Qual o histórico do PT na escolha de candidatos à Prefeitura de Fortaleza desde 2004

Nas últimas duas décadas, o partido teve diferentes formas de disputa interna, desde candidaturas de consenso até a votação para definir a posição do PT na capital cearense

Quatro nomes do PT estão sendo apontados como pré-candidatos à Prefeitura de Fortaleza: os deputados estaduais Guilherme Sampaio (PT) e Larissa Gaspar (PT), o assessor especial do Governo do Ceará, Artur Bruno (PT), e a deputada federal Luizianne Lins (PT). Destes, apenas Artur Bruno não confirmou ainda a pré-candidatura. 

Aos petistas, ainda pode se juntar o presidente da Assembleia Legislativa do Ceará, Evandro Leitão. Ele está de saída do PDT e analisa em qual sigla deve se filiar. Ele disse ver "com muito bons olhos" tanto o PSB como PT - para este último, recebeu inúmeros convites, inclusive do governador Elmano de Freitas (PT) e do ministro da Educação, Camilo Santana (PT)

Lideranças do Partido dos Trabalhadores no Ceará têm falado no sentido de construir a 'unidade' não apenas partidária como também no arco de alianças que elegeu Elmano em 2022. No entanto, mesmo a candidatura própria ainda não é martelo batido dentro do partido.

O cenário – de vários pré-candidatos e da divergência quanto a ter ou não candidatura própria – não é inédito. Em outras disputas eleitorais em Fortaleza, o PT esteve até mais dividido sobre qual caminho seguir. 

Nas últimas duas décadas, foram cinco eleições municipais em Fortaleza e, em comum, todas estas disputas contaram com uma candidatura própria do PT. Se, em alguns casos, houve consenso, e o nome do candidato foi escolhido 'por aclamação'; em outros, a disputa teve que ser resolvida por votação dentro da legenda e acabou reverberando em uma divisão no PT durante a campanha eleitoral. 

A seguir, o Diário do Nordeste relembra como foram, em Fortaleza, os processos de escolha da candidatura do PT nos últimos 20 anos.

2004

Atual presidente do PT Fortaleza, Guilherme Sampaio explica que o debate eleitoral dentro do partido ocorre em dois momentos diferentes. Antes de definir o nome que irá concorrer ao cargo majoritário, o primeiro momento é focado em definir a "tática eleitoral" do partido naquela eleição. "Ou seja, se o partido terá candidatura própria ou não", explica.

O impasse interno antes das eleições de 2004 ocorreu em torno dessa definição. Naquele ano, parte das lideranças petistas no Ceará e a Direção Nacional do PT, sob o comando do ex-deputado federal José Genoíno (PT), defendiam aliança com o PCdoB em torno da candidatura de Inácio Arruda (PCdoB) à Prefeitura de Fortaleza. 

Contudo, a ala liderada pela então deputada estadual Luizianne Lins pleiteava candidatura própria do PT ao Executivo municipal. 

"A atitude de Luizianne é para sangrar o PT. (...) É uma postura intolerante, sectária, intransigente", disse, na época, Genoíno ao Diário do Nordeste. Em resposta, Luizianne Lins rebateu: "Minha candidatura é legítima. (...) Se for derrotada na convenção, me comprometo a iniciar o debate sobre o vice". 

A disputa interna seria resolvida no encontro de táticas eleitorais. Antes disso, contudo, houve a eleição dos delegados – 247 petistas que escolheriam entre a tese da candidatura própria e a da coligação em torno de Arruda. 

Das quatro chapas que concorriam nessa primeira votação, três defendiam aliança com o PCdoB, enquanto apenas uma tinha como bandeira a candidatura própria. A reportagem do Diário do Nordeste, da época, narra como foi o processo de escolha. 

O empate foi anunciado. As chapas pró-Inácio reuniram 704 votos, e a chapa a favor da candidatura própria do PT também recebeu iguais 704 votos. A Comissão das Eleições iniciou então a contabilização proporcional dos delegados eleitos por cada chapa. Das quatro chapas concorrentes, apenas a Chapa Um não elegeu delegados.
Diário do Nordeste
Edição de 3 de fevereiro de 2004

Com a contagem proporcional, a chapa favorável à candidatura própria acabou elegendo 124 delegados, enquanto, somadas, as outras três chapas elegeram 123. A escolha dos delegados ocorreu no dia 1º de fevereiro de 2004. 

