Homicídio, tráfico e motim; dobra número de policiais, bombeiros e agentes da Pefoce expulsos no CE

Os servidores foram expulsos ou demitidos pela Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário (CGD), em 2021. A maior parte é formada por policiais militares

Cresce o número de policiais, bombeiros e servidores da Pefoce demitidos ou expulsos pela Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário do Ceará (CGD). Só em 2021, foram 33 servidores destas áreas excluídos dos quadros. Comparado ao ano de 2020, com 16 sanções máximas aplicadas, o índice mais do que dobrou.

A maior parte das 33 demissões ou expulsões no ano passado é referente a casos que envolvem policiais militares. Foram 20 PMs, dois bombeiros, três policiais civis, seis policiais penais e dois servidores da Perícia Forense do Ceará (Pefoce) excluídos após investigação que comprovou cometimento de crimes, indo desde participação em homicídio até o acúmulo ilegal de cargos.

Chama a atenção o envolvimento de policiais e bombeiros em casos de estupro, tráfico e extorsão. A reportagem levantou parte dos casos que culminaram a aplicação da sanção máxima por parte da Controladoria e concluiu que, comumente, demitidos e expulsos no ano de 2021 eram investigados por crimes cometidos em anos anteriores, como o caso de um bombeiro suspeito de estupro desde 2005.

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Um subtenente do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará foi demitido em novembro do ano passado devido a um estupro de vulnerável. Foram mais de 16 anos entre o crime e a publicação da decisão no Diário Oficial do Estado.

Quando divulgada a decisão, a CGD destacou que a demissão veio após condenação em 2º grau no Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) do acusado. Criminalmente, o subtenente foi condenado a pena definitiva de sete anos e seis meses de reclusão. O militar, de nome preservado na tentativa de resguardar a identidade da vítima, esteve no serviço ativo por quase 30 anos.

A sanção de demissão é aplicada apenas aos servidores civis. Já conforme o Código Disciplinar da Polícia Militar do Ceará e do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Ceará, para esta categoria pode haver demissão (artigo 23) ou expulsão (artigo 24).

No caso da expulsão, ela é aplicada mediante a um processo regular no qual o servidor tenha atentado contra a segurança das instituições nacionais ou praticado atos desonrosos ou ofensivos ao decoro profissional, como  "a participação em greve ou em passeatas, com uso de arma, ainda que por parte de terceiros".

Outro caso de um militar demitido pela CGD devido a estupro envolveu um subtenente da PMCE e suas duas entendas enquanto vítimas. A ocorrência foi registrada em 2016 e a punição administrativa aplicada em março de 2021. Conforme o levantamento publicado no DOE, os abusos foram cometidos por quase oito anos consecutivos.

A socióloga da Rede de Observatórios da Segurança, Ana Letícia Lins, pontua que é importante levar em consideração o tempo até que um servidor seja responsabilizado. Para a especialista, quando analisam os casos de conhecimento público das vítimas de crimes como morte por intervenção policial, "os militares em sua maioria estão afastados das ruas, mas o caso ainda tramita na Justiça criminal".

"Ainda que seja um número grande se comparado ao ano anterior não expressa de fato a necessidade de acesso à Justiça que mães e familiares de vítimas de ação policial têm direito"
Ana Letícia Lins
Socióloga

 

ENVOLVIDOS NO MOTIM

As estatísticas da CGD indicam que as punições devido ao motim protagonizado por centenas de militares interferem na disparada das expulsões. Até então são seis policiais e um bombeiro retirados das Corporações sob acusação de participarem do movimento grevista.

Em junho de 2021 foi demitido o primeiro PM por este motivo. Raylan Kadio Augusto de Oliveira tinha apenas um ano e oito meses de serviço ativo na PMCE quando, segundo a publicação no Diário Oficial, o soldado se juntou aos militares amotinados no Quartel do 18º BPM, no Bairro Antônio Bezerra. 

Para a CGD, a conduta do policial militar, é tipificada no crime de revolta tendo ele desrespeitado normas e a ordem. "O comportamento do acusado mostrou-se incompatível com o que se espera de um profissional inclinado para a missão da Segurança Pública, tendo em vista o seu manifesto descompromisso com a função inerente ao seu honroso cargo", considera a Controladoria acerca dos comprovadamente envolvidos no motim.

1.012 arquivamentos
Somados os anos de 2019, 2020 e 2021, a CGD arquivou 1.012 processos avaliados. Destes, 350 foram no ano passado


Uma das mais recentes expulsões atrelada ao motim e que repercutiu na mídia foi a do PM Flávio Alves Sabino, o Cabo Sabino. A decisão publicada no último mês de dezembro considerou que  "Sabino liderou um grupo de policiais que se concentraram no 18º Batalhão de Polícia Militar, no bairro Antônio Bezerra. Além disso, conforme apontado pelo Ministério Público Militar na denúncia, por decorrência do motim houve um aumento de 178% de crimes violentos letais e intencionais.

Ana Letícia acredita na estreita ligação entre o aumento das expulsões e a situação do motim e destaca: "depois do motim houve uma série de medidas do Governo do Estado pra assumir um controle novamente sob a corporação. É uma situação que se tem responsabilização dos envolvidos no movimento, mas esse número deveria ser muito maior se outros policiais não tivessem sido absolvidos da participação no movimento".



ESQUEMA DE EXTORSÃO

Dois seis policiais penais retirados do Sistema Penitenciário em 2021, três foram por acúmulo ilegal de cargos, um por transação ilícita e dois por extorsão. A reportagem apurou que o caso de extorsão envolveu como vítima um terceiro policial penal.

Valdemiro Barbosa Lima Júnior e Natanael Eduardo de Andrade Lima foram demitidos pela CGD no mês de agosto por extorquir um servidor e cobrarem dele R$ 11 mil. A dupla ameaçava divulgar imagens da esposa do colega de profissão em uma relação extraconjugal, segundo as investigações.

De acordo com o órgão controlador, a extorsão ocorreu no dia 26 de abril de 2016.

Além de cobrarem o pagamento de R$ 11 mil, Valdemiro Barbosa e Natanael Andrade teriam exigido que o servidor convencesse outro policial penal de retirar uma ação trabalhista contra o Sindicato, em um prazo de 24 horas.

A vítima da suposta extorsão, que ocupava um cargo de direção na antiga Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus), denunciou o caso à Delegacia de Assuntos Internos (DAI). Na época, Valdemiro presidia o Sindicato da Categoria. Ele alegou ser vítima de perseguição e não concordar com a decisão da Controladoria.