Tia Neném ensina técnicas manuais no presídio feminino há mais de duas décadas
Aos 78 anos, a "professora" voluntária repassa seus conhecimentos em crochê, macramê e costura
De tanto a chamarem "Tia Neném", ela sequer recorda o próprio nome. "É Maria Eunice... Deixa eu ver se eu me lembro. Maria Eunice Bezerra Barbosa", completa depois de fazer um certo esforço com a memória de 78 anos. A fita métrica enrolada no pescoço há pelo menos duas décadas, tempo que vem se dedicando voluntariamente nos presídios cearenses, é a principal referência do trabalho que executa hoje junto às detentas do Instituto Penal Feminino Auri Moura Costa.
"Aqui tem o crochê, tem o macramê, tudo é manual, não tem nada de máquina", relata sobre as técnicas de costura que ensina às 14 mulheres, algumas jovens, outras nem tanto. "Tudo elas gostam. E as que não gostam têm toda liberdade de dizer, a gente parte pra outra", afirma, com a convicção de que cada vaga da oficina que coordena é única.
Por ela já passaram quase todas que hoje atuam como funcionárias da Colmeia no presídio. "Eu chamo elas de minhas ex", brinca, enquanto analisa o que as atuais estão fazendo. Para Tia Neném, o trabalho que desenvolve é semelhante a plantar sementes. "Aqui é uma agricultura. Elas aprendem o pouco que eu sei, saem capacitadas de fazerem lá fora. Sai até com a carteirinha da Ceart. Podem chegar lá fora e ir fazer. Pra mim é a principal satisfação", argumenta.
Logo que começou, voluntária do manicômio judicial a convite do irmão diretor, ajudava os "meninos ociosos" a ocupar a mente. Rasgar papel já era uma terapia. Com o tempo, foi convidada a atuar em outros setores, e ali se encontrou. "Aliás, não me imagino fazendo outra coisa, aqui já chega. Gosto muito daqui. Podia chegar e dizer que ia me pagar tanto pra eu fazer esse mesmo trabalho em outro canto. Mas eu tô muito satisfeita com o que eu ganho, queria não, não quero", declara.
A relação que tem com as meninas é parecida com a que mãe tem com filha. "Os dedos da mão não são iguais? Somos todos iguais", compara. O amor é tão grande que, mesmo com o marido internado, não deixa a atividade de lado. "Passo à noite no hospital e, de manhã, minhas filhas ficam com ele", conta, sem abdicar da rotina que a faz sair às 6h da manhã e retornar para o lar às 19h da noite, todos os dias. O desejo de ver as sementes brotarem é maior que tudo.