Preso no complexo penitenciário de Bangu, no Rio de Janeiro, o ex-deputado federal Roberto Jefferson escreveu uma longa carta para criticar o que chamou “vício nas facilidades do dinheiro público” por parte do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e do filho '01', o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ). O texto foi obtido com exclusividade pelo jornal O Globo.
Para Jefferson, Bolsonaro foi mais um seduzido como os tantos “viciados” do Centrão, incluindo Ciro Nogueira e Valdemar da Costa Neto.
“Quem anda com lobo, lobo vira, lobo é. Vide Flávio", escreveu.
Ao explanar sobre a relação do presidente com o conjunto de partidos, ele diz que Bolsonaro precisa “peitar” essas figuras, incluindo o próprio filho.
“Reparem, quando eu quis construir um partido com bases nas expectativas honradas do povo brasileiro, abri mão de lideranças viciadas em velhas práticas; Rondon, Albuquerque, Campos, Cristiane, Benito, Armando, Arnon Bezerra, etc”, disse o investigado por envolvimento em milícias digitais.
Após a prisão por ameaças a ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-deputado, que é presidente do PTB, rompeu com a filha, a também ex-deputada Cristiane Brasil, por rachas internos na sigla. No último dia 7 de outubro, ela foi expulsa da legenda.
Contexto usado por Jefferson, na carta, como exemplo a ser seguido por Bolsonaro.
“Não é fácil fazer a mudança, ela machuca até a gente, pois temos que atingir gente que amamos, mas que se recusa a compreender os novos objetivos. Bolsonaro precisava peitar. Se os filhos atrapalham, remova-os”, afirmou.
“Não é fácil afastar um filho, sei a dor de afastar a Cristiane. Mas o projeto político está acima das concessões sentimentais”, completou.
Após diversas críticas e insinuações de que o presidente entrou para o grupo dos “viciados por dinheiro”, ele diz que planeja convidar o vice Mourão para O PTB. Em seguida, cogita apoiar Bolsonaro num possível 2º turno.
Leia a carta na íntegra:
"O Bolsonaro era a ruptura. Foi eleito para romper com uma velha política, que teve origem na redemocratização, toma lá dá cá, governo de coalização, cada partido recebe um naco da administração e se remunera. E o povo?
"O povo que se lasque".
O Bolsonaro deveria ter aprofundado a ruptura, os choques seriam intensos, como o rugido das ondas nas paredes rochosas dos litorais. Mas ressaqueado até que passasse esse ciclo da lua. Quando tudo, tudo, seguiria o retorno da nova liderança. Mas ele foi cercado pelas figuras do Centrão, que o fizeram capitular frente aos rosnados das bestas famintas de dinheiro público.
E o povo? O povo gostaria de ver as bestas enjauladas ou abatidas a tiros pelos caçadores. Mas o presidente tentou uma convivência impossível entre o bem e o mal. Acreditou nas facilidades do dinheiro público.
Esse vício é pior que o vício em êxtase, quem faz sexo com êxtase tem o maior orgasmo ou ejaculação que o corpo humano de Deus pode proporcionar. Gozou com êxtase, para sempre dependente dele. Desfrutou do prazer decorrente do dinheiro público, ganho com facilidade, nunca mais se abdica desse gozo paroxístico que ele proporpciona.
Bolsonaro cercou-se com viciados em êxtase com dinheiro público; Farias, Valdemar, Ciro Nogueira, não voltará aos trilhos da austeridade de comportamento. Quem anda com lobo, lobo vira, lobo é. Vide Flávio.
Nosso caminho é outro. Queremos um governo dos justos, que felicite e orgulhe o povo. Um governo que não roube e não deixe roubar. Um governo que sirva o povo, não se sirva dele. Um governo que trabalhe com o poder do amor, jamais com o amor do poder.
Reparem, quando eu quis construir um partido com bases nas expectativas honradas do povo brasileiro, abri mão de lideranças viciadas em velhas práticas; Rondon, Albuquerque, Campos, Cristiane, Benito, Armando, Arnon Bezerra, etc...
Não é fácil fazer a mudança, ela machuca até a gente, pois temos que atingir gente que amamos, mas que se recusa a compreender os novos objetivos.
Bolsonaro precisava peitar.
Se os filhos atrapalham, remova-os. Valdemar Costa neto e Ciro Nogueira puxam para trás qualquer mudança de práticas, para uma nova vereda de austeridade e honra.
Ruptura com a corrupção tem um peso, leva gente que nós gostamos. Mas é o que o povo espera.
7 de setembro ficou imaculado. Todo o povo saiu às ruas para dizer, eu autorizo, não havia volta, não havia transigência com as velhas práticas. Mas por algum motivo, Bolsonaro fraquejou. Não teve como seguir. Escrevo isso insone. Não preguei meus olhos. Esse pensamento queimou minhas pestanas, não consegui fechar meus olhos e dormir.
Vamos por nós mesmos.
Vamos convidar o Mourão. O PTB terá candidatura própria, quem sabe apoiamos o Bolsonaro no segundo turno.
Não é fácil afastar um filho, sei a dor de afastar a Cristiane. Mas o projeto político está acima das concessões sentimentais.
Não se transige à tirania.
Não se transige à opressão.
Não se rende homenagens à ditadura, não se curva às ameças dos arrogantes.
Nosso edital sinalizará um novo caminho." A candidatura própria tem precedência sobre as demais".
Gustavo, leva a carta ao general Mourão. Convide-o para a disputa a Presidência, quem souber percorrer a terceira via, vencerá a eleição.
São 5:30 horas, não preguei meus olhos. Minha cabeça está acesa e ligada. É o fogo do Espírito Santo mostrando o caminho a se seguir.
Não visitem mais a Carminha, ela é desembargadora, ele é da turma do Supremo. Nós somos políticos, nossa gente é outra. Somos de outra tribo.
Candidatura própria tem precedência.
7 de setembro é um dia inacabado, quem souber construir o sonho de nosso povo, virará vitorioso as páginas de nossa folhinha.
Deus abençõe nossa gente.
Deus proteja nosso Brasil.
Deus é nossa força e vitória.
Abração.
Roberto Jefferson.
7 de setembro é dia inacabado.
O povo foi ludibriado".
Prisão
Jefferson foi preso em agosto deste ano por determinação do ministro do STF, Alexandre de Moraes, por ataques às instituições democráticas. O titular do PTB, no entanto, precisou ser internado após ter passado por problemas de saúde no Complexo Penitenciário. Ele teve uma infecção urinária e, depois, passou por um cateterismo.
Na quarta-feira (13), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou o "imediato retorno" do ex-deputado federal para a cadeia, depois de ter sido informado pela unidade de saúde que ele já estava em condições de receber alta.
Assim, no último dia 14, Jefferson deixou o hospital onde estava internado e voltou à prisão no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, na Zona Oeste do Estado.
Denúncia
Jefferson também foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) devido aos ataques feitos às instituições democráticas. A defesa apontou problemas de saúde para pedir que ele fosse transferido para a prisão domiciliar.
O ex-deputado federal é aliado ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o que causou descontentamento no Palácio do Planalto.