Como manter um grupo de jurados incomunicável em um júri popular de ampla repercussão e que dura quase uma semana? As primeiras sessões de julgamento da 'Chacina do Curió' foram cercadas de desafios para o Poder Judiciário. Antes de chegar a uma sentença e 'fazer Justiça' era preciso garantir desde a segurança no entorno do Fórum Clóvis Beviláqua ao isolamento devido daqueles que iriam condenar ou absolver os policiais militares sentados no banco dos réus.
A juíza Solange Menezes, diretora do fórum, lembra: "foi preciso montar uma força-tarefa". O Diário do Nordeste esteve no prédio acompanhando as sessões do maior julgamento da história do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) e traz os bastidores de como o Judiciário se organizou para abrigar e fazer fluir cada um dos júris.
Meses antes do primeiro julgamento, ocorrido no último mês de junho, a direção do Fórum Clóvis Beviláqua se reuniu com o juiz Marcos Aurélio Marques Nogueira, presidente do colegiado e titular da 1ª Vara Júri, com a Assistência Militar, setor de comunicação social e cerimonial: "para iniciar o traçado do que a gente ia fazer", lembra Solange Menezes.
"No primeiro júri já foram cadastradas quase 500 pessoas. Essas três sessões despertaram muita atenção, muita curiosidade da sociedade de Fortaleza. A primeira sessão já se anunciava grande, uma coisa demorada, com previsão de demorar muitos dias... foi preciso realmente uma força-tarefa com horários diferenciados", explica a magistrada.
ligadas ao Judiciário chegaram a trabalhar ao mesmo tempo, em um dia, durante o júri da Chacina do Curió
No hotsite pensado exclusivamente para o 'júri do Curió'
ISOLAMENTO DOS JURADOS
Solange Menezes menciona que o isolamento dos jurados foi um dos pontos com mais atenção da organização. A cada sessão, sete novos jurados eram sorteados e precisavam ficar incomunicáveis até ser proferida a sentença, se não, o júri poderia ser anulado.
"Foram muitos dias mesmo. Uma das coisas que o juiz tem mais cuidado é com isso para 'não colocar o trabalho a perder'. São retiradas televisões dos quartos, eles ficam sem celular, ficam esses dias sem contato. O contato deles neste período é com o juiz. Eles são destinatários de tudo o que tá acontecendo ali".
Agora, com o início de uma grande reforma no Fórum existe expectativa de que no prédio seja construído espaço para hospedar os jurados de cada Tribunal do Júri.
ESPAÇO FÍSICO
O entorno do Fórum Clóvis Beviláqua foi bloqueado para garantir a segurança na entrada e saída dos visitantes e participantes do julgamento. Houve dias, conforme a magistrada, que três salões do fórum foram destinados a este júri.
Enquanto no 1º salão acontecia o julgamento, os outros ficaram como suporte para familiares das vítimas e familiares dos réus.
"A gente sabe que é um ambiente pesado, um ambiente tenso, com feridos dos dois lados. Então tivemos cuidado em receber com acolhimento os dois lados. Precisamos ter um olhar cuidadoso para o que podia acontecer, havia testemunhas e vítimas que estavam sob proteção, representantes da ONU (Organização das Nações Unidas), da Anistia Internacional, da Unesco, Ministério da Justiça, deputados, vereadores.... tudo ocorreu de forma muito respeitosa, com juízes extremamente ponderados, educados e conscientes do seu papel", relata Solange.
PRÓXIMOS JÚRIS
As próximas sessões do 'júri do Curió' seguem sem data para acontecer. Há expectativa que, pelo menos, mais 10 policiais militares sejam julgados pela chacina.
Atualmente, o Fórum Clóvis Beviláqua passa por reformas. Para abrigar as sessões, enquanto isso, foi firmado convênio com a Fundação Edson Queiroz para cessão de espaços.
Segundo o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), "a medida é importante para não haver descontinuidade da programação de pautas já agendadas para este período, sob a responsabilidade das cinco Varas do Júri de Fortaleza, de modo que os trabalhos não sejam prejudicados".
Temporariamente, a Universidade de Fortaleza (Unifor) vai disponibilizar um auditório para as sessões de julgamento, nos casos com réus que estejam respondendo processo em liberdade, "audiências de instrução, julgamentos de casos de maior complexidade ou com réus presos permanecerão sendo realizados no próprio Fórum".
O Tribunal destaca que o período de obras tem previsão de duração de 12 meses e que a "diretoria do Fórum da Comarca de Fortaleza adotará todas as medidas logísticas necessárias às sessões, como organizar o acesso público aos julgamentos, a disponibilização de equipe de segurança para acompanhamento das sessões, entre outras ações. Além disso, será garantido o acesso da população, jurados e profissionais que irão atuar nos julgamentos".