A semana que começou com a escalada da crise entre integrantes do PDT do Ceará termina com as lideranças municipais da sigla mudando o tom e adotando estratégias para apaziguar as tensões internas. Há uma semana, quando o diretório estadual pedetista se reuniu e convocou vereadores e deputados para tratar sobre os rumos do partido, a ideia era justamente aparar arestas e reunificar a legenda.
Contudo, o encontro antecedeu, na verdade, o maior tensionamento público da sigla no Ceará até hoje, com críticas do senador Cid Gomes (PDT) ao prefeito José Sarto (PDT), ao ex-prefeito Roberto Cláudio (PDT) e até ao próprio irmão, o ex-ministro Ciro Gomes (PDT).
Cid, no entanto, não ficou sem resposta. Aliados do atual prefeito e do ex-mandatário municipal contra-atacaram a principal liderança da sigla – inclusive questionando esse posto. Com a escalada rápida da crise que divide o partido, Cid, Sarto e Roberto Cláudio deram sinais de apaziguamento nesta quinta-feira (2).
Cid na Assembleia
Líder do PDT no Senado, Cid Gomes esteve na Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) para acompanhar a posse do deputado Antônio Granja (PDT), que assume vaga após saída de Oriel Nunes (PDT) para o secretariado de Elmano de Freitas (PT).
O parlamentar federal minimizou as próprias declarações, dadas em entrevista ao podcast ‘As Cunhãs’, divulgado na terça-feira (28). Na conversa, o pedetista disse que as ações de Sarto em Fortaleza não podem "ficar na Aldeota". "Ele tem que trabalhar e parecer que está trabalhando. Ele tem que ser flagrado cinco horas da manhã no cruzamento da José Bastos", disse Cid.
Já nesta quinta-feira, após as declarações terem sido rebatidas pela base do prefeito na Câmara de Fortaleza, Cid ressaltou que não falou "nada de polêmico". “Eu recomendo a quem criticou a minha entrevista, a assistir a entrevista. Veja se eu fiz alguma crítica ao Sarto, ao contrário. Se ele não me pede conselho de perto, eu tô procurando dar conselho de longe", disse Cid.
Em outro momento, o pedetista sinalizou que, mesmo com os embates internos, apoiará o prefeito em uma eventual tentativa de reeleição, caso o atual mandatário seja escolhido pelo partido. “Eu o apoiarei, você tem dúvida disso?”, disse.
Ele ainda fez uma retomada histórica desde a eleição para elogiar os quatro pré-candidatos do PDT: Roberto Cláudio, Izolda Cela, Mauro Filho e Evandro Leitão. “Quem é que naquela época podia dizer que a candidatura do PDT, sem o apoio do PT, não ganharia? Eu achava que ia ser muito difícil, por isso defendi a aliança. Mas pra mim, todos os nomes estavam à altura”, pontuou.
O senador novamente sinalizou um distensionamento no discurso sobre o ex-prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio, derrotado nas últimas eleições por Elmano de Freitas (PT). Na entrevista divulgada na última terça-feira, Cid enfatizou que o ex-mandatário “achou que o céu era perto”.
Nesta quinta-feira, ele disse que a declaração não foi um ataque.
“Dizer que Roberto Cláudio se deixou levar pela vaidade, isso não é agressão. Se eu dissesse assim: ‘Roberto Cláudio é um vaidoso irreversível, ganancioso’, isso seria uma agressão, mas ‘se deixou levar’, ‘a vaidade falou mais alto’, quem de nós não tem vaidade? Quem de nós não tem ambição? Você não pode é permitir que essas coisas sejam mais fortes do que a razão, a razão deve prevalecer”
Até as declarações que deu sobre o próprio irmão, alegando que Ciro fez política com o “fígado” na campanha do ano passado, foram amenizadas pelo senador. “Ciro é e será sempre minha referência. Isso não quer dizer que eu, com ele, não tenha a franqueza e a sinceridade de dizer, ele também muitas vezes é duro comigo, e eu também faço a mesma coisa com ele”, disse.
Diante da divisão interna do partido, Cid reforçou que não espera uma adesão completa da sigla à base do Governo Elmano. “Não vou querer obrigar que o PDT seja 100% Elmano, nem o PT é 100% Lula (...) então como você vai querer obrigar que o PDT tenha uma postura homogênea em relação ao Governo de outro partido? Não é razoável”, ressaltou.
Cid também reforçou que está aberto a críticas. “Certamente tem gente defendendo que o meu tempo passou, que eu não devo estar mais. Eu vou ficar enquanto eu achar que a minha opinião é ouvida, que a minha opinião é acatada. Vejo isso com toda naturalidade do mundo”, concluiu.