Duas semanas depois, no dia 15 de fevereiro, a tese da candidatura própria receberia 125 dos 247 votos de delegados disponíveis – um a mais do que o previsto inicialmente, já que esta tese havia eleito 124 delegados. 

O clima de acirramento interno chegou a elevar os ânimos durante a votação, conforme narra o Diário do Nordeste do dia 16 de fevereiro. "Os militantes petistas proclamaram palavras de ordem, em defesa de sua tese. Entretanto, alguns militantes das duas chapas se exaltaram em certo momento, passando a trocar insultos", descreve o texto. 

Confirmada a candidatura própria, Luizianne Lins foi a única a se inscrever para disputar a Prefeitura de Fortaleza pelo PT e, no final de maio, foi confirmada como candidata ao Paço Municipal. Outros nomes chegaram a ser cotados, como José Airton Cirilo (PT) e Artur Bruno (PT) – ambos defensores, na época, de aliança com Inácio Arruda –, mas eles decidiram não participar da disputa interna.

As divergências dentro do PT, no entanto, continuaram reverberando na campanha eleitoral. Lideranças que haviam defendido a aliança com Inácio Arruda encabeçaram o movimento "Sou PT, voto Inácio", e o então ministro da Casa Civil do primeiro Governo Lula, José Dirceu, chegou a participar de atos em favor do adversário de Luizianne. 

Faltando pouco mais de duas semanas para o 1° turno, o presidente do PT, José Genoino, chegou a cobrar a saída de Luizianne da disputa. "A Luizianne assumiu um compromisso conosco: se até o dia 10 de setembro, ela não tivesse 15% nas pesquisas ou se sua candidatura ameaçasse a presença da esquerda no segundo turno, ela retiraria a candidatura", disse no dia 13 de setembro. Na época, ela negou ter feito o acordo. 

Luizianne acabou ultrapassando Arruda e indo ao 2º turno com o então deputado federal Moroni Torgan, saindo vitoriosa da disputa eleitoral com 56,2% dos votos. 

2008

Com Luizianne Lins no comando da Prefeitura de Fortaleza, era "natural a sua candidatura à reeleição", relembra o atual presidente do PT Fortaleza, deputado estadual Guilherme Sampaio. "Então, não houve disputa interna nenhuma". 

A disputa de 2008 ocorreu apenas dois anos depois da eleição de Cid Gomes para o primeiro mandato como governador do Ceará, vitória que inaugurou a parceria entre PT e o grupo liderado pelos irmãos Ferreira Gomes a nível estadual. 

Apoiado por Luizianne em 2006, Cid apoiou a então prefeita na disputa pelo segundo mandato. Isso acabou o colocando, pela primeira vez, no campo oposto ao do irmão, o então deputado federal Ciro Gomes, que apoiou a então senadora Patrícia Saboya. 

Na época, o impasse acabou sendo em torno da definição de quem seria o vice na chapa de Luizianne. O petista Raimundo Ângelo (PT) chegou a ser inscrito na Justiça Eleitoral, mas acabou sendo substituído por Tin Gomes (PDT), indicação de Cid para o cargo. 

Luizianne Lins venceu a eleição ainda no primeiro turno, com 50,16% dos votos na capital cearense.

2012

Em 2012, mais uma vez, a definição da candidatura dentro do PT ocorreu sem a realização de prévias, mas após disputa interna decidida em votação por delegados no encontro de tática eleitoral da sigla para a eleição daquele ano. Desta vez, o impasse girava em torno das propostas de Luizianne Lins e de Cid Gomes.

Aliados desde a campanha eleitoral de 2006, os dois divergiam quanto a quem seria o candidato à sucessão de Luizianne à frente da Prefeitura de Fortaleza. Segundo relatado pelo Diário do Nordeste em 2012, o PT chegou a ter "13 prefeturáveis". Porém, mais próximo da escolha, quatro nomes estavam colocados dentro do partido para a disputa pelo Paço Municipal:

  • Elmano de Freitas, então secretário de Educação da Prefeitura de Fortaleza;
  • Artur Bruno, na época, deputado federal;
  • Camilo Santana, então secretário das Cidades no Governo Cid Gomes;
  • Guilherme Sampaio, vereador de Fortaleza. 

Agora ministro da Educação, Camilo Santana começou a ser ventilado como possível sucessor de Luizianne na Prefeitura de Fortaleza ainda em 2011 e elogiado pelo próprio Cid Gomes. O então governador disse que Camilo era "um extraordinário nome" para a sucessão na capital cearense. O nome dele também era o favorito de lideranças petistas, como relata reportagem do Diário do Nordeste no início de fevereiro. 

