A amamentação foi a coisa mais difícil e incrível que já fiz

Quando superei a culpa por não me sentir boa mãe, consegui alimentar meu filho e doar leite para salvar vidas

Na sala de recuperação de um hospital, uma enfermeira acomodou meu filho recém-nascido próximo ao meu peito, e ele apenas começou a sugar, minutos após seu nascimento. No início, até pareceu mesmo que amamentar fosse instintivo. O bebê dormia a maior parte do tempo e, a cada mamada, uma consultora de amamentação do hospital vinha avaliar se a pega estava correta. Parecia estar.

Mas algumas mamadas depois - já em casa - comecei a sentir dor e a perceber fissuras na mama. A amamentação pode ser muito difícil para algumas mulheres. Eu estava no auge da minha insegurança puerperal. Não conseguia dormir e tinha crises de ansiedade entre as mamadas. Repassava as técnicas que havia estudado e não identificava o que estava errado na “pega”, mas algo parecia não estar correto.

É comum que os bebês percam peso nos primeiros dias de vida, mas meu filho chegou no limite desta perda rápido demais, o que acendeu um alerta na pediatra que consultamos e um terrível medo em mim. Esta é uma das principais causas de desmame precoce, quando a amamentação exclusiva é encerrada antes dos seis meses preconizados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, se amamenta em média três meses de forma exclusiva. 

Naquela consulta, eu já estava aos cacos. Sentia culpa por não ser uma boa mãe, por não sentir prazer amamentando. Cadê aquela tal conexão mágica com o filho? Nada. Sorte que tive tantas mães me apoiando. “Uma semana de dor e depois tudo vai melhorar. Prometo que vai passar”, me dizia uma amiga. 

Valia a pena continuar. Não tem alimento melhor para um bebê que o leite materno para nutrir e proteger de doenças tanto na infância quanto na vida adulta.

Eu não concebia a possibilidade de não dar o melhor para o meu filho, até que minha irmã (que também é mãe) me resgatou daquele ponto de inflexão no qual eu me via: “Você sabe que existe fórmula e que está tudo bem se não conseguir chegar aos seis meses de amamentação exclusiva, né? Você está tentando e o mais importante agora é que você esteja bem para cuidar dele”.

Vislumbrar um outro caminho possível foi libertador, independentemente se eu fosse ou não seguir por ele. Decidi então fazer um pacto matinal com meu filho: “Vou te amamentar só mais hoje. Amanhã a gente vê como vai ser”. Isso não parou a dor e o medo dele não ganhar o peso que precisava, mas tornou o processo mais fácil.

Compartilhei a dificuldade de amamentar com uma prima que havia tido bebê um mês antes, e ela indicou uma consultora. “Mas corre! Não deixa ferir muito porque depois é preciso muito mais força para continuar”, me encorajou. Segui o conselho.

Quando Daiany chegou para nos avaliar, repassou uma série de técnicas e tive a certeza de que amamentar não é instintivo. Precisamos ajudar nossos filhos a aprender a mamar. Garantir que abocanhem toda a aréola (e não só o mamilo) e façam aquela boca de peixinho, com o queixo colado na mama. Que eles não engulam tanto ar enquanto sugam o leite.

Daiany me ensinou algumas posições, orientou postura e mostrou como levar o bebê ao peito. Mas o meu corpo ainda estava aprendendo a produzir a quantidade de leite adequada, e isso inchava as mamas. Então vamos lá organizar a rotina do aleitamento. Faz massagem para evitar mastite. Ordenha um pouco antes de oferecer para o bebê conseguir mamar. Observa se ele está mamando nutritivamente.

As coisas iam melhorando, mas o medo da balança ainda rondava. Uma semana depois, voltamos à pediatra. O bebê havia ganhado peso, mas não o suficiente. Será que meu leite é fraco? Será que não dou conta? “Ele está bem. As pessoas vão falar que é magrinho, mas ele está ganhando peso, não precisa ainda da fórmula. Isso precisa vir de um pacto de confiança nosso”, me disse a médica.

Seguimos no aleitamento exclusivo. A dor foi diminuindo com muito banho de sol na varanda. Na hora de amamentar, passei a contar 20 segundos de dor e… ufa! Já melhorou. Tudo perfeitamente suportável até que um dia não doeu mais. Um mês depois, parecia mágica: meu filho estava engordando um quilo por mês!

Aos poucos, fui abrindo mão das várias almofadas que usava para colocá-lo na posição mais efetiva pra gente. Aprendi a amamentar na rede, na cama, no banco do parque. De todos os jeitos. Consegui curtir muito o momento, mas só depois que o seio calejou e a dor passou. 

Turbinei a dieta com cuscuz e suco de uva integral para melhorar a produção de leite e, quando vi, estava coletando para doar. Cada gotinha levada ao banco de leite, que ajuda outros bebês, me dá um sentimento de vitória. Sem romantização.

Aqui estamos no 117º dia de amamentação exclusiva com uma nova crise, que envolve mamadas mais curtas e o corpo novamente se reajustando às necessidades do bebê. 

Neste estágio, estou certa: amamentar não é sinônimo de amar. Dizer que é um ato de amor é endossar a culpa das mães que, por algum motivo, não conseguem seguir em aleitamento exclusivo. É alimentar o medo do fracasso das que encontram dificuldades na jornada. Existem muitas formas de amar e criar vínculos.

Amamentar é, sim, dar o melhor alimento possível para os nossos filhos. Vale a pena. O ato deve mesmo ser estimulado nesta Semana Mundial do Aleitamento Materno. Falar sobre as dificuldades do processo é uma forma de encorajar e acolher as mães. De ajudar o Brasil a avançar na meta e garantir que metade dos bebês sigam em aleitamento exclusivo até os seis meses de idade nos próximos dois anos. Que continuem mamando enquanto for bom para eles e suas mães.