No Dia Nacional do Livro, gestora comenta os rumos do setor no Ceará a partir da pandemia

Coordenadora de Política de Livro e Leitura da Secult-CE, Goreth Albuquerque dimensiona a situação da área no Estado devido aos impactos da pandemia do novo coronavírus

Escrito por Diego Barbosa , diego.barbosa@svm.com.br
Legenda: São inúmeros os desafios enfrentados pelo setor do livro partir do turbulento momento de crise sanitária
Foto: Fabiane de Paula

Ferramenta. Suporte. Mola propulsora para a transformação. Inúmeras são as conotações que o livro pode adquirir mediante a percepção de cada indivíduo. Não à toa, dada a pluralidade das narrativas compartilhadas, há uma data específica no Brasil para celebrar o objeto que, há séculos, põe em contato, por meio das palavras, diferentes geografias, culturas e saberes.

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Trata-se do Dia Nacional do Livro, comemorado nesta quinta-feira (29). A efeméride nasceu há exatos 210 anos, em 29 de outubro de 1810. À época, foi fundada a Biblioteca Nacional, localizada no Rio de Janeiro, cujos primeiros títulos do acervo foram disponibilizados pela Família Real Portuguesa. De lá para cá, anualmente o livro e a leitura ganham um lugar de destaque num instante de comemoração do conhecimento.

Neste ano, contudo, dada a pandemia do novo coronavírus, as atividades agendadas para a data tiveram que migrar para o meio digital. Muitas, por outro lado, não acontecerão, o que representa um dos inúmeros desafios enfrentados pela área partir do turbulento momento de crise sanitária.

Coordenadora de Política de Livro e Leitura da Secretaria da Cultura do Ceará (Secult-Ce), Goreth Albuquerque dimensiona a situação na esfera local. Ela conta que o setor editorial e livreiro vem enfrentando um panorama difícil há algum tempo, tanto em produção quanto em vendas.

“Mas a queda é intensificada na pandemia, porque também temos um agravamento das questões econômicas em escala mundial. Do ponto de vista nacional, a última pesquisa de comportamento desse mercado, divulgada em meio à pandemia, informa um crescimento de pouco mais de 6%, com foco em alguns subsetores, apesar da queda no valor de venda do livro”, explica.

Ela percebe que as editoras têm se reinventado na relação com o público, fortalecendo a criação de conteúdos em mídias digitais com várias atividades, além da venda direta em seus sites e perfis. Porém, esse é um ponto conflitante com o mercado livreiro, também fragilizado e ainda mais agravado por conta da pandemia. 

“As pequenas livrarias geralmente são organizadas para promover uma experiência sociocultural a partir de encontros presenciais em torno do livro. Tivemos um longo tempo em que elas ficaram de portas fechadas. Algumas seguiram entregando livros, mas o pequeno livreiro não consegue concorrer com as ofertas das editoras e das grandes plataformas de varejo on-line, o que tem sido um problema há décadas e não de agora”, complementa.

Legenda: Goreth Albuquerque considera ser necessária uma pesquisa da economia do livro que retrate o mercado editorial
Foto: Natinho Rodrigues

Medidas

Diante da situação, Goreth considera ser necessária uma pesquisa da economia do livro que retrate o mercado editorial cearense, tanto no que concerne à produção quanto ao varejo, além do perfil de consumo. Os dados ajudarão no acompanhamento dos passos na área nos próximos anos, quando este difícil instante passar.

“Durante a pandemia, a Câmara Brasileira de Livros fez uma campanha de ajuda a pequenas livrarias do País que foram prejudicadas pela crise sanitária e tivemos algumas de Fortaleza contempladas. Me parece um fator de constatação da dificuldade que se agravou”, diz. “Em linhas gerais, o que está na base da preocupação de todos e todas é o cenário de incerteza, que é um fator exógeno sobre o qual realmente não temos controle, e que nos impõe limites severos”.

A gestora destaca que, nos últimos meses, a coordenadoria sob seu comando dialogou especialmente sobre a Lei Aldir Blanc, encarada como um horizonte de estabilização. Por meio dos editais lançados, vários dos integrantes desses elos da cadeia puderam construir propostas. “Isso nos absorveu muito”, considera.

Legenda: Gestora sublinha a relevância de, mesmo diante de todas as problemáticas e imprecisões, celebrarmos o dia dedicado ao livro
Foto: Fabiane de Paula

Sob outra perspectiva, Goreth avalia ainda ser prematuro afirmar o tamanho do impacto da pandemia no setor, no que toca ao cancelamento de feiras e eventos literários, porque esse campo carece de um maior levantamento, já que são responsáveis pelo incremento financeiro na área. Mas todos as grandes iniciativas do campo do livro, a exemplo de Bienais, Feiras e Festas Literárias, foram suspensas na modalidade presencial, tanto no Brasil quanto em outros países. Tais ações são significativas, tanto para a indústria quanto para o varejo. 

“Apenas a última Bienal do Ceará gerou cerca de três mil empregos diretos e indiretos”, calcula. “Alguns eventos já calendarizados para 2020 realizaram ou vêm realizando programações on-line, o que caracteriza mais uma existência simbólica, uma resistência. O governo do Ceará tem estabelecido medidas que visam garantir as condições de segurança e vida desde o início da pandemia. Ainda não é possível prever nada. Não dependemos só de condições técnicas ou financeiras de produção de cultura nesse contexto”.

Relevância

Por fim, a gestora sublinha a relevância de, mesmo diante de todas as problemáticas e imprecisões, celebrarmos o dia dedicado ao livro. “A experiência sensível por meio da leitura segue alimentando a imaginação e o encontro. E, mesmo que em contextos longe das relações presenciais, por meio das tecnologias disponíveis para encontros virtuais, tenho vivido e sabido de experiências intensivas em pequenos grupos de leitura literária, de estudos de poesia e mediação de leitura”, enumera.

“Livros não são só objetos, são ideias e também é economia. Por isso e muito mais é que essa criação da nossa cultura precisa ser comemorada, especialmente no momento político que vivemos. É preciso reafirmar a importância dos livros e da política cultural para o livro, a leitura, a literatura e as bibliotecas. Não retroceder”, conclui.

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