Alertas de doenças associadas a vacinas contra Covid não invalidam imunização, dizem especialistas

Médicas defendem que alertas são medidas de precaução, e somente vacinação coletiva permitirá contenção da doença

A maior celeridade no ritmo de vacinação contra a Covid-19 no Ceará já se reflete na queda do índice de infecção e, consequentemente, em menores taxas de internação em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) e de mortalidade pela doença. Apesar da melhora no cenário pandêmico, alguns alertas sobre os imunizantes disponíveis no Brasil ainda preocupam a população.  

O mais recente foi emitido pela agência reguladora de medicamentos dos Estados Unidos, Food and Drug Administration (FDA), que atribuiu um "aumento do risco" de desenvolvimento da síndrome de Guillain-Barré a pessoas recém-vacinadas com o imunizante da Janssen. Em abril, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) também alertou que a vacina AstraZeneca poderia ter “um vínculo” com casos de trombose reportados após a aplicação do fármaco. 

Apesar dos registros de doenças associadas às vacinas, os laboratórios garantem se tratar de episódios raros. Até terça-feira (13), foram 100 relatos preliminares de Guillain-Barré em um universo de 12,8 milhões de imunizados com a Janssen. De um total de 18,1 milhões de doses de AstraZeneca administradas no Reino Unido, até 24 março, houve 30 casos e sete mortes decorrentes de trombose atípica. 

Especialistas consultadas pelo Diário do Nordeste confirmam a baixa ocorrência, e defendem que os benefícios dos imunizantes contra o coronavírus e suas variantes se sobrepõem a qualquer risco raro de evento adverso.  

'O benefício supera o risco'

Médica infectologista do Hospital São José e integrante do Coletivo Rebento de Médicos e Médicas em defesa da Ética, da Ciência e do SUS, Mariana Moura Fé frisa que a administração de todo e qualquer medicamento existente, inclusive as vacinas, pode gerar efeitos colaterais. 

"Se você tem uma dor de cabeça, você não vai ficar com a dor de cabeça até a dor passar com medo do remédio. É óbvio que nós temos que usar racionalmente as vacinas e os remédios, mas a ciência evoluiu de forma que os remédios e as vacinas são desenvolvidos pra benefício da humanidade, pra livrar a humanidade das doenças que nos afligem. O benefício supera o risco”, afirma a médica.   

Ela esclarece que os alertas não são feitos para provocar pânico na população ou descrédito quanto aos benefícios das vacinas. Sinalizam que a comunidade científica e os órgãos do sistema de saúde estão atentos para um eventual ajuste de recomendação.  

“Esses alertas servem para nos mostrar que a comunidade científica está de olho, está atenta para ajustar as recomendações para a melhor vacina possível, para a condição mais segura possível, mas nunca, jamais de dizer que a vacina faz mal, que não é para tomar", diz, apontando como exemplo a mudança nas regras de vacinação das gestantes.  

De acordo com a infectologista, todas as vacinas autorizadas para uso no Brasil, sejam contra Covid-19 ou não, são “bastante seguras e eficazes” porque passam, obrigatoriamente, por avaliações rigorosas por parte da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Como os imunizantes contra Covid foram produzidos em tempo recorde, é normal haver uma maior vigilância.

Imunização coletiva para conter o vírus 

Para um País que já perdeu mais de 537 mil pessoas desde o início da pandemia, pondera Mariana, a aplicação das vacinas contra o vírus se torna urgente, vital. “Diante desse contexto, um risco de uma reação adversa rara não se compara ao benefício de uma vacina que nos protege de uma doença que está nos afligindo tanto”. 

A única forma de conter a doença, indica a especialista, é através da vacinação em massa. “Eu não me vacino somente para me proteger, mas também pra proteger o próximo porque só teremos uma redução importante de morte, de circulação de vírus, se a maior parte da população” estiver vacinada. 

"O Covid pode colocar muito mais gravidade, mortalidade, hospitalizações, [do que] ter um raro evento adverso. No final das contas, vale muito mais a pena a vacinação para que se evite a doença. Vacina boa é a vacina no braço”, corrobora a médica imunologista e membro do Departamento Científico de Imunização da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) Ana Karolina Barreto Marinho.

