'Quero conhecer as potencialidades do Ceará para poder anunciar projetos', diz nova cônsul dos EUA
Afinal, o que o Ceará tem que possa interessar aos Estados Unidos? Em entrevista exclusiva ao Sistema Verdes Mares, a nova cônsul-geral no Consulado Geral dos EUA no Recife, Jessica Simon, lembra que mais de 34% dos produtos exportados do Estado vão para os EUA.
"Quero conhecer de perto as potencialidades do Ceará para poder anunciar projetos futuros. Posso adiantar que temos muito interesse na área de energia renovável", adianta a diplomata.
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Estabelecido em 1815, o Consulado-Geral dos EUA no Recife é a representação diplomática americana mais antiga no Brasil. "Estou ansiosa para visitar Fortaleza assim que possível", revela. Simon vai trabalhar com oito dos nove estados do Nordeste (Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba, Sergipe, Alagoas, Piauí e Maranhão. "Quero reforçar nossos laços e estabelecer parcerias principalmente nos setores de comércio, segurança e educação", destaca.
Há previsão para a retomada das entrevistas para solicitantes de vistos?
Os consulados e embaixada dos EUA no Brasil estão com emissão de visto suspensas desde o dia 17 de março. Cheguei ao Nordeste no mês de setembro com as cidades aos poucos retomando as atividades. Assim como outras instituições, continuamos trabalhando com setores do consulado, com nossos funcionários em home office. Estamos nos preparando para o retorno das emissões de visto assim que possível, sempre pensando na proteção dos solicitantes de visto que irão ao CASV (Centro de Atendimento ao Solicitante de Visto) ou ao consulado no Recife para entrevista, mas ainda não temos data prevista para o retorno.
Nesse período, estamos sempre em contato com o público com informações sobre vistos no website e no nosso Instagram (@consuladoeua_nordeste). Desde de minha chegada, já tive a oportunidade de visitar, com o embaixador dos EUA Todd Chapman, as cidades de João Pessoa (PB) e Natal (RN), e estou ansiosa para visitar Fortaleza assim que possível.
Há empresa aérea vendendo passagens para voos do Ceará para os EUA em 2021. Há indicativo de quando o fluxo de turistas entre os dois países se normaliza?
Durante toda a pandemia, os voos partindo do Brasil para os EUA permaneceram. Apesar da redução de opções, os voos saindo de São Paulo continuaram e as fronteiras estão abertas. A United Airlines anunciou que vai retomar voos do Rio de Janeiro para Houston a partir de novembro, o que é um bom exemplo desse movimento de retomada econômica. Assim como em outros países, medidas tiveram que ser tomadas por conta dos números da Covid-19. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) continua recomendando que os viajantes internacionais entrem em quarentena por 14 dias quando viajam de áreas de alto risco, e o Brasil está nesta lista. Essa restrição não se aplica a cidadãos norte-americanos, residentes permanentes legais (portadores de green card), familiares imediatos de cidadãos norte-americanos e residentes permanentes legais e categorias específicas. Mas também não temos previsão de quando essa restrição irá ser alterada.
O Nordeste brasileiro é bastante distinto, com estados com diferentes pautas de exportação e perfis socioeconômicos. No entanto, a representação diplomática dos EUA se concentra em Pernambuco, focada em interesses econômicos desse Estado, como o recente acordo de cotas do açúcar - um produto que o resto do Nordeste não exporta e, portanto, não tem nenhum interesse e nem se beneficia desse acordo. Há algum plano para diversificar a abordagem dos EUA em relação ao Nordeste?
Os EUA e o Estado do Ceará têm uma história de forte cooperação e com os EUA e prioridades em comum como os setores de tecnologia, infraestrutura, segurança, saúde e educação. E essas são as parcerias que foram criadas nesta relação bilateral ao longo dos anos e que vão continuar. Em 2013, a Agência dos EUA para Comércio e Desenvolvimento (USTDA) ajudou o Município de Fortaleza a implementar a primeira infraestrutura que permitiu a inclusão digital de 2,5 milhões de pessoas. Atualmente, existem 184 municípios no Estado do Ceará conectados por cabos de fibra óptica. Fortaleza também é a líder nacional e a segunda do mundo no mercado de cabos submarinos de fibra óptica. Um dos cabos foi fornecido pela empresa norte-americana Seaborn Networks e conecta o Brasil aos EUA.
Em relação à parceria em segurança, quero destacar os treinamentos feitos com o apoio do Serviço de Segurança Diplomático (DSS) com a equipe do aeroporto de Fortaleza, em setembro de 2019, e o seminário on-line sobre cooperação - com apoio do FBI e de empresas privadas, como Uber - para as polícias Civil e Federal do Nordeste, em maio de 2020.
Também temos dois centros de EducationUSA, no Instituto Brasil - Estados Unidos no Ceará (IBEU-CE) e na Universidade de Fortaleza (Unifor), que fornecem orientação gratuita sobre oportunidades de estudo nas mais de 4.500 instituições de Ensino Superior nos EUA. Em setembro deste ano, o Escritório do Representante de Comércio dos EUA (USTR) anunciou as alocações de quantidades adicionais do Ano Fiscal de 2020 em cotas tarifárias para o açúcar bruto importado de 80 mil toneladas para o Brasil. No Nordeste, a medida que pode beneficiar não apenas Pernambuco, mas outros estados produtores, como Alagoas.
