Editorial: Os abusos do poder

Em seis meses, será iniciada oficialmente a campanha eleitoral para o pleito de outubro, quando serão renovados os quadros municipais dos poderes Executivo e Legislativo. Há claros movimentos por parte de indivíduos, grupos e partidos para se ocupar as posições na disputa. Não se poderia esperar algo diferente, dado que as alianças precisam ser desenhadas e os projetos políticos, acordados, em princípio, para o bem da coletividade. Contudo, existem limites a serem respeitados nesta empreitada, em favor do interesse público.

No período que antecede a campanha, são proibidos pela Justiça Eleitoral a apresentação de si ou de aliado como candidato a cargo eletivo; propaganda envolvendo custos, sejam quais forem suas fontes de financiamento; e o pedido direto de votos. Casos do gênero são explícitos em sua irregularidade, desrespeitando prazos e, assim, a igualdade de oportunidades para todos aqueles que se lançam em disputa. Por isso mesmo, são relativamente fáceis de serem identificados, documentados, denunciados e, quando inquestionáveis, punidos.

Outras irregularidades mais sutis – mas não menos “eleitoreiras” e contrárias ao processo democrático – já estão na mira das instituições regulatórias. O Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) mantém em atividade o Centro de Apoio Operacional Eleitoral (Caopel), atento a ações proibidas pela lei. Criado em 2008, tem como objetivo promover “a articulação, integração e intercâmbio entre os respectivos órgãos de execução e outros que se relacionem ao fenômeno das eleições”, segundo descrição oficial. 

O MP já manifestou a necessidade de se atuar com o objetivo de coibir infrações e evitar prejuízos maiores. A punição é imperativa, em casos de contravenções e crimes eleitorais; o ideal, contudo, é que tais situações não cheguem a acontecer. Infelizmente, não é tão raro ver municípios voltarem às urnas em votações extraordinárias, motivadas por cassações de prefeitos. É, contudo, impossível reverter os feitos daqueles que chegaram ao Executivo ou ao Legislativo por meios ilegítimos.

São mais complexos e diversos, os três tipos de abuso de poder, com finalidades eleitorais: político, econômico e religioso. Constituem-se, mesmo, “tradições” políticas – decerto negativas –, arraigadas na prática e, permanentemente, se impondo como um desafio a ser enfrentado a cada nova geração. 

O abuso do poder político é o uso da máquina pública para sequestrar a liberdade do voto. Subverte-se, neste caso, a missão de servir ao povo; o que lhe é de direito é ofertado, de modo a influenciar seu voto. O abuso do poder econômico se caracteriza pela utilização excessiva de recursos financeiros, para beneficiar candidatos ou grupos políticos, antes ou durante o processo eleitoral. Aqui, também, o interesse corrupto se esconde sob aparente correção de atos, como a caridade. Por fim, e com cada vez mais incidência, há o uso de espaços e posições religiosos em campanhas, na tentativa de fazer dali palanque para dirigir currais eleitorais.

MP e tribunais eleitorais têm, diante de si, um desafio, dado a abrangência do território e das práticas e a insuficiência de meios para combatê-las. Devem contar, assim, com o apoio e a vigilância dos maiores interessados: os cidadãos.