristão pentecostal, no último dia 11 de outubro na Noruega. Ahmed foi responsável por colaborar decisivamente, através de um acordo de paz, para o fim da guerra fronteiriça entre seu país e a Eritreia que perdurava há mais de 20 anos e que deixou cerca de 80 mil mortos. Seu trabalho tem auxiliado também numa série de reformas sociais no intuito de trazer desenvolvimento à nação.

Além destes fatos, pouco depois que ingressou na política em 2010, criou o "Fórum Religioso pela Paz", tendo auxiliado na diminuição significativa dos conflitos entre mulçumanos e cristãos, criando desta forma, maiores condições de um relacionamento mútuo de tolerância entre ambos. Filho de mãe ortodoxa e de pai mulçumano, tornou-se membro ativo da Igreja do Evangelho Completo e, por esta razão, precisou desde muito cedo lidar com a questão da diversidade religiosa.

A biografia pessoal, trajetória política e especialmente a fé religiosa de Ahmed são motivos de grande inspiração no cenário contemporâneo. Em uma realidade onde muitas das vezes os próprios religiosos e religiões têm engendrado conflitos e violências "em nome de Deus", recuperar a dimensão de crítica social que a fé pode exercer diante das culturas de morte do nosso tempo torna as religiões fatores de mudança concreta no mundo. Nesse sentido, o exemplo de Ahmed nos mostra que a experiência religiosa não precisa ser sinônimo de fanatismo, intolerância e alienação, pelo contrário, sua vivência autêntica e profunda pode ser justamente uma agência de desenvolvimento da sensibilidade ética, da humanização solidária e do engajamento comprometido.

Que os atos de justiça social e compaixão inspirados pela fé religiosa sejam maiores do que qualquer tipo de violência e discriminação que queiram instrumentalizar de maneira inescrupulosa o divino!

Victor Breno

Teólogo e cientista da religião