Se estiverem corretos os prognósticos dos institutos mundiais que monitoram o clima, o Nordeste - o Ceará incluído - enfrentará, mais uma vez, o fenômeno El Niño, que causa enchentes no Sul e seca neste lado da geografia brasileira. Para uma região que há seis anos consecutivos enfrenta problemas causados pela baixa pluviometria, a consecução dessa previsão terá efeitos devastadores sobre as populações do semiárido nordestino, muitos de cujos municípios já são abastecidos de água pela emergência dos caminhões-pipa.
A natureza tem sido avara com o Nordeste brasileiro, negando-lhe as chuvas para a recarga dos açudes responsáveis pela oferta hídrica das populações de suas capitais e de suas grandes cidades. Os mais de 3,5 milhões de habitantes de Fortaleza, a quinta maior cidade do País, e de sua Região Metropolitana dependem, hoje, exclusivamente, das águas do Castanhão, o maior reservatório do Estado, que guarda agora apenas 6,7% de sua capacidade de 6,5 bilhões de m³. Situação semelhante é a do Orós, a montante, que represa só 8,1% dos 2,2 bilhões de m³ que pode represar. É quase nada para uma demanda de 10 m³ por segundo.
O Governo do Estado, cujo comando acaba de ser reeleito para mais quatro anos de gestão, preocupa-se com as consequências sociais e econômicas que poderão advir de mais uma temporada de chuvas bem abaixo da média. Sua Secretaria de Recursos Hídricos (SRH) e sua Companhia de Gestão de Recursos Hídricos (Cogerh) trabalham árdua e aceleradamente no que pode ser chamado de Plano B - o uso de águas dos aquíferos sob as dunas do litoral desde Cascavel, a Leste, até Paracuru, a Oeste, e a construção de uma usina de dessalinização, cuja obra ainda não foi iniciada por causa das exigências da burocracia estatal que, em situações extremas como esta, deveria ser abreviada para permitir expeditas providências.
Por causa dos limites impostos pela natureza à oferta de água no Ceará - cujo Governo, cumprindo a legislação, privilegiou o abastecimento humano e a dessedentação animal - algumas empresas da fruticultura e da aquicultura transferiram-se daqui para outros estados, levando consigo milhares de empregos agora localizados no Piauí, no Rio Grande do Norte e em Pernambuco. Se, por um lado, houve prejuízos à fruticultura irrigada e à produção de tilápia, por outro foi garantido o abastecimento de água às sedes municipais por meio de adutoras de engate rápido, que hoje transportam água de açudes estratégicos para as torneiras das populações interioranas. Surge, agora, o problema: a água desses açudes já escasseia - alguns chegaram ao que tecnicamente se denomina porão. Como faltam ainda três meses para o início da pré-estação chuvosa, que pode ser frustrada pelo El Niño, as autoridades da SRH e da Cogerh não têm dúvidas de que é necessário e urgente apressar a execução do que está programado.
O Projeto São Francisco de Integração de Bacias é, hoje, diante do que acena a ciência para os próximos meses, a tábua de salvação para a oferta de água ao Ceará. Seu Canal Norte ainda não ficou pronto. E mesmo que o seja até o dia 31 de dezembro, suas águas só alcançarão o destino final - o Castanhão - três meses depois de chegarem ao chão cearense de Jati. Esta é uma ansiedade. Mas há outra: Ongs e os partidos políticos ambientalistas juntaram-se para impedir que o Governo do Estado transfira para o Complexo do Pecém 20% da água do Lagamar do Cauípe. Essa transferência só seria feita quando - e só quando - a lagoa estivesse vertendo, o que sempre acontece nas épocas de chuva. Ou seja, não só contra a natureza têm de lutar as autoridades governamentais, mas igualmente contra correntes ideológicas.