Silvia Lima, de 59 anos, vive desde os 10 anos na comunidade do Bom Sucesso, em Quixeré, localizada a cerca de 195 km de Fortaleza. Ali, testemunhou profundas transformações na região, marcadas pela chegada de indústrias, pelo aumento da poluição e pelo êxodo populacional em busca de melhores oportunidades de trabalho e qualidade de vida.
A comunidade foi ficando com uma nova cara, mas o que não mudou até hoje é a estrada de barro que dá acesso a ela. Esse tipo de contradição a motivou a pensar na mobilização social como forma de preservar o território e sua história, mas também a fez sonhar em criar uma comunidade modelo.
“Já fomos maiores. Com a chegada do progresso, coisas ruins também vieram: poeiras, barulhos de explosões da indústria e pessoas vendendo suas casas. Decidimos, então, parar de brigar e usar o diálogo para termos uma convivência melhor com as empresas e conseguir fazer com que também tragam as coisas boas", disse.
Atualmente, estima-se que o Bom Sucesso conte com cerca de 60 casas e 200 moradores.
Um novo começo
Com a liderança de Silvia, a comunidade estabeleceu, em 2017, uma parceria com a Companhia Industrial Cimento Apodi para buscar soluções para os problemas causados pela fábrica instalada na região. Em resposta, segundo ela, a cimenteira conseguiu reverter a emissão de poeira e do ruído.
"Foi criado um comitê de sustentabilidade, com reuniões a cada três meses, para a implementação de ações específicas. A relação com a empresa evoluiu: antes, não tínhamos contato direto, mas atualmente posso ligar para o gerente ou até mesmo com o presidente quando necessário", relatou.
Em 2022, a Associação Comunitária Padre Abdon Valério de Bom Sucesso e Baixa do Félix (ACOPAVABBF) deixou de improvisar as reuniões na escola do bairro e inaugurou sua própria sede, com investimento de aproximadamente R$ 500 mil por parte da fábrica de cimentos.
Agora, a entidade possui autonomia para se mobilizar com uma organização mais eficiente.
Ação de geração de renda beneficia, sobretudo, mulheres
No espaço, são realizadas também ações culturais e de capacitação gratuitas, como o projeto Florescer Quixeré, voltado para formar empreendedoras. "A maioria dessas mulheres era dona de casa. Agora, eles conseguem se planejar para ter uma renda e pensar em crescer mais na frente”, explicou.
O curso beneficia cerca de 25 participantes por oficina, a maioria acima de 35 anos. As aulas, iniciadas em 6 de dezembro, têm como objetivo capacitar as participantes por meio de um programa abrangente de formação, composto por 22 módulos e uma carga horária total de 144 horas, ministradas por professores da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (Uern). A conclusão está prevista para junho de 2025.
Para Hilberto Feitosa, diretor industrial da Apodi, o projeto "Florescer Quixeré é uma iniciativa que reafirma o compromisso da empresa com o desenvolvimento das comunidades onde estão presente, gerando oportunidades e fortalecendo a economia local".
Há outros três projetos tocados pela Apodi nessa região. São eles:
- Construindo o Saber: programa gratuito de educação para jovens e adultos, com foco na conclusão do Ensino Fundamental e Médio, beneficiando já mais de 357 pessoas em diversas localidades;
- Jovens Transformadores: parceria com o Senai para qualificar jovens para o mercado de trabalho, com foco em competências técnicas e comportamentais para a indústria cimenteira;
- UniApodi: universidade corporativa que oferece um portfólio completo de desenvolvimento profissional para os funcionários da empresa, abrangendo áreas técnicas e comportamentais. Segundo a líder comunitária, grande parte dos moradores trabalha na fábrica.
O sonho de fazer uma comunidade modelo para o Ceará
Silvia, que também é dona de um pequeno restaurante no local há 12 anos, inicialmente não demonstrava interesse em assumir uma posição de liderança comunitária. Contudo, há oito anos, após participar de conversas com a Apodi e receber o apoio necessário, concordou em representar a comunidade.
Para ela, a força da união comunitária é fundamental para o sucesso com essa e outras empresas do entorno.
"Juntos, temos a essência de abraçar as melhorias para todos nós. Temos a capacidade de mobilizar a população, de atrair voluntários e de tomar iniciativas. Quando necessário, e quando o poder público não atende às nossas demandas, nós nos reunimos, em um grupo de 80 a 100 pessoas, e colocamos a mão na obra. Meu sonho é transformar essa comunidade em um espelho para outras", observou.
Sobre a melhoria na estrada de acesso à comunidade, citada no início deste texto, a Apodi disse que pavimentou uma parte há dois anos. No Comitê da Empresa, informou, isso tem sido discutido junto à Prefeitura e com os moradores.
A responsabilidade de garantir infraestrutura básica, como pavimentar e asfaltar ruas, é das prefeituras. A coluna, solicitou, por meio do canal online oficial de comunicação da gestão municipal, um posicionamento sobre o caso. Quando respostas forem enviadas, esta matéria será atualizada.
Cooperação para transformar
O caso em questão mostra a importância da participação comunitária, mas como um complemento às iniciativas dos setores público e privado, buscando a construção de uma sociedade mais justa e sustentável. O relatório de sustentabilidade da empresa, por sua vez, é um exemplo a ser seguido.
>> Leia o relatório da empresa de 2023
No que diz respeito à redução da poeira e do ruído, a Apodi afirma ter implementado cinco ações:
- Análise de Gases: monitoramento constante das emissões através de analisador de gases instalado no forno;
- Aparelhos Raivol: utilização de dois aparelhos Raivol para monitoramento contínuo da qualidade do ar na unidade e na comunidade;
- Análises Semestrais: realização de análises semestrais em pontos estratégicos para avaliar a qualidade do ar;
- Estudo de Dispersão de Gases: estudo detalhado sobre a dispersão de gases na fábrica, com foco na concentração próxima aos moinhos;
- Filtros de Manga: implementação de filtros de manga em pontos estratégicos para captura e filtragem de particulados.
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