No Consulado, temos um escritório de promoção comercial e atração de investimentos, U.S. Commercial Service, que atua para apoiar empresas do Nordeste em fazer parcerias comerciais com os EUA. Fazemos essa divulgação porque sabemos que esse tipo de promoção comercial adquiriu grande importância para apoio às empresas cearenses interessadas em mercados estrangeiros.
Também já realizamos alguns eventos em Fortaleza do SelectUSA, nosso principal programa de atração de investimentos para os EUA. O último foi em setembro de 2019, e espero que em breve possamos realizar outros. Queremos avançar junto com o Nordeste. Estou aqui para entender melhor a região e estabelecer um diálogo que seja importante para a relação de toda a região com os EUA.
O setor turístico é muito importante para a economia do Ceará. Antes da pandemia, o setor explorava o turismo para Orlando, principalmente viagens de famílias para visitas a parques de entretenimento. Com a pandemia, esse nicho de mercado desapareceu. A burocracia para conseguir um visto para os EUA (exigência de entrevista em Pernambuco) é um dos entraves para aumentar esse fluxo de turistas para os EUA. Há alguma perspectiva de facilitar esse processo?
As entrevistas podem ser feitas não apenas no Recife, mas nos consulados de Porto Alegre, São Paulo e Rio de Janeiro, além da embaixada em Brasília. E início do processo para a solicitação do visto americano é on-line: os solicitantes podem agendar a entrevista e pagar a taxa na internet.
Apesar de não termos sede em Fortaleza, estamos presentes sempre que possível na cidade para participar de reuniões e eventos. Infelizmente, durante a pandemia, tivemos que suspender nossas viagens. E também paramos temporariamente de fazer palestras presenciais sobre vistos em universidades, institutos federais e feiras de turismo. Esperamos que, em breve, as instituições retomem suas atividades e que possamos estar presentes novamente.
Quais são as ações prioritárias do Consulado previstas para o Ceará?
Vamos continuar expandindo a cooperação em educação, segurança, infraestrutura e economia. E nesta área comercial, aproveito para destacar o laço forte entre o Ceará e os EUA: mais de 34% dos produtos exportados do Estado vão para os EUA. Este dado do Ipece (Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará) chamou muito minha atenção e quero conhecer de perto as potencialidades do Ceará para poder anunciar projetos futuros. Posso adiantar que temos muito interesse na área de energia renovável, por exemplo. A presença de empresas americanas no Ceará, como Coca-Cola Solar, Del Monte, Phoenix Services e outras, são reflexo dessa relação comercial forte, que gera investimentos no Estado e resultam em mais empregos para a população local.
Reconhecendo que a região é única no Brasil e os governadores estão cada vez mais trabalhando juntos por meio do Consórcio do Nordeste, os Estados Unidos estão abertos à parceria com a região para avançar nossos objetivos comuns em educação, segurança e comércio que beneficiam os dois países. E como mencionei segurança, gostaria de destacar que segurança da Internet é uma grande preocupação dos EUA, e que é um assunto relevante também para o Ceará, principalmente por conta do investimento em cabos submarinos. Em abril, o Secretario de Estado, Mike Pompeo, anunciou a iniciativa Rede Limpa, um esforço abrangente para lidar com a ameaça de longo prazo à privacidade de dados, segurança e direitos humanos. Mais de 30 países já fazem parte desta rede. Governos e o setor privado podem fortalecer a Rede Limpa examinando empresas que fornecem tecnologia com os mais altos padrões de confiança e transparência.
A pandemia criou uma crise humanitária em todo mundo. No Nordeste, os EUA se engajaram em trabalhos como doações de equipamentos de saúde, até um hospital de campanha no Maranhão, entre outros. Qual a avaliação da imagem dos EUA com o povo nordestino durante os últimos meses de pandemia?
O combate à pandemia da Covid-19 é uma das prioridades do governo dos Estados Unidos. Por isso, nossas ações no Nordeste têm como objetivo apoiar a proteção da saúde pública. Ainda não temos data, mas em breve faremos uma doação de EPIs, kits de higiene e cestas básicas no Ceará. O material chegará à população e aos profissionais de saúde através de parceria com as secretarias de Saúde e de Proteção Social. Já fizemos doações como esta no Maranhão e em Pernambuco. Isso tudo faz parte do compromisso do governo americano no Brasil no enfrentamento à pandemia da Covid-19. Estamos trabalhando intensamente para implementar um pacote de assistência em todo o Brasil, priorizando profissionais de saúde e populações vulneráveis.
Quais são suas expectativas em relação às atividades do Consulado e seus principais desafios nessa nova função?
Estou muito feliz em poder voltar trabalhar no Brasil como diplomata. Entre os anos de 2012 a 2016, estive no Rio de Janeiro como cônsul de Diplomacia Pública, atuando nas areas de Imprensa, Educação e Cultura. Estava lá durante as Olimpíadas e foi uma experiência incrível. Agora vou trabalhar com oito estados do Nordeste (Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Paraíba, Sergipe, Alagoas, Piauí e Maranhão) e quero reforçar nossos laços e estabelecer parcerias principalmente nos setores de comércio, segurança e educação.
É um desafio iniciar meu trabalho durante uma pandemia. Continuamos seguindo protocolos relativos à Covid-19 e aos poucos estou programando viagens para os estados e já fazendo contato com instituições e representantes dos governos estaduais e municipais através de videoconferências. Quero também conhecer nossos alumni, participantes de programas promovidos pelo governo dos Estados Unidos, que moram no Ceará.
É um momento de retorno das atividades econômicas e considero importante que trabalhemos juntos para avançar interesses em comum, ampliar investimentos e gerar resultados concretos de nossas parcerias.
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