E se existisse um teste de DNA que encontrasse o par perfeito de cada pessoa? Se fosse possível enviar uma pequena mecha de cabelo para uma empresa, comparar o material genético com um banco de dados amplo de todas as pessoas do mundo e descobrir quem é o grande amor vida? Sem erros. Essa possibilidade distópica é o tema do livro “The One”, do escritor inglês John Marrs, que acaba de virar uma série da Netflix.
Assistir a essa série desfaz e refaz tudo o que sabemos sobre amor, até aqui. Nos faz pensar. Desde as tragédias gregas, os dramas de Shakespeare, as novelas de Jane Austen, desde que existe literatura, música, cinema, teatro, é notório que a dor de amor atravessa a vida humana e parece tentador imaginar a possibilidade de evitá-la.
É semelhante a sonhar com uma vacina que nos salve das desilusões, dos enganos, dos anos perdidos investindo na pessoa errada, às vezes a mais errada de todas. Seríamos salvos de coisas mais graves, inclusive.
A boa arte busca sua inspiração nos dramas humanos. Esta ficção científica, “The One”, é mais um exemplo disso. Viver nos tempos de hoje é ter as experiências atravessadas constantemente pelos aparatos tecnológicos, mesmo quando não queremos, mesmo quando pensamos que estamos livres disso.
Basta uma conversa entre duas gerações sobre, por exemplo, como e onde conhecer pessoas, onde encontrar as paixões, para entender o quanto tudo isso é mistério. As histórias de amor dos nossos pais e avós começaram na total dependência do acaso. Quem teve sorte com isso foi feliz. Quem não teve, sofreu, sofre e faz o que pode e o que sabe com sua dor.
Tem gente que faz samba. Paulinho da Viola, por exemplo. Vinícius de Moraes. Outros escrevem livros. E temos como um dos maiores exemplos de falta de sorte na história da arte a tragédia de Romeu e Julieta. Quis o destino que este amor fosse o mais proibido, o mais impossível, o de mais triste fim.
Enquanto estou assistindo a esta série, fico pensando onde isso vai dar, até onde o autor vai levar a ilusão de que a tecnologia descobriu uma maneira de curar as dores de amor da humanidade. Ainda não existe o tal teste de DNA, mas os aplicativos de relacionamentos já tentam fazer algo muito parecido. E tem dado certo, sim. Há muitos pares felizes que começaram suas histórias por dentro dos seus celulares.
Os casamentos longevos costumam esconder seus segredos. É uma curiosidade que sempre tenho quando encontro um par que já comemorou várias bodas e que são realmente felizes. Há sempre uma dose alta de paciência, tolerância, até de sacrifícios.
As vidas cruzadas atravessam tempestades. Os psicólogos tentam explicar como é que funciona. Agora existem profissionais especialistas nisso e que prometem salvar qualquer relação. Não há receita, é sempre algo sem respostas.
A grande questão dos nossos tempos está em entender até onde a tecnologia pode mesmo atuar. Existe uma alma gêmea a solta, o par ideal de cada pessoa? Isso é determinado no DNA? Está escrito no livro do destino?
E quando acontece de alguém encontrar este amor sem teste, sem aplicativo, sem cupido, só contando mesmo com a benevolência do acaso?
O nome disso é sorte. Talvez a maior sorte possível de uma vida. É por ela que todo coração espera. O amor verdadeiro, esta busca e certeza, é o que salva a raça humana todos os dias. Quem achou o seu, cuide bem, todos os dias.
*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.