Nenhuma das três principais companhias aéreas brasileiras opera voos de aeroportos do Nordeste para a Europa.
Gol, Latam e Azul voam apenas para cidades norte-americanas. Gol e Latam fazem voos para Miami a partir de Fortaleza, e Azul opera frequências para Fort Lauderdale e Orlando a partir de Recife.
Inclusive, os voos da Azul para os Estados Unidos a partir do Aeroporto do Recife serão interrompidos entre março e maio, com previsão de retorno apenas em junho.
Voos para Europa são sucesso
Os voos da Azul para a Flórida tiveram mais de 90% de ocupação em janeiro passado, saindo de Recife. De Fortaleza, a média foi de 91% com a Latam e de 95% com a Gol.
Inclusive entendemos agora por que a laranja quer aumentar frequências em julho próximo.
Certamente, os voos seriam exitosos para a Europa também.
Assim, as companhias estrangeiras que operam do Nordeste para a Europa, em geral, cobram tickets altos para que os passageiros voem direto. Assim, por que as nacionais não buscam se valer também desse bônus?
A portuguesa TAP, adicionalmente, aumentou de forma permanente a oferta de assentos em todas as bases do Nordeste, bem como a Air Europa (a partir de jun/24) em Salvador e a Air France em Fortaleza, respectivamente. O patamar de quantidade de operações das três companhias é inédito na região.
O resultado são os altíssimos índices de ocupação das 3 companhias em várias bases em janeiro de 2024:
Aeroporto | Companhia | Passageiros | Ocupação |
Fortaleza | Air France | 7.676 | 93% |
TAP | 17.289 | 80% | |
Recife | TAP | 18.307 | 88% |
Salvador | Air Europa | 7.500 | 97% |
TAP | 15.246 | 86% |
Enquanto isso, as nacionais apenas olham para São Paulo. Por exemplo, a Latam aumentará frequências entre Guarulhos e Madri, segundo imprensa nacional especializada.
Nem o Galeão no Rio de Janeiro escapa de ser engolido por Guarulhos. A Latam descontinuará voos da capital fluminense para Buenos Aires.
O que se tem hoje?
Sabemos que as três companhias voam direta ou indiretamente de São Paulo para a Europa.
Diretamente, a Latam, que tem o maior market local para a Europa, voa para vários países como Inglaterra, França, Portugal, Espanha. A Azul voa de seu maior hub, Campinas, para Portugal e França.
Indiretamente, a Gol, que não possui aeronaves que consigam voar de SP, nem de Brasília para a Europa, possui fortíssima parceria com Air France-KLM para alimentar domesticamente os voos das parceiras para o velho continente.
A Gol chega a colocar 30% de passageiros de todo o Brasil em voos da Air France e KLM em Guarulhos, logo, não é exagero falar que a laranja voa indiretamente para a Europa
Flórida tem mais potencial que Lisboa?
Informações de companhias aéreas ratificam que o brasileiro adora voar para o estado americano da Flórida, justamente onde ficam Miami, Orlando e Fort Lauderdale. Porém, por que não voar para Lisboa, destino também adorado pelos brasileiros?
Por exemplo, de Guarulhos e Campinas (várias empresas aéreas) houve uma quantidade de assentos da mesma ordem de grandeza para Lisboa e para a Flórida (Fort Lauderdale, Miami e Orlando) em 2023.
Há uma certa simetria entre interessados em ir para a Flórida, porta de entrada de brasileiros para os EUA e interessados em ir para Lisboa, porta de entrada de brasileiros para a Europa. De 100 pessoas, 43 querem ir para Lisboa; 57 para a Flórida. É uma disputa equilibrada.
Assim, não há uma primazia clara entre Flórida a Lisboa.
Origem | Destino | Assentos (2023) |
Fortaleza | Lisboa | 101.848 |
Recife | Lisboa | 106.723 |
Salvador | Lisboa | 91.702 |
Natal | Lisboa | 53.213 |
Total | 353.486 |
No caso do Nordeste, há ainda mais assentos para Lisboa que para a Flórida. No sentido NE -> Lisboa, foram 353.486 assentos (TAP) em 2023, 60% dos assentos de Campinas + Guarulhos, um baita potencial não-trabalhado por Latam, Gol e Azul.
Caso estas oferecem tráfegos do Nordeste direto para Lisboa, por exemplo, certamente, a demanda de voos em SP diminuiria, sem falar, que, para quem é daqui, seria um baita produto, apenas 7 horas de viagem.
Concorrência
Latam e Azul, que voam do estado de São Paulo para Lisboa e para a Flórida, precisam enfrentar concorrências relevantes nessas rotas de empresas como TAP, American Airlines e Delta.
Por que então as brasileiras não encaram essa mesma concorrência da TAP no Nordeste, que enche bastante seus aviões na região, cobrando o preço que deseja?
A TAP buscando crescer e/ou buscando proteger um terreno que é só seu (voar diariamente para os grandes mercados do Nordeste), colocou, como dissemos, frequências adicionais em vários dias da semana em Fortaleza e Recife.