"O deputado José Guimarães é defensor de um consenso do partido, mas também tem um nome para ser candidato, Camilo Santana. (...) Guimarães é uma das lideranças em condições de disputar, internamente, com Luizianne", descreve o texto. A então prefeita de Fortaleza, por sua vez, também tinha uma preferência, relata a reportagem. 

O nome preferido pela ala que apoia a prefeita, assim como a própria gestora, é o de Elmano de Freitas, e para isso, a tentativa do bloco nas próximas semanas é tornar o secretário conhecido na cidade. 
Diário do Nordeste
Edição de 31 de janeiro de 2012

A definição do nome do PT ocorreu por meio de votação de delegados, ocorrida no dia 3 de junho de 2012 com a presença do então presidente nacional do PT, Rui Falcão. Na data do encontro, Guilherme Sampaio e Camilo Santana anunciaram a desistência da pré-candidatura. 

Tanto Camilo como José Guimarães defendiam maior tempo de diálogo com aliados. No período, tanto PSB (comandado por Cid Gomes) como o MDB (ainda PMDB, na época) ameaçavam deixar a aliança. "Eu defendi que se adiasse o encontro para uma maior reflexão. Agora cabe ao partido dialogar isso", disse Camilo ao Diário do Nordeste, naquela data. 

Luizianne Lins, por sua vez, afirmou que o PT estava fazendo "política para mostrar aos aliados, em especial ao PMDB e PSB, que queremos a continuidade da aliança". "Mas vamos ter vergonha na cara de não ficar esperando por a, b ou c", acrescentou. Pré-candidato preferido dela, Elmano de Freitas acabou saindo vencedor da disputa interna. 

Artur Bruno garantiu que ia para a disputa e foi, mas para confirmar o que muitos esperavam, saiu derrotado, pois contava apenas com o apoio de 23 delegados de um total de 300 com direito a voto. Como a votação foi por aclamação, não houve tempo, sequer, para a contagem dos votos de cada um dos dois.
Diário do Nordeste
Edição de 4 de junho de 2012

Com a confirmação do nome de Elmano de Freitas como candidato do PT, o PSB de Cid Gomes resolveu não prosseguir na aliança com a legenda petista. No dia 22 de junho, o então presidente da Assembleia Legislativa do Ceará, Roberto Cláudio foi escolhido para ser o candidato a prefeito de Fortaleza. 

Também disputava internamente o então vereador de Fortaleza, Salmito Filho, e o ex-secretário especial da Copa do Mundo do Governo Cid Gomes, Ferrúcio Feitosa. 

Elmano de Freitas e Roberto Cláudio acabaram se enfrentando no 2º turno das eleições daquele ano, em uma disputa acirrada. Roberto Cláudio venceu a eleição com 53,02% dos votos válidos.

2016

Ainda no primeiro ano como governador do Ceará, Camilo Santana iniciou articulações dentro do PT para que a legenda apoiasse o então prefeito Roberto Cláudio. Naquele ano, tanto ele como o grupo político liderado pelos irmãos Ferreira Gomes já tinham migrado para o PDT. 

Apesar disso, já no início de 2016, as principais lideranças do PT Ceará defendiam a tese de candidatura própria do partido na capital cearense. Ainda em janeiro daquele ano, encontro dos dirigentes nacionais, estaduais e municipais do partido bateu o martelo sobre lançar um candidato. 

Lideranças do PT Ceará se reuniram com o presidente Rui Falcão, em Brasília, para discutir candidatura própria na eleição de Fortaleza. Estavam presentes deputados federais Luizianne Lins e José Guimarães, além dos presidentes da executiva estadual, De Assis Diniz, e municipal do PT, Elmano de Freitas. No encontro, ficou decidido que o partido terá candidato e deve apenas encontrar um nome de consenso para isso. 
Diário do Nordeste
Edição de 27 de janeiro de 2016

Menos de uma semana depois do encontro entre os dirigentes partidários, no dia 30 de janeiro, a conferência eleitoral confirmou a tese de candidatura própria em Fortaleza. O nome foi definido apenas no final de maio de 2016: Luizianne Lins foi escolhida por "aclamação", conforme lembra Guilherme Sampaio. 

O nome dela foi o único apresentado antes da conferência, que ocorreu no dia 28 de maio daquele ano. Segundo reportagem do Diário do Nordeste, "o grupo próximo a Camilo que tentou a mudança de data do encontro", mas sem sucesso. 

