Quatro ex-presidentes do Brasil foram alvo da Polícia Federal desde a redemocratização

Relembre casos em que ex-mandatários estiveram na mira de investigações

Com o nome do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na mira da Polícia Federal (PF), subiu para quatro o número de ex-chefes do Estado Brasileiro alvos de operações policiais desde a redemocratização do País. Nenhum dos que foram investigados, no entanto, foram considerados culpados, até o momento, nos processos que já chegaram ao fim no Poder Judiciário.  

No caso de Bolsonaro, as investigações contra ele — que vão desde participação nos atos golpistas de 8 de janeiro à fraude no cartão de vacinação contra a Covid-19 — ainda estão em curso, por isso o ex-mandatário também não é considerado culpado por nenhum crime. Ainda assim, alguns ex-presidentes chegaram a ser presos no meio das investigações e antes do trânsito em julgado.  

O atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi o único que começou a cumprir pena após julgamento em segunda instância, de 7 de abril de 2018 a 8 de novembro de 2019, antes do trânsito em julgado. As condenações contra ele, inclusive, foram anuladas em abril de 2021 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), devido à declaração de incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar o então ex-presidente. No mesmo ano, em junho, o STF também confirmou a suspeição do juiz Sérgio Moro para condenar Lula no caso do Triplex de Guaraujá. 

O Diário do Nordeste compilou os principais episódios em que quatro então ex-presidentes foram alvos da Polícia Federal por suspeitas de fraude, corrupção, lavagem de dinheiro, entre outros crimes. Confira abaixo. 

Jair Bolsonaro 

O caso mais recente é envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro. No dia 3 deste mês, a PF cumpriu mandado de busca e apreensão na casa dele em Brasília, para apurar suposta fraude no cartão de vacinação contra a Covid-19 incluída nos sistemas do Ministério da Saúde. A operação da Polícia Federal na casa do ex-mandatário brasileiro foi cumprida a mando do ministro Alexandre de Moraes, do STF, no âmbito do inquérito das milícias digitais. 

O inquérito investiga suposto grupo criminoso que teria inserido informações falsas nos dados de imunização contra a Covid-19 no Ministério da Saúde. Os dados adulterados teriam sido colocados nos sistemas dias antes de Bolsonaro viajar para os Estados Unidos, em dezembro de 2022, quando ele ainda era presidente. 

Os EUA, por sua vez, exigem o comprovante de vacinação contra a Covid-19 para entrada de estrangeiros no País. A suspeita é de que Bolsonaro, sua filha Laura, o ex-ajudante de ordens do ex-presidente, Mauro Cid, e a esposa e as duas filhas de Mauro Cid tenham se beneficiado do esquema. Mauro Cid, inclusive, foi um dos cinco presos durante a operação da PF — que cumpriu mandados no Rio de Janeiro e em Brasília. 

Na ocasião, Bolsonaro teve o celular apreendido. Em sua defesa, ele alegou que nunca se vacinou contra a doença. Além dessa operação, o ex-presidente também já prestou outros depoimentos à Polícia Federal por suspeita de tentar entrar no Brasil com joias sauditas de R$ 16,5 milhões, sem declarar à Receita Federal, e por participação intelectual e incitação nos atos golpistas de 8 de janeiro. 

O ex-mandatário também é alvo de outros inquéritos e ações judiciais. Os casos apuram atitudes do ex-presidente desde 2014, quando ele ainda era deputado federal. Em dois processos no STF, inclusive, ele é réu por supostamente ter feito uma incitação ao estupro ao dizer que sua colega da Câmara, deputada Maria do Rosário (PT-RS), "não merecia" ser estuprada porque era "muito feita". 

Michel Temer 

Já os escândalos envolvendo o ex-presidente Michel Temer (MDB), que tomou posse como titular do mandato em agosto de 2016, após o impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT), começaram ainda quando ele estava como chefe do Poder Executivo do Brasil.

Em 2017, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou denúncias à Câmara dos Deputados para abrir uma investigação contra Temer por corrupção e por supostamente comandar o "Quadrilhão do MDB", que negociaram propinas de cerca de 1,8 bilhão em diversos órgãos públicos do Governo Federal comandados por correligionários do então presidente. 

Todavia, as denúncias de Rodrigo Janot foram barradas na Câmara dos Deputados em 2018. Como Temer tinha foro privilegiado, qualquer processo de investigação e afastamento do cargo só poderia ocorrer mediante aval dos parlamentares em Brasília. Apesar disso, alguns dos ministros acabaram caindo em meio à investigação e sendo presos.

Foi o caso, por exemplo, de Geddel Vieira Lima (MDB), preso, em 2017, pela Polícia Federal após serem encontrados R$ 51 milhões em um apartamento ligado a ele na Bahia. Geddel foi ministro do Governo no Planalto durante parte da gestão de Temer.  

Por isso, foi em março de 2019, quando já tinha deixado a Presidência da República, que Temer acabou sendo preso preventivamente pela força-tarefa da Lava Jato, no âmbito da investigação "Angra 3", que apurava crimes de corrupção, peculato e lavagem de dinheiro nas obras da usina nuclear em Angras dos Reis, no Rio de Janeiro.

Segundo denúncia do Ministério Público Federal à época, comandado pela então procuradora-geral da República Raquel Dodge, que deu sequência a algumas investigações iniciadas por Janot, milhões de reais em propinas tinham sido negociadas pelo grupo de Temer nas obras da usina. 

