Papa Francisco cita trecho de samba de terreiro feito por Vinicius de Moraes
A música de matriz afro-religiosa fala sobre a importância de se aprender a viver na diversidade racial e cultural
O papa Francisco fez uma referência ao Samba da Bênção durante um discurso neste domingo (4), no Vaticano. "A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro na vida", repetiu a frase feita por Vinicius de Moraes para o samba de Baden Powell, lançado no álbum do poeta de 1967, durante a leitura de uma forte encíclica batizada 'Todos Irmãos'.
Durante o pronunciamente, o pontífice defendeu o direito às migrações, cobrou uma reforma da Organização das Nações Unidas e do sistema financeiro mundial. E para isto, levou para os metros quadrados mais reverenciados da Igreja Católica os versos de uma canção de matriz afro-religiosa
A música fala sobre a importância de se aprender a viver na diversidade racial e cultural, dentro do poder de expansão territorial de um samba de terreiro. Ao ser citada no Vaticano por um papa, a figura mais importante no catolicismo depois do próprio Jesus Cristo, Samba da Bênção sai das giras para entrar na missa 53 anos depois de sua criação.
Francisco se ateve ao verso mais, digamos, universal. Não é preciso nem ter religião para entender o que Vinicius quis dizer com sua frase sobre encontros e desencontros. A preocupação estaria em seguidores mais conservadores descobrirem que Samba da Bênção tem os dois pés no Candomblé.
Na composição, ainda é possível encontrar os trechos "A bênção, meu bom Cyro Monteiro você, sobrinho de Nonô / A bênção, Noel, sua bênção, Ary / A bênção, todos os grandes sambistas do Brasil / Branco, preto, mulato / Lindo como a pele macia de Oxum".
Oxum, a orixá das cachoeiras, a entidade que reina sobre as águas doces, é considerada a senhora da beleza, da fertilidade, do dinheiro, da sensibilidade e do poder feminino. Mamãe Oxum. Vinicius, que se intitulava "o branco mais preto do Brasil" e Baden, convertido no final da vida a uma igreja evangélica, estavam com todos os santos das religiões de matrizes africanas à flor da pele.
Um ano antes de criarem os versos citado pelo papa, haviam lançado o antológico álbum Os Afro-Sambas, com Canto de Ossanha, Canto de Xangô, Bocoché, Canto de Iemanjá, Tempo de Amor, Canto do Caboclo Pedra-Preta, Tristeza e Solidão e Lamento de Exu, uma figura que muitos sacerdotes juram ainda ser, equivocadamente ou estrategicamente, o próprio diabo.