No mesmo período, tanto Luizianne como outras lideranças petistas disseram que Camilo estaria "à vontade" para apoiar tanto a ex-prefeita como outra candidatura. "Vamos tratar isso com naturalidade. Em 2014, nós não obrigamos a Luizianne (Lins) a fazer campanha para o Camilo, e ela não fez. Por que agora vamos obrigar o Camilo a fazer campanha para a Luizianne?", disse o então presidente do PT Ceará, De Assis Diniz, ao Diário do Nordeste, no início de julho de 2016. 

Logo após a convenção que confirmou a candidatura a reeleição de Roberto Cláudio, no início de agosto, Camilo Santana declarou publicamente o apoio ao então prefeito. Ele chegou, inclusive, a justificar o fato de não ter estado presente no evento. 

A minha ausência foi muito mais por uma questão legal e jurídica. Não quero em nenhum momento prejudicar a campanha de Roberto Cláudio, até porque meu partido tem outro candidato e poderia questionar. Mas o meu apoio, meu partido já sabe disso, é ao prefeito por considerar que é o melhor para Fortaleza.
Diário do Nordeste
Edição de 6 e 7 de agosto de 2016

Em chapa pura, encabeçada por Luizianne Lins e com Elmano de Freitas como candidato a vice-prefeito, o PT ficou em terceiro lugar na disputa pela Prefeitura de Fortaleza. O 2º turno foi disputado por Roberto Cláudio e Capitão Wagner, com o então prefeito alcançando a reeleição com 53,5% dos votos válidos.

2020

Nas últimas eleições municipais de Fortaleza, realizadas em 2020, o então governador Camilo Santana tentou, mais uma vez, unir PT e PDT na capital cearense. Com a data das eleições adiadas devido a pandemia de Covid-19, o tempo para a articulação em torno das candidaturas também foi estendido. 

Sem disputa interna no partido, a ex-prefeita Luizianne Lins foi escolhida como candidata em julho daquele ano. O vereador de Fortaleza, Guilherme Sampaio, chegou a disponibilizar o nome, mas acabou retirando a pré-candidatura em prol da deputada federal. 

Segundo ele, influenciou o posicionamento da bancada federal cearense do PT e da própria presidencial nacional do partido, Gleisi Hoffmann. "Houve um entendimento da bancada federal do Partido dos Trabalhadores, juntamente com a presidenta Gleisi, que naquele momento a candidatura da ex-prefeita seria mais forte para disputar as eleições", relembra ele, que já estava na presidência do PT Fortaleza em 2020.

No mesmo dia em que foi confirmada a pré-candidatura de Luizianne Lins, Camilo Santana concedeu entrevista ao Diário do Nordeste, na qual defendia a aliança entre PT e PDT na capital

A gente precisa construir e consolidar um projeto para Fortaleza, meu comportamento é que eu irei até o último momento se for possível. Claro que não está apenas sob a minha decisão... Mas a ideia é que haja uma aliança aqui em Fortaleza dos dois partidos que dão sustentação, é isso que eu vou procurar construir. (...) Esses partidos precisam se aproximar, principalmente pra defender um projeto que está em curso no Ceará, em Fortaleza, que tem tido avanço. Precisa de melhorias? Precisa. Mas acho que a gente precisa consolidar, essa que é a minha posição e vou defender isso e tentar construir até o limite.
Diário do Nordeste
Edição de 5 de julho de 2020

As articulações seguiram até setembro, quando foram realizadas as convenções partidárias para confirmar as candidaturas de cada legenda. Contudo, nem PT nem PDT queria abrir mão de encabeçar a chapa a Prefeitura de Fortaleza, na época. O clima tenso entre as duas agremiações a nível nacional também interferiu nas negociações locais. 

Luizianne acabou sendo candidata petista, novamente em chapa pura. O agora secretário estadual do Trabalho, Vladyson Viana foi o candidato a vice. Do lado do PDT, o então presidente da Assembleia Legislativa do Ceará, José Sarto foi apresentado para a sucessão de Roberto Cláudio no Paço Municipal. 

Novamente, o PT ficou na terceira colocação. Ao contrário de 2016, a legenda petista apoiou o candidato do PDT no 2º turno - novamente, Capitão Wagner esteve na segunda fase da disputa municipal. Sarto foi eleito com 51,9% dos votos válidos.

* Com a colaboração de Alessandra Castro