Na ocasião da prisão, a Justiça Federal de Brasília pediu o bloqueio de R$ 32,6 milhões das contas bancárias de Temer; Coronel Lima, amigo pessoal de Temer desde 1980 e apontado como operador financeiro do ex-presidente na organização criminosa; e Carlos Alberto Costa, sócio de lima na empresa de engenharia e arquitetura Argeplan, também investigada. 

Até a reforma de um imóvel da filha de Temer, Maristela Temer, chegou a ser investigada à época. A reformulação na casa da filha do ex-mandatário teria, supostamente, sido pago com dinheiro de propina. Dias após a prisão, ainda em março de 2019, Temer foi solto por força de habeas corpus. 

Em maio de 2019, o ex-presidente foi preso novamente, na mesma investigação, também sendo solto dias depois por habeas corpus. No início de 2022, a Justiça Federal de Brasília absolveu Temer e outros sete investigados: o ex-ministro Moreira Franco (Minas e Energia); o ex-presidente da Eletronuclear Othon Luiz Pinheiro da Silva; o sócio da Engevix José Antunes Sobrinho; o amigo do ex-presidente João Baptista Lima Filho, o coronel Lima; e os empresários Carlos Alberto Costa, Maria Rita Fratezi e Rodrigo Castro Alves Neves. 

De acordo com o juiz Marcus Vinícius Reis Bastos, da 12ª Vara Federal do Distrito Federal, a denúncia era "genérica" e baseada apenas na delação do empresário de empreiteiras José Antunes Sobrinho, que prestou depoimento na investigação. O caso foi encerrado. 

Luiz Inácio Lula da Silva

O hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também já esteve na mira da Polícia Federal, no âmbito da operação Lava Jato. Ele foi o primeiro ex-mandatário do Brasil investigado na força-tarefa. A Lava Jato iniciou em 2014, mas foi em 2016 que Lula foi alvo pela primeira vez da operação, com os casos do "Triplex de Guarujá", do "Sítio de Atibaia" e de supostas doações de propina ao "Instituto Lula".  

Em março daquele ano, o então ex-presidente foi conduzido coercitivamente para a sede da Polícia Federal, em São Paulo, para prestar depoimento em esquemas corrupção, lavagem de dinheiro e tráfico de influência na Petrobras, com recebimento de propina de empreitas contratadas, como a Odebrecht e a OAS. 

No caso do Triplex de Guarujá, Lula foi acusado de ter recebido um triplex avaliado em cerca de R$ 3 milhões como parte de propina da OAS. Já no caso do sítio de Atibaia, de aproximadamente R$ 1,7 milhão, o imóvel teria sido adquirido por meio de pagamento de suborno da Odebrecht e da OAS. O terreno onde está instalado o Instituto Lula, em São Paulo, também teria sido fruto de pagamento de propina. 

O então ex-presidente negou todas as acusações, ainda que os imóveis não estivessem em seu nome. Apesar disso, em 7 de abril de 2018, Lula foi preso após ser condenado pelo então juiz Sergio Moro no caso do Triplex de Guarujá. Ele se entregou a PF após ficar dois dias na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC Paulista, em São Bernado dos Campos. Na época, uma multidão de apoiadores do presidente foi até o local para tentar impedir a prisão de Lula.  

Lula ficou preso de 7 de abril de 2018 a 8 de novembro de 2019. Enquanto estava em cárcere, foi condenado também, em segunda instância, no caso do Sítio de Atibaia. 

Em abril de 2021, o Supremo Tribunal Federal anulou as condenações contra Lula no âmbito da Lava Jato devido a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba em julgar o hoje presidente. Ainda na decisão, o Pleno da Corte alegou que não ficou demonstrada a ligação do petista com o grupo criminoso que atuava no desvio de dinheiro de contratos de obras para a Petrobras. Em junho de 2021, o STF também julgou a suspeição do juiz Sergio Moro no caso do triplex de Guarujá. 

Assim, Lula, que havia ficado inelegível em 2018 após as condenações, recuperou seus direitos políticos e pôde se candidatar nas eleições presidenciais de 2022, da qual saiu vitorioso. Atualmente, ele está no terceiro mandato como presidente da República. 

Fernando Collor 

O ex-presidente Fernando Collor de Mello foi alvo de operação da Polícia Federal em 1992, que investigava esquemas de corrupção, peculato e falsidade ideológica por supostamente permitir contratos milionários fraudulentos com empresas de publicidade contratadas pelo Governo sob a mediação de seu ex-tesoureiro de campanha, Paulo César Farias, também conhecido como PC Farias. Os supostos contratos teriam sido firmados entre 1990 e 1992. 

PC Farias foi apontado, inclusive, como "testa de ferro" de Collor pelo próprio irmão do senador, Pedro Collor Melo, em maio de 1992, em entrevista à revista Veja. A investigação contra Collor, inclusive, motivou o processo de impeachment do presidente, que teve início no Congresso Nacional no segundo semestre de 1992. 

No entanto, antes do processo de impeachment ser concluído, Collor renunciou ao cargo, no dia 29 de dezembro de 1992. Mesmo assim, o Congresso continuou com o impeachment e cassou Collor por 8 anos, no dia 30 de dezembro, tornando-o inelegível por 8 anos. Mais tarde, em 2006, Collor foi eleito senador de Alagoas. 

Em meio a isso, o processo na Justiça contra o ex-presidente andou em passos lentos. Apenas em 2014, ação foi julgada pelo STF. Na ocasião, ele acabou absolvido das acusações de corrupção, falsidade ideológica e peculato devido à demora do processo, no qual os crimes já havia prescritos. 

Depois disso, Collor foi alvo de outras operações da Polícia, mas não mais relacionadas ao período em que esteve na Presidência da República.