Morte de estudante grávida e que teve corpo carbonizado completa 1 ano; não há data para julgamento

"Eu nunca imaginei que acontecesse uma coisa dessa na minha família", relata a mãe da universitária ao pedir celeridade para o processo

Um dos feminicídios com mais requintes de crueldade registrado em 2021 no Ceará completa um ano nesta quinta-feira (13). No dia 13 de janeiro do ano passado, a família de Maria Efigênia Soares descobria que a estudante universitária havia sido morta e se deparava com o suspeito pelo crime, o então namorado da vítima, Wando Cordeiro Vasconcelos.

Aquela era a primeira vez que Jacqueline Santana, mãe de Efigênia, via Wando. A notícia de que o namorado era o responsável pela morte veio que quase ao mesmo tempo da família saber que a estudante estava grávida, e por não aceitar a gestação, Wando quis o fim da namorada e do futuro filho. "A minha filha depositou toda a confiança nesse homem. Ele matou ela dia 13 de janeiro, mas tinha prometido que até 15 de janeiro vinha falar comigo, se apresentar para a família. Mas isso não aconteceu", diz Jacqueline.

Um ano após a tragédia, o suspeito, agora réu na Justiça do Ceará, segue preso. Em meio aos pedidos por liberdade e recursos pela impronúncia feitos pela defesa de Vasconcelos ainda não há data para o julgamento do caso que integra o programa Tempo de Justiça.

"EU SONHO MUITO COM ELA"

"É muito triste tocar neste assunto", começa Jacqueline ao recordar tudo que viveu há um ano. Em seguida, a mãe pede forças a Deus e lembra que o "principal intuito de ainda falar sobre (o caso) é chamar a atenção das autoridades". A notícia mais recente que a família tem é a decisão de Wando ir a júri popular, mas por não saberem datas, prazos, a mãe se diz "preocupada com quando isso realmente vai acontecer".

De acordo com o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE),  em 16 de novembro de 2021, a defesa do réu interpôs Recursos Especial e Extraordinário contra o acórdão (decisão da 2ª Câmara Criminal) que manteve a decisão de pronúncia (que o réu seja julgado pelo Tribunal do Júri). Em 13 de dezembro, a Coordenadoria de Recursos aos Tribunais Superiores do TJCE abriu vista ao Ministério Público e assistente da acusação (se houvpara, querendo, apresentar contrarrazões aos recursos. Esta é a movimentação mais recente do processo.

"Minha filha morava comigo. A minha rotina mudou muito. Eu passo 24 horas pensando nela, sonho muito com ela criança. Agora a gente espera esse julgamento e eu confio em Deus para acelerar tudo isso. Acredita que eu ainda tenho expectativa que ele confesse o crime? Eu nunca imaginei que acontecesse uma coisa dessa na minha família"
Jacqueline Santana
Mãe de Maria Efigênia, vítima de feminicídio


COMO O CRIME ACONTECEU

Maria Efigênia saiu de casa na noite de uma quarta-feira 13 de janeiro de 2021, no bairro José Walter, em Fortaleza, informando que iria a um supermercado. Com a demora para o retorno, mãe, pai e irmão se preocuparam com o paradeiro da universitária. A Divisão Antissequestro (DAS) foi acionada quando o pai da vítima recebeu uma mensagem no Whatsapp, do número da própria filha, com uma mensagem que pedia dinheiro em troca o resgate.

Quando uma amiga da universitária contou à mãe dela sobre a gravidez, a linha investigativa mudou. "Eu não sabia que ela estava grávida. Ela não tinha nenhum indício. Dormia muito porque costumava só ir deitar de madrugada mesmo. Então nada me fez suspeitar.  Uma amiga dela disse que ela tinha algo a me contar, que era sério e que podia ter relação com o desaparecimento. Eu não conhecia esse rapaz, mas sabia que ela estava namorando com alguém. Então eu pensei que ele tinha levado ela para alguma clínica para abortar e que minha filha estava por aí desacordada", recorda Jacqueline.

A Polícia rastreou a localização de Wando Cordeiro e o suspeito chegou a detalhar como agiu para assassinar a namorada. Consta nos autos que, supostamente, o casal discutiu e Efigênia foi assassinada.

De acordo com o inquérito, "após matá-la, Wando teria jogado um tapete por cima do corpo que se encontrava no banco traseiro do carro e se dirigido a um posto de combustível no bairro José Walter onde teria abastecido o galão de cinco litros que trazia no porta-malas de seu carro. Em seguida, o indiciado afirmou que teria dirigido por quase 50 quilômetros no sentido do município de Chorozinho, sendo que no km 58 da BR 116 ele parou o veículo no acostamento, retirou o corpo juntamente com o tapete e o colocou no matagal próximo ao acostamento, vindo a jogar gasolina em cima do corpo para apagar os vestígios do crime".

Para a Polícia ficou evidenciado que toda "a empreitada criminosa foi previamente arquitetada"

O suspeito foi acusado pelo Ministério Público do Ceará (MPCE) no dia 22 de janeiro de 2021, e no dia 25 do mesmo mês se tornou réu na Justiça Estadual. O TJ recordou via nota que, de acordo com os autos, em 19 de maio de 2021, ou seja,  quatro meses após o crime,  o réu foi pronunciado (determinado que fosse julgado pelo Tribunal do Júri) como incurso, em tese, no crime de homicídio qualificado pelo motivo torpe, pelo meio cruel, pelo recurso que impossibilitou a defesa da vítima e por ter sido praticado contra mulher num contexto de violência doméstica e familiar, em que foi vítima Efigênia Maria Santana Soares, e nos crimes conexos de aborto e destruição ou ocultação de cadáver.

A reportagem tentou entrar em contato com os advogados de defesa do denunciado, mas não obteve êxito.