Apesar do incremento, os preços não esmaeceram. Por exemplo, um trecho entre Fortaleza e Lisboa, num domingo, 3 de abril, apenas ida, está custando mais de R$ 3.100 com a TAP, enquanto o trecho no mesmo dia entre Guarulhos e Lisboa, mais barato, custa R$ 2.900. Fortaleza, tem trecho mais caro, ainda com 9 frequências semanais.
O Nordeste precisa ser a ponte de embarque do Brasil para a Europa, porém, não tem o aval das companhias brasileiras.
O que diz a Gol?
Nessa ótica indireta, a Gol tem a menor incongruência com o Nordeste, dado que adota a mesma estratégia de SP em Fortaleza, pois ainda (mal) alimenta os voos da Air France e em Salvador, dado que possui parceria também com a Air Europa para Madri.
Quando perguntamos, porém, à companhia o motivo de não voar diretamente para a Europa, respondeu-nos que a “Gol não voa para Europa”.
Poderia voar para Lisboa caso desejasse, dado que a mesma distância de voo entre Fortaleza e Miami, há entre Fortaleza e Lisboa com os Boeing 737-Max. Já escrevemos inclusive sobre 10 ótimos motivos para a Gol lançar voos entre o Ceará e Portugal.
Dificuldades para o lançamento seriam, a Gol de fato não voa para a Europa e, daí, os custos de se ter uma estrutura em Lisboa seriam rateados apenas com voos que partindo de Fortaleza ou de Recife, por exemplo.
Outro ponto que penso seria não abrir concorrência direta com sua parceira Air France-KLM no Nordeste. Porém, o faz para os EUA, dado que voa de Brasília para a Flórida, onde sua parceira American Airlines possui hub.
Num contexto de recuperação judicial, difícil pensar num mercado europeu para a Gol agora.
Azul abriria concorrência com TAP
A Azul possui um enorme hub em Recife. Chega a ser o 2º hub da companhia, à frente de Belo Horizonte-Confins. Por que, então, não iniciar tráfegos para a Europa? A conectividade de Recife com todo o Brasil, penso, garantiriam um belo produto para Lisboa, como faz em Campinas.
Recife merecia esse tráfego para Portugal. Não faria por que não gostaria de abrir fogo contra a parceira TAP? A TAP, porém, estará, como fez em 2019, voando até duas vezes por dia de Recife à Lisboa.
Ao fim de 2023, inclusive, falou-se que o Governo de Pernambuco buscava um voo da Azul para o Porto.
Nesse ínterim, a companhia estará ao final de março, descontinuando voos de Recife para a Flórida, devida à devolução dos A350, A330 indisponíveis e atraso na entrega de outros. Nesses casos, o Nordeste é sempre o primeiro afetado.
Ademais, em 2024, o mesmo Governo ratificou o retorno da Air Europa para Recife. Assim, com uma nova entrante europeia, terá vontade a Azul de disputar espaço? Deveria.
À coluna, a Azul informou: “A Azul, maior companhia aérea brasileira em números de voos e destinos atendidos, informa que, como empresa competitiva, está sempre atenta ao mercado e avalia constantemente as possibilidades. Para este momento, contudo, não há previsão de novos voos internacionais a partir do Nordeste”.
Latam
A Latam, da mesma forma, desde 2014, só voou do Nordeste para os Estados Unidos.
Nem quando a Gol colocou 14 movimentos semanais entre Fortaleza e Orlando e Miami, a Latam desistiu de voar para a Flórida. Não, manteve 5 frequências semanais entre Fortaleza e Miami. Ainda teve voos de Recife e Salvador para Miami.
Por que tanta assimetria? É a falta de concorrência para os EUA e concorrência da TAP para Lisboa?
Em 2023, a Latam nos informou que voar para a Europa de Fortaleza apenas estaria na mesa, com a chegada dos Airbus 321 XLR.
Uma aeronave disruptiva, sim, mas que não dará a Latam uma boa capacidade de carga, como os A350, A330 e 787 dão ao Nordeste. A TAP, Air France e Air Europa têm o bônus completo por aqui.
A Latam à época, informou que voar internacional era desafiante porque o câmbio era desfavorável a eles, além de informar (ainda que algum rodeio) que Fortaleza não era um grande hub.
A Latam por hora não vê, porém, que Fortaleza tem conseguido sustentar, com pouca alimentação doméstica, voos da Air France para Paris. Portanto, com os 11 destinos diretos que têm a partir de Fortaleza, deveria perceber a grande chance já de alguns anos, em fazer Fortaleza-Lisboa.
Enquanto isso, tudo indica para mais amontoado de voos em Guarulhos, dobrando o tempo de viagem dos nordestinos até a Europa, sem falar nos próprios turistas europeus que se destinam ao Nordeste.
Para nós, a Latam informou também que avalia constantemente todas as oportunidades para ampliar a sua conectividade no Brasil e com o mundo de forma sustentável.
Qualquer nova operação é comunicada oportunamente pela companhia.
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*Este texto reflete, exclusivamente, a opinião do autor.