Editorial: Violência no alvo

O Dia Internacional dos Direitos Humanos - celebrado anualmente no dia 10 de dezembro - marca o desfecho de mais uma campanha "16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres". Iniciativa internacional foi concebida no Instituto de Liderança Global das Mulheres, do Reino Unido, em 1991, e continua a ser coordenada anualmente pelo Centro para Liderança Global das Mulheres.

O projeto foi concebido como uma estratégia de mobilização de indivíduos e instituições, e entre países, no sentido de reforçar a prevenção da violência contra as mulheres e meninas. Em todo o mundo, são registrados anualmente cerca de 90 mil casos de feminicídio - ainda que se acredite que o número é resultado de subnotificação, dada a resistência em certos lugares de se reconhecer a natureza específica deste tipo de crime. O Brasil ocupa a incômoda quinta posição entre os países com maior incidência de mortes do gênero. Os dados são da Organização Mundial da Saúde (OMS), que documentou 4,8 assassinatos para cada grupo de 100 mil mulheres no País.

O Brasil é uma das democracias que, há anos, encampa a campanha de conscientização que almeja eliminar esta prática - a violência como crime de ódio. Alinha-se, assim, ao programa da Organização das Nações Unidas (ONU), que incluiu em seu famoso - e ousado - pacote de metas para 2030 o fim da violência contra as mulheres. O organismo internacional tem contribuído para articular ações globais, que catalisem a conscientização das populações e das classes políticas dos países membros, bem como o estímulo de esforços já existentes no sentido de defesa dos direitos deste setor da sociedade.

Um passo importante, nessa direção, foi dado em 2015, quando foi aprovada no País a Lei 13.140, que tipificou o feminicídio e o incluiu no Código Penal, na condição de circunstância qualificadora do crime de homicídio. As mortes motivadas pela condição de gênero da vítima também passaram a figurar na categoria de crimes hediondos, que aumenta a severidade da pena dos condenados. Legalmente, entende-se como feminicídio crime que envolva violência doméstica e familiar e menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

A campanha deste ano, contudo, fora em outro crime que se abate sobre a população feminina: o estupro. No Brasil, são registradas 180 agressões sexuais do tipo por dia; 82% das vítimas são mulheres e mais da metade tem menos de 13 anos. Os números, contudo, são a tradução imperfeita de uma realidade ainda mais terrível. A impunidade de agressores, o estigma imputado às sobreviventes e razões culturais (como o não reconhecimento, por alguns, de práticas como o estupro dentro do casamento) criam obstáculos para as vítimas quando da decisão de denunciar os casos.

Articulações internacionais do tipo devem ser levadas, em cada País, até para seus recantos mais isolados. A insistência em debater o tema é fundamental para reverter uma chaga histórica, que vai de encontro a qualquer princípio humanista e viola os ideias de igualdade partilhados por todos os regimes democráticos. Negligenciar esforços de combate à violência contra as mulheres é, também, fazer ouvidos surdos ao que a Constituição garante a seus cidadãos.