O advogado Cristiano Zanin foi sabatinado, nesta quarta-feira (21), pela Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) do Senado Federal. Ele é o indicado do presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT) para a vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
Em sessão com quase 8 horas, senadores indagaram a Zanin sobre temas que variaram desde a relação com o presidente Lula - de quem fez a defesa em processos ligados a operação Lava Jato - até a opinião sobre assuntos que devem ser julgados pelo STF, como a descriminalização da posse de drogas, o aborto e o Marco Temporal.
A indicação de Zanin ao Supremo foi aprovada pela CCJ por 21 votos favoráveis contra apenas 5 contrários, sem nenhuma abstenção. A votação é secreta. A previsão é de que o tema seja votado no plenário do Senado ainda nesta quarta-feira.
Confira destaques da sabatina de Cristiano Zanin no Senado Federal:
Relação com o presidente Lula
Advogado de defesa do presidente Lula nos processos ligados à Oeração Lava Jato - inclusive aqueles que levaram o petista a ser preso por 580 dias -, muitos dos questionamentos a Zanin giraram em torno da relação que o sabatinado mantém com Lula e, caso tenha o nome aprovado para o STF, se isso poderia colocar em risco a imparcialidade como ministro.
Zanin afirmou que, na condição de advogado, teve "uma convivência bastante frequente" com o presidente e que "preza muito por essa relação". Ele citou ainda que, em 2023, esteve apenas uma vez com Lula: na data da reunião no Palácio do Planalto, quando recebeu o convite para ser a indicação do presidente ao STF.
"Estou aqui hoje indicado pelo fato de ele ter conhecido meu trabalho jurídico, ter conhecido a minha carreira na advocacia e ter a certeza que eu vou me guiar exclusivamente pela Constituição e pelas leis, sem qualquer tipo de subordinação a quem quer que seja", disse.
Ele disse ainda, sobre a relação com Lula, que "jamais irá negá-la". "Pelo contrário, sou grato ao presidente Lula por indicar meu nome ao STF", ressaltou.
Zanin ressaltou ainda que, caso tenha a indicação aprovada, considera "ter condições" de exercer o cargo de ministro com imparcialidade.
"Aliás, a imparcialidade do julgador é um elemento estruturante da própria Justiça, para assegurar a credibilidade do sistema de Justiça. Todas as medidas que eu possa adotar para assegurar a credibilidade do sistema de Justiça, eu adotarei".
Suspeição em processos da Lava Jato
O sabatinado também foi indagado a respeito de em quais processos poderá declarar suspeição ou impedimento para julgar. Foram citadas, por exemplo, ações que tiveram como parte o presidente Lula ou que tiveram relações com a Operação Lava Jato - alvo de frequentes críticas de Zanin ao longo dos anos.
Zanin ressaltou que, em todos os processos em que tiver atuado como advogado, não poderá atuar também como julgador no Supremo. "Afinal, existe uma regra, uma lei específica que impede aquele que funcionou na causa em qualquer função de vir a julgar esta causa. Não há dúvida que eu deverei seguir esse impedimento em qualquer causa que eu tenha advogado", disse.
Contudo, sobre suspeição e impedimentos futuros - ainda que envolvam pessoas para as quais já advogou, como Lula -, ele disse que será necessário "analisar o conteúdo do processo, saber o tema em discussão e as partes envolvidas e aplicar o que diz a lei".
Indagado novamente sobre o mesmo tema, Zanin voltou a dizer que, em processos nos quais não atuou como advogado, independentemente das partes envolvidas na ação, só poderá declarar suspeição ou impedimento após a leitura dos autos.
A fala se aplica também a processos que envolvem a Operação Lava Jato - muitas das quais ainda em tramitação no STF. Zanin ressaltou que não participará de processos ligados à Operação nos quais atuou como advogado. Porém, não irá declarar suspeição ou impedimento quanto ao julgamento de processos apenas por terem a "etiqueta" da Lava Jato e não poderá considerar apenas essa nomeação como um "controle jurídico".
"Não acredito que o simples fato de colocar uma etiqueta no processo, indicar o nome Lava Jato, isso possa ser um critério para ser usado para aquilatar a suspeição ou o impedimento", ressaltou.
Avaliação de temas em discussão no STF
Os senadores aproveitaram a sabatina para indagar sobre temas que estão em discussão no Supremo Tribunal Federal. Foram abordadas temáticas como o aborto, a descriminalização do porte de drogas, o Marco Temporal e a adoção por casais homoafetivos.
