O Estado do Ceará investiga 61 casos envolvendo a mutação do novo coronavírus. A variante foi detectada em amostras de pacientes de seis estados: Amazonas, Rio de Janeiro, São Paulo, Roraima, Pará e Sergipe. O Governo do Ceará recomendou que as pessoas vindas dessas regiões mantenham isolamento de 14 dias. Países como Argentina, Canadá, Chile, Equador, Estados Unidos da América, Jamaica, México, Peru, Japão, Reino Unido, África do Sul e República Dominicana, também são consideradas áreas de risco.
Dos possíveis casos da nova cepa no Estado, 44 são viajantes e 17 tiveram contato domiciliar com pessoas das áreas de risco, os chamados contactantes. Segundo a atualização epidemiológica da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), o surgimento de mutações é um evento natural e esperado no processo evolutivo viral. Desde a caracterização genômica inicial do Sars-CoV-2, este vírus se dividiu em diferentes grupos genéticos ou 'clados', uma ramificação.
No entanto, pouco ainda se sabe sobre o que afinal significa e representa para a pandemia uma nova cepa do coronavírus. Pensando nisso, o Diário do Nordeste analisou o relatório da OPAS e conversou com a professora, epidemiologista e virologista da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), Caroline Gurgel, para retirar as principais dúvidas sobre a variante.
Afinal, o que é uma mutação?
Uma capacidade biológica de um ser vivo se adaptar a qualquer estímulo. Isso ocorre ao nível de material genético. Então vão ser produzidas novas cepas, com proteínas diferentes, por mais que permaneçam da mesma espécie. Sendo um processo que ocorre no material genético que pode gerar novas variantes. Nos coronavírus existe uma região chamada de RNA, composto por pequenos "tijolinhos", que formam uma sequência lógica para produzir elementos úteis para a fabricação de novos vírus. Esse RNA pode não ser copiado corretamente e essa falha se mantém e gera uma nova variante.
Como se chamam e onde surgiram as novas variantes do novo coronavírus?
As variantes estão sendo denominadas de acordo com a localização que estão surgindo. Temos variante do Reino Unido, outra sul-africana, outra do Amazonas. Essa nomenclatura é comum para vírus.
Em 14 de dezembro de 2020, as autoridades do Reino Unido notificaram a Organização Mundial de Saúde uma variante denominada pelo Reino Unido como Sars-CoV-2 VOC 202012/01. Essa variante contém 23 substituições de nucleotídeos e não está filogeneticamente relacionada ao vírus Sars-CoV-2 que circulava no Reino Unido quando ela foi detectada. Não está claro como e onde se originou.
Em 18 de dezembro de 2020, as autoridades nacionais da África do Sul anunciaram a detecção de uma nova variante do Sars-CoV-2 que está se espalhando rapidamente em três províncias sul-africanas. A África do Sul denominou essa variante de 501Y.V2, devido à mutação N501Y. Embora a variante VOC 202012/01 também tenha a mutação N501Y, análises filogenéticas demonstraram que a variante 501Y.V2 detectada na África do Sul é uma variante diferente.
A linhagem B.1.1.28 foi descrita pela primeira vez no Brasil em 5 de março de 2020, pelo Instituto Adolfo Lutz, em um paciente de 22 anos. Essa linhagem tem circulado no Reino Unido (3,0%), na Austrália (1,0%), nos Estados Unidos (1,0%) e em Portugal (1,0%).
Além das variantes já mencionadas, os Estados Unidos da América e o Japão notificaram a detecção de novas variantes, cuja abrangência e importância para a saúde pública exige mais investigação epidemiológica e laboratorial.
A mutação do novo coronavírus deixou ele mais agressivo?
Não existe uma resposta concreta acerca disso. No entanto, é possível sugerir que sim, a partir da experiência vivenciada em Manaus. Recentemente, também foi documentado um estudo informando que pessoas infectadas com a variante VOC 202012/01 têm um risco maior de óbito do que pessoas infectadas com outras variantes.
A mutação do novo coronavírus deixou ele mais transmissível?
É possível sugerir que existe uma maior transmissibilidade pela explosão de casos em Manaus, que tem números muito superiores quando comparados aos piores meses em 2020. Estudos preliminares sugerem que a variante 501Y.V2 está associada a uma carga viral mais alta, o que pode sugerir um maior potencial de transmissibilidade.
Como a nova cepa surgiu e se espalhou?
O surgimento de mutações é um evento natural e esperado no processo evolutivo dos vírus. Desde a caracterização genômica inicial do SARS-CoV-2, este vírus se dividiu em diferentes grupos genéticos ou clados.
Ela surge nas células dos organismos de pessoas infectadas com o vírus. O material genético do vírus, o RNA, por vezes não é "corrigida" a sequência de produção de proteínas estruturais do vírus. Isso não prejudica em nada o vírus, pelo contrário, o faz evoluir. Ele se espalha igual os outros.
Isso já aconteceu antes?
Sempre aconteceu, faz parte da evolução dos vírus. O grande problema é que os cientistas demoraram para entender e lidar com a cepa mais frequente, e só recentemente tiveram êxito. E agora surge uma variante que pode, sim, nos surpreender com maior letalidade.
As vacinas devem funcionar para essas novas variantes?
Sim, se for usado como matéria-prima da vacina um segmento que seja estável mesmo na mutação. Além disso, tendo anticorpos eles podem agir como um auxílio, evitando casos graves mesmo com o contato com variantes.
As vacinas não são enfraquecidas. Elas permitem que o corpo entre em contato com o material do vírus, gerando imunidade. Quando o vírus entra em contato com o corpo vacinado, os anticorpos estão prontos para combate-lo, por isso os sintomas são mais leves. A vacinação em massa será a única forma de conviver com a pandemia. Inicialmente, é impossível distinguir.
A nova variante foi a grande responsável pelo surto de Manaus?
Quais os principais sintomas da nova variante?
Os sintomas cursam rápido e com a necessidade de oxigênio suplementar. Essa busca por oxigênio resultou em colapso nos hospitais Manaus, muitos pacientes morreram asfixiados sem o oxigênio medicinal. Outros possíveis sintomas são: febre alta, tosse, cansaço e queda na saturação de oxigênio.
Como o Governo pode evitar a contaminação em massa?
Manter a educação em saúde para que a população possa se conscientizar, distribuir máscaras para aqueles que não podem comprar, disponibilizar ambientes onde as pessoas possam lavar as mãos com frequência, aumentar a quantidade de equipes para fiscalização de locais que promovem aglomerações. Não permitir mais a entrada de indivíduos advindos de áreas com a circulação de novas variantes. Dar o incentivo necessário para que as pessoas possam ficar em casa, distribuir cesta básica, pagar conta de luz e água para a população de baixa renda. Não é só mandar ficar em casa, tem que dar o suporte para que eles possam ficar.