Regina Duarte: namoradinha da cultura?

Depois do fiasco de Roberto Alvim à frente da Secretaria Especial da Cultura, Governo Federal recorre a um nome famoso, mas que representa uma incógnita como gestora

Legenda: Regina Duarte é um dos raros nomes da classe artística a abraçar a candidatura bolsonarista
Foto: Foto: Reprodução/Twitter

No ritmo que vai, o noivado de Regina Duarte com o Governo Bolsonaro deve mesmo terminar em casamento. O lar em Brasília seria o gabinete da Secretaria Especial de Cultura, do Ministério da Cidadania. A performance da atriz, desta vez, é uma incógnita, ao contrário de suas repetitivas atuações como Helenas.

Regina Duarte não é uma gestora experiente. Seu currículo é outro. Ela já foi estrela de primeira grandeza no firmamento da TV brasileira, e isso quando a telinha reinava absoluta. Era a "namoradinha do Brasil", protagonista recorrente de telenovelas. Mesmo avançando na idade, ela superava a preferência por "mocinhas" mais jovens. Até o jogo virar.

Em 2002, a atriz errou a mão e o momento, ao gravar um vídeo em apoio à campanha presidencial de José Serra (PSDB). Na tela, aparecia sem se esconder por trás de personagens, afirmando ter "medo" das consequências de uma eventual vitória de Lula (PT) nas urnas. Soou feio o alarmismo. O petista venceu, e Regina virou meme antes da era dos memes. Seu papel de apavorada é, agora, tão famoso quanto a sua interpretação da Viúva Porcina, em "Roque Santeiro".

À época, foi criticada pelo tom e, entre seus pares, ouviu reprovações por se misturar tanto assim com política. Não cabia aos artistas (e, nesse caso, os famosos) se envolver em negócios do tipo. De lá para cá, a atriz sofreu um processo de apagamento, perdendo muito de seu destaque costumeiro.

Hoje, até parece estranho que Regina Duarte tenha se "queimado" tanto por sua postura. No choque civilizatório de ideologias e projetos políticos que assola o Brasil, declarações de apoio tornaram-se frequentes entre famosos - inclusive, entre os colegas de ofício e fama. Para ficar em dois exemplos, basta citar Zé de Abreu e Carlos Vereza, divergentes entre sí, mas muitíssimos mais exaltados do que a atriz.

Depois da redemocratização, os famosos da cultura brasileira preferiram se manter à distância da pauta política. Ou não se entrava no tema ou se recorria a discursos generalistas, contra a corrupção e com críticas vagas à performance da classe política (pense no Capital Inicial fazendo cover de "Que país é esse?" e é bem por aí a tragédia).

Regina Duarte fez colocações pontuais, sempre contundentes e polêmicas. Foi antipetista antes da onda que ajudou a eleger Bolsonaro e apoiou ruralistas (porque tem negócios na área) contra demarcações de terra. Nas eleições de 2018, ficou de lado dos bolsonaristas. São essas suas credenciais ideológicas, indispensáveis na equipe de Governo Federal, mesmo que o presidente insista em defender o perfil de seus comandados como sendo técnico.

É difícil imaginar o que pode vir de uma gestão de Regina Duarte. De fato, a atriz não tem experiência de gestão. No entanto, essa régua não é inequívoca em sua medida. O mínimo que se espera da atriz é não seguir a cartilha nazista-paranoide de Roberto Alvim, exonerado do cargo a ela ofertado. Mas é preciso ir além. Bem além. Até agora, na área da cultura, a atual gestão do Governo Federal só deu passos tortos ou para trás. O Governo que tirou da cultura o status de ministério só fez barulho com polêmicas desnecessárias, sem nenhum avanço em políticas públicas para a área.

Se o futuro da cultura ficar mesmo nas mãos da outrora namoradinha do Brasil, ela vai precisar fazer o Planalto mudar sua disposição para com o setor. Ajuda se Regina Duarte mostrar credenciais melhores do que as apresentadas até então. Se declarar, como se declarou, cristã, é apelar para aplausos fáceis de uma parte da plateia do espetáculo da política. Afinal, dela ninguém espera ato de devoção ou orações, mas equilíbrio, trabalho eficiente e respeito ao espírito democrático.