Um ano de devastação pandêmica

Após um ano sofrendo os efeitos da devastação pandêmica, a sociedade brasileira vê, de um lado, os pobres e desvalidos à espera de esmolas governamentais custeadas pelo contribuinte; do mesmo lado, vê a força de trabalho confinada e impedida de produzir, à espera dos resultados distributivos gerados pelos setores ainda produtivos; vê de um ângulo quase inalcançável a burocracia estatal acomodada, garantida e recebendo em dia seu salário; e, por todos os lados, o que mais vem afetando a vida dos indivíduos desatendidos em suas demandas mais básicas, são os danos causados, não só pelo vírus, mas pela repressão tirânica imposta pela autoridade em nome de um Estado negligente e voraz, que oprime, reprime e não faz concessões ao contribuinte; um Estado insensível às inconsequências da lacração arbitrária que impõe; que se torna indiferente à calamidade socioeconômica que ajuda a promover e, ainda por cima, põe nos ombros da sociedade o ônus e a culpa pelo aumento do número de casos da doença, revelando-se, apesar das evidências do desastre anunciado no princípio, incapaz de reconhecer a inadministrabilidade da crise coletiva que aprofunda a cada novo decreto autoritário.  

Pelos números crescentes de infectados, de curados e de óbitos nas capitais e municípios governados por gestores que renegam o “tratamento precoce” da doença, constata-se, como provado e arquiprovado estão, que o isolamento social, a restrição ou proibição de mobilidade, o lockdown ou lacração não desafogam o sistema de saúde nem mesmo reduzem os níveis de contágio virótico, como se observa nas compilações estatísticas oficiais. 

No mundo inteiro ocorre o mesmo fenômeno: o indivíduo passa meses a fio confinado em sua caverna, mas, quando faz uma aparição, acaba inevitavelmente se contaminando. Diante dos números crescentes, parece certo dizer que é tão só pela via dolorosa do contágio (seja direto ou pela vacina) que alcançaremos a tão esperada imunidade. 

Ora, leitores, a história das doenças infectocontagiosas revela, desde a baixa idade média da razão, que em todas as epidemias, endemias e pandemias ocorrem surtos, que são os aumentos repentinos e inesperados de casos das doenças. Revela também que os surtos são cíclicos e somente se estabilizam ou declinam após os ciclos de picos de contágio. Ou seja, a queda na curva de contágio geralmente ocorre após os surtos, porque essa redução é diretamente proporcional ao aumento da imunidade coletiva dos indivíduos, imunidade que pode ser conseguida de forma endógena (graças ao sistema defensivo do corpo) ou de forma artificial, através de tratamento precoce ou da vacina, que parece ser a última esperança dos governos. 

Ora, a sociedade não pode perder a esperança no milagre da vacina, afinal, sendo a esperança a última que morre, é também a primeira que se abala. 

Diante da angústia coletiva e atento ao embrutecimento ideológico entre os gestores da crise sanitária e a sociedade científica que prescreve o tratamento profilático ou precoce como parte da solução que agrava o nosso precário sistema de saúde pública, eu diria com a serenidade de um pesquisador veterano e habituado às longas jornadas do pensamento: a teimosia dos gestores que repudiam o tratamento precoce, valida o que disse Martin Heidegger, olhando bem dentro dos olhos estrábicos de Sartre: quem tem grandes devaneios ideológicos só comete grandes erros ou no mínimo deseja estrangular a verdade com o torniquete da sua desonestidade intelectual. 

*Esse texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.