No dia 15 de abril, o Brasil celebra o Dia Nacional da Conservação do Solo. A data foi criada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) com intuito de conscientizar as autoridades, empresários, produtores rurais, agricultores e a sociedade em geral, para importância deste recurso natural responsável pelos alimentos que colocamos em nossas mesas, pela reciclagem de matéria orgânica e depósito natural da água que corre em nossas cidades.
Por sua importância em nossas vidas, o solo também é lembrado em 22 de abril, quando se comemora o Dia Internacional da Mãe Terra, e em 5 de dezembro, quando é celebrado o Dia Mundial do Solo. É a partir do solo conservado que é possível garantir o acesso à água potável, à produção de alimentos, à regulação do clima, assim como o equilíbrio dos biomas e sua biodiversidade.
Para falar sobre esse componente natural de extrema relevância, a coluna convidou um especialista no assunto. O engenheiro agrônomo Assis Bezerra Leite é especialista em solos na área de Gênese, Morfologia e Classificação, Recursos Naturais, membro da Comissão para Elaboração de Minuta de Projeto Lei “Politica Nacional de Uso e Conservação do Solo Rural do Brasil, coordenador do Núcleo Regional de Estudos de Classificação de Solos do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos, diretor do Núcleo Nordestino de Ciência do Solo e, atualmente, é vice-presidente da Associação dos Engenheiros Agrônomos do Estado do Ceará (AEAC), dentre outras ocupações relacionadas ao estudo dos solos e dezenas de trabalhos e livros publicados na área de solos e meio ambiente.
DN - O que são solos degradados?
Assis Bezerra Leite - São aqueles que sofreram modificações em sua natureza de um declínio de sua qualidade, incluindo deterioração física, química e biológica, por interferências antrópicas, tornando o solo incapaz de sustentar adequadamente sua função ecológica natural ou uma função econômica.
DN - O que causa a degradação das terras?
Assis Bezerra Leite - A falta de informação sobre os solos provoca o desconhecimento de suas peculiaridades e vulnerabilidades. Assim, eles são mal utilizados em muitas ocasiões, ou seja, de forma não compatível com a sua conservação. São necessários estudos de solos em escalas compatíveis que permitam seu melhor conhecimento para uma produção agronômica mais sustentável. Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) indicam que o manejo inadequado do solo reduz em até 8% ao ano o Produto Interno Bruto (PIB) nos países em desenvolvimento.
DN – A degradação dos solos ocorre apenas nas áreas agrícolas?
Assis Bezerra Leite – Não! segundo, Guilherme Karam, coordenador de Negócios e Biodiversidade da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, “quando se fala em conservação do solo não se deve pensar apenas em áreas com presença de agricultura, de florestas ou de outras áreas naturais. A Intervenção é de grande importância também nas grandes cidades”.
DN - Cite algumas razões que tornam as terras menos produtivas?
Assis Bezerra Leite - Dentre outras poderemos citar a má utilização das terras para cultivo; a perda da matéria orgânica; a diminuição dos elementos nutritivos; a desagregação dos solos e a perda do próprio solo. E isto ocorre devido ao uso inadequado das terras, como por exemplo, terras sem vocação para cultivo e sim para pastoreio que são utilizadas para a produção agrícola, irrigação mal feita sem o sistema adequado de drenagem, uso de terras muito declivosas sem os devidos cuidados, dentre outros motivos.
Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), aproximadamente 33% dos solos do mundo estão degradados. Na América Latina, cerca de 50% dos solos estão sofrendo algum tipo de degradação. No Brasil, segundo a EMBRAPA, só no estado do Paraná, o prejuízo anual chega a U$ 241 milhões em perdas de nutrientes através da erosão do solo. E no Ceará, segundo a FUNCEME, cerca de 11% dos solos, encontram-se degradados em processos de desertificação.
DN - O que estamos fazendo para diminuir ou estancar esta degradação de solo?
Assis Bezerra Leite - Em termos gerais, é necessário que as autoridades, empresários, agricultores, pecuaristas e a sociedade em geral, tomem consciência da importância do solo. Há oito anos, a EMBRAPA e o Tribunal de Contas da União(TCU) elaboraram a Carta de Brasília, com recomendações aos tomadores de decisão sobre o manejo e conservação da terra. Outra iniciativa importante, do ponto de vista prático, foi a criação do Programa Nacional de Solos do Brasil (PRONASOLOS) que reúne um grupo de especialistas de todo o país a fim de criar instrumentos para a governança dos solos do Brasil.
E mais recentemente, a Confederação de Engenheiros Agrônomos do Brasil (CONFAEAB), em conversações com a ministra da Agricultura e apoio de deputados e senadores, criou uma comissão de especialistas, para a elaboração de uma minuta de Projeto Lei da Conservação do Solo e Água do Brasil. Eu tenho a honra de fazer parte dessa comissão representando o estado do Ceará. O documento deve ficar pronto até o final do mês de maio e será entregue a assessoria jurídica da CONFAEAB.
DN – E Sobre o Ceará Especificamente?
Assis Bezerra Leite – Existem várias ações de órgãos como Universidades, Secretaria de Desenvolvimento Agrário, EMATERCE e Institutos de Pesquisas. A FUNCEME, por exemplo, desde a década de 90 tem procurado monitorar as áreas do Estado do Ceará degradadas em processos de desertificação, tendo já alcançado resultados significativos.
A Fundação também participa de um projeto de recuperação de áreas degradadas no Médio Jaguaribe que tem mostrado resultados exitosos. E é muito importante salientar que a FUNCEME está elaborando o Levantamento dos Solos do Estado do Ceará em escala capaz de dar subsídios aos projetos de desenvolvimento agrícola de maneira adequada indicando a vocação e os cuidados necessários para a preservação dos solos. Os resultados deste trabalho em breve estarão à disposição das autoridades, agricultores, técnicos e população em geral.
DN – O que o senhor espera para os próximos anos?
Assis Bezerra Leite – Vou encerrar com duas frases que podem traduzir o que temos que fazer para preservar e conservar nossos solos. Uma das frases é de Franklin D. Roosevelt: “É nosso dever proteger o maior patrimônio nacional, porque a nação que destrói seu solo destrói a si mesma”. A outra é de Arnaldo Colozzi, pesquisador e Diretor do Núcleo Paraense da Ciência do Solo: “O solo, esta fina e frágil camada que recobre a superfície da Terra e leva milhões de anos para ser formada, pode ser perdida e degradada pela erosão em poucos anos de uso, tornando-se improdutiva ou reduzindo sua capacidade de produzir alimentos, pastagens, fibras e biocombustíveis para uma população cada vez maior e mais exigente”.
Então, no Dia Nacional da Conservação do Solo vamos fomentar mais as ações e discussões sobre o tema, gerar curiosidade e pesquisa sobre o assunto. Pensar no que cada um pode contribuir para a conservação do solo no país e no mundo ou, pelo menos agradecer por nossas refeições que, graças aos solos, podem nos alimentar.