O fim da parceria histórica entre PT e PDT no Ceará obrigou candidatos ao Legislativo que, ainda na pré-campanha, contavam com a união do grupo e com o peso dos principais líderes para garantir a reeleição, a mudarem de estratégia eleitoral e realinhar o discurso para conquistar o voto do eleitor.
O racha dos partidos colocou em oposição aliados do presidenciável Ciro Gomes (PDT), principal fiador da candidatura ao Governo de Roberto Cláudio (PDT), e do ex-governador Camilo Santana (PT), que lançou ao Governo o deputado Elmano de Freitas (PT). Com duas candidaturas ao Governo do Estado separando o grupo que antes era aliado, candidatos relatam o cenário como “desconfortável”.
“Eu acredito que ninguém trabalhava com esse cenário”, analisa o cientista político Cleyton Monte, professor da Universidade Estadual do Ceará (UECE), que classifica o rompimento como um ponto fora da curva, obrigando os postulantes a traçarem “uma nova rota” na campanha.
Antes do racha, o entendimento nos bastidores era de que haveria uma saída para o impasse no acirramento entre Roberto Cláudio e a governadora Izolda Cela pela indicação do PDT. Dessa forma, as chapas para o Poder Legislativo, tanto no PDT, como nos partidos aliados, como o próprio PT, poderiam contar com a presença de lideranças importantes para atrair votos, como o ex-governador Camilo Santana e o senador Cid Gomes (PDT).
A crise, no entanto, modificou os planos. “Todo mundo que integra a aliança, de uma forma ou de outra construiu sua estratégia partindo do princípio de que haveria uma solução [...] Isso muda radicalmente a reação com as bases e com o governo”, ressalta Cleyton.
Atenção a infidelidades
“Muito desconfortável essa situação. O acordo é que nós votaríamos no Camilo para senador”, exemplifica o deputado federal Eduardo Bismark (PDT) que, após o racha, integra a chapa encabeçada por Roberto Cláudio, tendo como candidato ao Senado a deputada estadual Érika Amorim (PSD).
O parlamentar, no entanto, culpa o Partido dos Trabalhadores pela situação, uma vez que o PT preferiu lançar a candidatura de Elmano de Freitas ao Executivo.
Tanto o deputado quanto o seu pai, o prefeito de Aracati, Bismarck Maia (PDT), integraram a base do Governo Camilo nos últimos anos, e contavam com a imagem política do ex-governador para renovação do mandato do parlamentar na Câmara Federal.
“Um prejuízo que vai recair sobre a própria chapa nossa de deputado, onde nós vamos ter uma diminuição de mandatos, com toda certeza, em função de não estarmos unidos como foi combinado desde o início”, avalia ainda o deputado.
Para Bismarck, os deputados do PDT que não estão fazendo campanha para Roberto Cláudio “estão prejudicando o próprio partido”.
A divisão de palanques resultou em desfiliações de prefeitos, principalmente do PDT, para apoiar outros partidos, o que também impacta nas alianças formadas por parlamentares nos municípios.
"O que a gente pode fazer? A maioria deles pediu licença ou se desfiliou, a questão são os deputados, que o diretório nacional tem uma comissão justamente para avaliar a infidelidade", disse o presidente estadual do PDT, deputado André Figueiredo.
"As pessoas sabem que a fidelidade partidária é um princípio legal da lei e do estatuto do partido, esperamos que todos tenham esse princípio de fidelidade. Quem não tiver vai ter que assumir os ônus dos seus atos", disse o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, durante evento em Fortaleza.
'Impacto mínimo'
André Figueiredo, no entanto, minimiza prejuízos. “Evidentemente aqui ou acolá existe algum tipo de rusga, mas o impacto foi mínimo”, avalia o parlamentar.
Já o petista José Airton Cirilio vê a cisão entre os partidos como um fator positivo. Juntamente com a deputada federal Luizianne Lins, o parlamentar foi um dos primeiros defensores de que o PT deveria ter uma candidatura própria.
"Em função do apelo da campanha do Lula e da força do Camilo e da importância da candidatura do PT para Governo com Elmano, isso vai fortalece muito e nós vamos ampliar a nossa bancada", diz.
Integrante do PSD, que completa a chapa do PDT lançando Domingos Filho como candidato a vice-governador, o deputado estadual Fernando Hugo avalia que “toda e qualquer cisão política deixa sequelas”, mas minimiza os efeitos disso na sua campanha.
“Não temos necessidade alguma de criticar outras proposituras políticas que aí estão", complementa.
Fator Cid Gomes
Longe da disputa pelo Governo do Estado e tido como um dos históricos articuladores do grupo, o senador Cid Gomes, de acordo com a análise dos especialistas, é um fator determinante e que, uma vez fora da articulação, poderia prejudicar o desempenho dos próprios parlamentares.
Pesquisadora do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia da Universidade Federal do Ceará (Lepem/UFC), Paula Vieira aposta na presença de Cid na campanha do PDT como compensatória da perda da imagem de Camilo.
"Como pedetistas não podem ter o uso da imagem do Camilo, eles vão buscar imagens que possam agregar algum capital político. A mudança pode ser trazer o Cid Gomes pra campanha", avalia.
Cid, no entanto, está ausente da disputa eleitoral há meses. Ele não se pronunciou sobre o impasse no PDT nem participou de eventos públicos do partido. No início de abril, uma das últimas aparições de Cid foi em reuniões com aliados na Assembleia Legislativa do Ceará (AL-CE) para discutir a formação da chapa de deputados estaduais e federais do Ceará.
O sumiço do senador tem gerado desgastes na família, inclusive com as declarações do irmão mais novo, o prefeito de Sobral, Ivo Gomes (PDT), de que não fará campanha para o PDT e de que seu candidato ao Senado é Camilo.
Ciro Gomes, durante inauguração de seu comitê de campanha em Fortaleza neste domingo (21), ao lado de Roberto Cláudio, falou sobre a ausência dos irmãos.“Eu peço que você compreenda, não tenho a menor vontade de comentar esse tipo de assunto, me faz mal, dói no meu coração”, declarou ao Diário do Nordeste.
"O peso da ausência de Cid é significativo, ele é um articulador do interior do Estado. Muito mais do que uma foto, ele costura aliança com prefeitos principalmente na região norte do Estado. Então a ausência vai prejudicar bastante a construção", diz ainda Cleyton Monte.