Assim como Mariana Moura Fé, Ana Karolina entende os alertas realizados pelos laboratórios como necessários, pois sinais e sintomas de eventos raros poderão ser identificados com rapidez e tratados com eficácia somente se forem previamente conhecidos. 

“É importante que as autoridades fiquem alerta e coloquem isso realmente em bula ou como uma observação porque é um produto novo. A gente tem uma vigilância pós-comercialização que vai durar muitos anos". 

Ainda não é possível atrelar eventos adversos a vacinas

Segundo a médica imunologista, apesar dos casos de doença reportados, não é possível atrelar, automaticamente, determinados eventos adversos às vacinas.

“É muito cedo pra gente dizer se a síndrome [de Guillain-Barré] ou a trombose estão relacionadas a características genéticas ou a características da plataforma vacinal. No caso da Janssen, é por causa de adenovírus, que é o vetor viral? É por causa de algum adjuvante, por alguma substância que compõe a vacina? A gente ainda não sabe qual gatilho da vacina poderia desencadear esses eventos nas pessoas". 

Ana Karolina lembra que as vacinas contra a Covid-19 são “produtos novos”, recém-desenvolvidos. Portanto, tais perguntas serão respondidas somente após uma análise sistemática de mais casos e do desenvolvimento de estudos, ao longo dos próximos meses ou ano.  

"Talvez no ano que vem, quando tiver numa outra fase de vacinação, a gente possa determinar quais são as vacinas mais seguras, mais eficazes, de acordo com a faixa etária, com as comorbidades e com aquele país, com aquela população”. 

Enquanto isso, considera precoce cravar se determinados efeitos adversos ocorrerão sempre nas pessoas que tiverem acesso aos mesmos imunizantes. Ou se eventos do tipo estão ligados à predisposição individual ou a fatores de risco como a idade. Isso, inclusive, torna inútil as escolhas por imunizantes recentemente empreendidas pelos chamados "sommeliers de vacinas"

“Principalmente falando da Guillain-Barré, que é uma doença autoimune, neurológica. No passado, a gente já viu, por exemplo, reportes de síndrome de Guillain-Barré após a vacina contra Influenza”.

Avanço na campanha de vacinação 

Com o avanço da Campanha Nacional de Vacinação, a média móvel de mortes no Brasil vem caindo nos últimos meses. Até 11h29 desta quinta-feira (15), o Ministério da Saúde contabilizava a aplicação de 118.886.610 doses em todo o País.

O Ceará já se aproxima da marca de 5 milhões de doses aplicadas. Até as 17h desta quarta-feira (14), a Secretaria da Saúde do Estado (Sesa) somava 4.992.922, sendo 3.602.679 primeiras doses (D1), 1.253.007 segundas doses (D2) e 137.236 doses únicas (DU). 

Desde a semana epidemiológica 19, de 9 a 15 de maio de 2021, o Estado vem registrando uma queda exponencial no número de casos confirmados de Covid-19. O período coincide com o início da 3ª fase da vacinação em Fortaleza.   

Conforme dados da plataforma IntegraSUS, atualizada diariamente pela Sesa, a semana 19 somou 33.411 diagnósticos positivos da doença, enquanto que na semana 27, encerrada em 10 de julho, foram 3.710. Comparando uma semana com a outra, houve queda de 88,89% na quantidade total de casos.  

Como informar reações adversas aos imunizantes:

A Sesa orienta que a população procure os serviços de saúde e comunique as secretarias municipais de Saúde sobre reações após a aplicação da vacina. Todos os eventos adversos são reportados pelos órgãos ao sistema de notificação do Ministério da Saúde (MS), o e-SUS.

As reações adversas aos imunizantes também podem ser reportadas ao Plantão Coronavírus, disponibilizado pela Sesa no número (85) 9 8439-0647 (WhatsApp). O telefone funciona 24 horas, aos fins de semana e feriados.