Roberto Cláudio e Sarto reagem para apaziguar tensões
Horas depois, à noite, a cúpula municipal do PDT se reuniu na sede do partido. O encontro definiu o novo líder do PDT na Câmara de Fortaleza: Didi Mangueira (PDT). Contudo, a expectativa maior estava na reação de Sarto e Roberto Cláudio às falas de Cid. Assim como o senador, o prefeito e o ex-prefeito adotaram um tom apaziguador.
Logo na chegada ao local, Sarto reforçou que a relação com Cid "está ótima" e que tem focado em “fazer a gestão”. Sobre o principal impasse no partido – entre fazer ou não oposição ao Governo Elmano nos legislativos estadual e federal –, o político foi cauteloso e defendeu que os correligionários dêem tempo “para maturar, sedimentar mágoas de parte a parte”.
"O que defendi foi que nós temos que ter, independente de qualquer coisa, relação institucional e administrativa, sou prefeito de Fortaleza, meu partido é Fortaleza e depois é o PDT. Então como sou prefeito de Fortaleza e Elmano é governador do Ceará, Fortaleza é a capital do Ceará"
Sarto, inclusive, fez referência à mesma analogia usada por Cid mais cedo em relação às divergências internas no PT.
“Há de ter respeito mútuo entre posições (internas) divergentes porque não é dogma, aqui estamos para construir opiniões de consensos. A gente precisa colocar contrapontos desde que sejam embasados”, defendeu.
Na mesma linha seguiu o ex-prefeito Roberto Cláudio, atualmente, o principal nome de oposição interna a Cid na cúpula do PDT.
O ex-mandatário reforçou que "não é alimentando futrica (intrigas) publicamente" que o partido conseguirá construir uma convergência. Roberto Cláudio, assim como seu sucessor na Prefeitura, disse que "o tempo, a paciência e a franqueza" levarão a um consenso.
"Este é o cenário que está aí no PDT. A melhor solução para isso é a gente praticar e entender que o tempo, a paciência e a franqueza serão os melhores instrumentos para a gente poder chegar a maior convergência possível dentro do partido. Dar tempo ao tempo, exercer a paciência e ser franco no que pensa são os caminhos para que a gente possa construir, ao longo do tempo, a maior convergência com isso. Eu estou muito paciente"
Ele ainda reforçou que, apesar de ter optado por fazer uma “oposição construtiva” ao Governo Elmano, segue respeitando quem, “dentro do partido, imagina que o caminho é aderir ao governo, é seguir com o governo".
Escalada da crise
Entre as declarações de Cid na última terça-feira e a mudança de tom das lideranças petistas nesta quinta, a crise interna no partido atingiu seu ápice. Na quarta-feira (1º), pelo menos oito vereadores da Capital, inclusive do próprio PDT, usaram a tribuna da Câmara para atacar Cid, questionando desde a relação do ex-governador com a Capital à saúde e vitalidade dele.
Um dos parlamentares que puxou coro contra o senador foi o próprio líder do Governo Sarto, Carlos Mesquita (PDT).
"Roberto Cláudio foi trucidado por eles e outros mais. Cid está quebrando o PDT na Assembleia e quer quebrar em Fortaleza e na Câmara Municipal, mas não vai", disse. Vereadores como Lúcio Bruno (PDT), Paulo Martins (PDT) e Didi Mangueira (PDT) também contra-atacaram Cid.
No Legislativo Municipal, a situação é ainda mais tensa, já que uma ala do partido na Casa passou a criticar diretamente o prefeito de Fortaleza. Júlio Brizzi e Enfermeira Ana Paula, ambos do PDT, agora integram um bloco independente, ao lado de Léo Couto (PSB), Danilo Lopes (Avante). O quarteto deixou a base da Prefeitura após discordâncias sobre matérias enviadas pelo Executivo, especialmente a Taxa do Lixo.
A crise respingou ainda na Assembleia Legislativa do Ceará (Alece), onde a ampla maioria dos pedetistas é aliada de Elmano. Apenas Cláudio Pinho (PDT), Queiroz Filho (PDT) e Antônio Henrique (PDT) têm divergido dos correligionários em algumas votações.
Ainda na quarta-feira, foi a vez do presidente da Alece, deputado Evandro Leitão (PDT), dizer que o PDT faz parte da base do Governo, ainda que a Executiva do partido não tenha declarado isso oficialmente.
"Nós somos 13 deputados estaduais e nós temos 10 deputados estaduais que fazem parte da base do Governo. Eu, particularmente, acho que esse vácuo de um não-encaminhamento termina dando espaço para compreensões diversas. A minha compreensão é que o PDT faz parte da base do Governo Elmano de Freitas. E não só a minha, mas a dos nove deputados dos 13 que nós somos – além da ampla maioria de prefeitos do PDT que querem e que estão na base do governador Elmano de Freitas", disse.
As falas, tanto na Câmara quanto na Assembleia, que endossaram a crise, ocorreram um dia antes da mudança de tom de Cid, Sarto e Roberto Cláudio.