Em resposta às indagações, Zanin preferiu, por vezes, se ater às questões técnicas ou constitucionais, mas sem se aprofundar na questão, já que ele pode vir a julgar os processos envolvendo cada uma das temáticas.
Ao ser indagado sobre o aborto, ele ressaltou que "o direito a vida está expressamente previsto na Constituição". "É uma garantia fundamental", completou.
Na sequência, ele ressaltou que já existem, na legislação brasileira, hipóteses em que é possível a interrupção da gravidez, como os casos de estupro, de gravidez decorrente de estupro, risco à vida da mulher e de anencefalia do feto.
Sobre o Marco Temporal - cujo julgamento voltou a ser adiado no STF -, ele disse que tanto o direito à propriedade como a proteção dos povos originários são previstos na Constituição e, portanto, o STF deve "sopesar esses valores" ao julgar a questão.
"Sobre a problemática da terra e do Marco Temporal, é necessário buscar conciliar os valores e as garantias previstas na Constituição para a solução deste caso. O STF tem adotado um instrumento importante, que é a conciliação mesmo na jurisdição constitucional", disse Zanin.
Ele chegou a indicar o posicionamento quanto às drogas ao dizer que as considera "um mal que precisa ser combatido". Ao ser indagado sobre como via a descriminalização do porte - que também deve ser discutido no STF -, Zanin preferiu ressaltar a importância do Congresso legislar sobre o tema.
"Vejo com bastante otimismo o fato de o Congresso e este Senado ter revisitado a Lei de Drogas para alocar, diferenciar ali o usuário do traficante, estabelecer penas mais amenas. Foi um papel importante", disse.
Além disso, Zanin também defendeu decisões do Supremo que contribuíram com a garantia de direitos de casais homoafetivos, como o casamento e adoção de filhos, além do direito de doar sangue a pessoas que se relacionam com o mesmo sexo.
"Eu respeito todas as formas de expressão de afeto e amor. Isso é um direito individual. É um direito fundamental as pessoas poderem, da sua forma, expressar afeto e amor. Isso tem que ser respeitado pela sociedade e pelas instituições", disse.
Reencontro entre Zanin e Sérgio Moro
A sabatina no Senado Federal também propiciou o reencontro entre Zanin e o senador Sérgio Moro (União-PR). No período em que atuou na defesa de Lula, Zanin confrontou o então juiz da Vara Criminal Federal de Curitiba.
Membro da CCJ do Senado, Sérgio Moro iniciou a fala dizendo que, desde a campanha eleitoral, havia se comprometido a sabatinar o indicado ao STF "rigorosamente", "quem quer que fosse o presidente, quem quer que fosse o sabatinado".
"Preparei uma série de perguntas bastante técnicas e alguns esclarecimentos sobre o histórico, mas quero dizer que faria da mesma maneira qualquer que fosse o indicado, qualquer que fosse o presidente. Não existe qualquer questão pessoal. Eu respeito seu trabalho como advogado, que foi um trabalho profissional, assim como eu fiz meu trabalho como juiz".
O senador fez diversas perguntas a Zanin a respeito da Lava Jato, inclusive se o advogado declarou suspeição ou impedimento para julgar processos ligados à operação. Ele também fez perguntas sobre a avaliação de temas como a nova Lei das Estatais, a exclusão de provas ilícitas de processos e o foro privilegiado.
Moro também mencionou a relação entre Zanin e Lula e quis saber mais detalhes sobre como esta se dava. Ele pediu ainda que Zanin confirmasse se foi ou não padrinho de casamento do presidente com a primeira-dama Janja.
"A minha relação com o presidente Lula se estabeleceu ao longo do tempo. Na condição de advogado, eu tive uma convivência bastante frequente. Não fui padrinho de casamento do presidente Lula. Prezo muito por essa relação, assim como pela relação que tenho com outras pessoas, inclusive deste Senado", respondeu Zanin.
Outros senadores que participaram da sabatina chegaram a comentar sobre o reencontro entre Zanin e Moro.
"A democracia é o sistema mais belo que conheço, porque permite situações como a que estamos assistindo no dia de hoje. (...) Esta democracia permite que estejamos sabatinando, como indicado ao STF, o ex-advogado do presidente Lula quando esteve respondendo sobre o processo de acusação no Paraná diante do ex-juiz, hoje senador da República, Sérgio Moro", disse Eduardo Braga (MDB-AM).