A quatro meses para a abertura da janela partidária, vereadores de cidades cearenses já começam avaliar uma possível mudança de partido para concorrer às eleições municipais do ano que vem. O troca-troca de sigla já é uma praxe eleitoral, mas pode ser intensificado mediante crise em agremiações, conforme avaliam especialistas ouvidos pela reportagem.
Como em 2024 a eleição proporcional é de vereadores, apenas eles podem migrar de legenda sem perder o mandato durante a janela partidária, que abre a partir do dia 6 de março de 2024 — seis meses antes do primeiro turno — e dura pelo período de 30 dias. Deputados que desejarem disputar prefeituras só poderão trocar de sigla se forem liberados por suas agremiações.
Fora do período da janela partidária, há situações que permitem a saída do parlamentar de sua legenda por justa causa, seja ele vereador ou deputado. Desvio do programa partidário e grave discriminação pessoal podem justificar a desfiliação. No entanto, se saírem sem se enquadrar nesses critérios, correm o risco de ficar sem o assento atual no Legislativo.
Barganhas
Professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Monalisa Torres destaca que os vereadores vão escolher a legenda para a disputa de acordo com o poder de barganha do partido. A negociação deve levar em consideração os recursos que podem ser oferecidos pelas siglas, como tempo de TV e verba para financiamento de campanha. Outro fator que deve ser preponderante é o peso das lideranças na campanha, já que os candidatos querem estar alinhados a figuras que possam agregar competitividade eleitoral.
"O troca-troca de partidos não é uma coisa incomum na política. Quando a gente considera as eleições municipais, isso se torna mais evidente, porque leva em conta essa perspectiva mais pragmática dos candidatos em procurarem partidos que lhe ofereçam melhores recursos: tempo de TV, recurso eleitoral. E se a gente considerar, também, que os próprios partidos a nível local têm pouca identidade ideológica, os candidatos se filiam muito mais por afinidade com lideranças do que propriamente com a identidade partidária"
Para o doutor em Sociologia e professor do curso de Direito da Universidade de Fortaleza (Unifor), Clésio Arruda, o poder econômico deve ser o fator principal para os vereadores tomarem a decisão, principalmente no Interior, já que, tradicionalmente, há uma pulverização maior partidária devido às disputas entre grupos familiares tradicionais. Esses grupos, segundo ele, devem se alternar na disputa pelos vereadores.
"Os vereadores são lideranças política locais que, normalmente, não têm popularidade suficiente para se lançar sozinhos às Câmaras Municipais, mas são pessoas que conseguem regimentar alguns votos, inclusive para os prefeitos. Tudo isso envolve uma estrutura que passa por capacidade financeira. E aí vai da capacidade financeira dos grupos, das lideranças partidárias", frisa.
Para as eleições municipais do ano que vem, os partidos que devem ter maior verba do Fundo Eleitoral devem ser o PL, a federação PT/PCdoB/PV, União Brasil, PP, PSD e MDB, por terem eleitos as maiores quantidades de representantes ao Congresso Nacional em 2022.
A influência do cabeça de chapa
Os especialistas acrescentam, ainda, que a influência do candidato que irá encabeçar a chapa deve ser fundamental, tanto pelo poder competitivo de atrair votos como de mobilizar recursos, para a escolha dos partidos pelos vereadores.
"A gente tem dois grupos (de candidatos a prefeitos): aqueles que têm uma visibilidade no município pelos serviços prestados ou tradição da família e aqueles que conseguem mobilizar recursos e reunir um batalhão de apoiadores nos distritos, bairros, nos locais mais afastados da sede dos municípios, e conseguem arregimentar alguns votos"
Monalisa Torres ressalta que esse poder de mobilização também pode estar a associado a quem está com lideranças importantes, de Governo ou de oposição. Por isso, a migração de figuras importantes de legenda pode acarretar debandada de filiados, seja no Interior ou na Capital.
Fortaleza
A professora de Teoria Política pondera que ainda é muito cedo para avaliar o troca-troca de partidos, principalmente em Fortaleza, já que o PDT, que vivencia uma crise interna após racha com o PT, tem a máquina pública da quarta maior Capital do País nas mãos.
Atualmente, o PDT está dividido em dois grupos: um mais alinhado ao senador Cid Gomes — que pautou a concessão de carta de anuência para o presidente da Assembleia Legislativa do Ceará, deputado Evandro Leitão, sair do partido para se filiar a outro e concorrer a eleição pela Prefeitura de Fortaleza no ano que vem — e outro mais próximo do ex-ministro Ciro Gomes e do deputado federal André Figueiredo — que defendem a reeleição do prefeito José Sarto e oposição ao Governo do Estado.
"Fortaleza é um caso bem particular, porque, embora o Sarto esteja muito desgastado, ele tem peso na Câmara Municipal. Ele tem vereadores importantes que o apoiam, mas é importante a gente acompanhar esses desdobramentos, principalmente dos nomes que sairão candidatos. Mas acredito que o PT, até para ter competitividade para eleger prefeito, vai procurar atrair esses nomes importantes, competitivos, para candidatura para vereador, porque são nomes que fazem a base", destaca Monalisa Torres.
Evandro, inclusive, foi ventilado para se filiar ao PT e ao PSB de olho nas eleições de 2024. A desfiliação dele da legenda, no entanto, está na Justiça.
Em paralelo, Cid e seu grupo estudam deixar o PDT devido a disputa pela presidência da agremiação no Ceará. Os cientistas destacam, ainda, a boa fase vivenciada pelo PT para atrair novos quadros. O partido está no comando Governo Federal, Estadual e tem lideranças e aliados importantes em outras agremiações, como é o caso do PSB atualmente. A legenda no Ceará é presidida por Eudoro Santana, pai do ministro da Educação, Camilo Santana (PT).
No PT, outros nomes também são colocados como pretensos candidatos à disputa a deputada federal Luizianne Lins, ex-prefeita da Capital; o presidente da legenda em Fortaleza, Guilherme Sampaio; e a deputada estadual Larissa Gaspar.
Oposição
Em paralelo ao racha entre PT e PDT, partidos de oposição, como PL e União Brasil devem buscar aumentar o número de vereadores e atrair novos candidatos. Para Monalisa Torres, a eleição de conselheiro tutelar deste ano deve servir de "vitrine" para buscar novos nomes para fazer candidatos.
"Na oposição, principalmente os partidos de direita, tem um componente importante que são lideranças muito vinculadas a segmentos religiosos, que já é um eleitorado cativo. Então, pensando como foi acirrado as próprias eleições para conselheiros tutelares como uma espécie de vitrine para esses partidos de direita, que tem essas lideranças vinculadas a segmentos religiosos, deve ser uma disputa acirrada", destaca.
Na Capital, Clésio destaca que o bolsonarismo teve uma força expressiva nas últimas eleições em Fortaleza, concentrando a maior parte do eleitorado de Bolsonaro no Ceará na eleição de 2022.
Ele ressalta que a figura apoiada pelo ex-presidente na eleição pelo Governo do Estado em 2022 foi o deputado Capitão Wagner (União), que já é um candidato de oposição com bom desempenho na disputa pela Prefeitura de Fortaleza, mas que no próximo pleito há dois cotados dentro do PL: o deputado federal André Fernandes e o estadual Carmelo Neto. Além deles, a vereadora Priscila Costa (PL) também ventilada.
Com isso, ele acredita que a oposição deve polarizar a disputa por vereadores no Interior e, na Capital, focar em aumentar a bancada.