Municípios e Estado se unem para frear avanço da Covid-19 no Ceará e cobrar o Governo Federal

Com a chegada da segunda onda no Estado, Executivo decreta medidas restritivas para reduzir contágio da população. Paralelamente, Legislativo abre caminho para que medidas de contenção da pandemia ganhem celeridade

Em meio ao alerta do crescente número de casos e mortes por Covid-19 no Ceará, municípios e Estado fortalecem articulação para encarar novo momento crítico da doença e pressionar Governo Federal por ações assistenciais e envio de novos lotes de vacina. Na última semana, o governador Camilo Santana (PT) reuniu 170 prefeitos e pediu apoio às medidas restritivas. Paralelamente, a Assembleia Legislativa do Ceará (AL-CE) prorrogou o estado de calamidade em 11 municípios – incluindo a Capital. 

“É importante que a gente compartilhe experiências e, acima de tudo, que unifique o discurso da importância de preservar a vida, seguindo a orientação das autoridades sanitárias. Esse é o caminho para combater a pandemia, cumprindo o isolamento, evitando aglomerações, usando máscara, higienizando as mãos”, alertou o governador durante a reunião virtual com os gestores, na quinta-feira (18).

No dia anterior, o chefe do Executivo estadual anunciou uma série de ações para conter a circulação de pessoas nas ruas. Ele estabeleceu, entre outras medidas, toque de recolher das 22h às 5h em todo o Ceará. A decisão vale até o dia 28 de fevereiro. Outra medida é a suspensão das aulas presenciais em escolas e universidades públicas e privadas. E todos os espaços públicos fecharão às 17h. Paralelamente, até o fim deste mês, a rede estadual de saúde será ampliada, chegando a 703 leitos de terapia intensiva exclusivos para o tratamento de pacientes com Covid-19.

As ações do governador ocorrem no momento em que os municípios começam a refazer mobilização para frear a pandemia. No encontro, o prefeito de Fortaleza, José Sarto (PDT), também pediu discurso alinhado entre os colegas. “É importante que a gente compartilhe experiências e, acima de tudo, que unifique o discurso da importância de preservar a vida, seguindo a orientação das autoridades sanitárias'', reforçou.

Para Francisco Moreira Ribeiro, professor de ciências políticas na Universidade de Fortaleza (Unifor), a atuação de gestores públicos tomando como base o que orienta a ciência indica senso de responsabilidade. “São ações que trazem incômodos, reclamações e revoltas. Politicamente, não se tem ganhos, seria mais fácil deixar as pessoas livres, mas isso não dá certo porque há o crescimento da pandemia”, avalia. 

Cobranças

Na última semana, os governadores brasileiros se reuniram com o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, para cobrar o envio de novas doses de vacina para os estados. "Estamos recebendo as vacinas e imediatamente repassando aos municípios, mas ainda é muito pouco, por isso aguardamos que os envios de novos lotes e o calendário de vacinação prometido pelo ministério da saúde sejam cumpridos", disse o governador petista.

A cobrança também partiu, na última sexta-feira (19), da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), que se reuniu com Pazuello. O presidente da instituição, Jonas Donizette (PSB), mostrou insatisfação com a  decisão da Pasta de mudar o critério do pagamento de leitos de UTI abertos por estados e municípios. A intenção, segundo o prefeito, é pagar apenas pelos que estiverem ocupados.

"Isso é ruim porque o primeiro critério para a abertura da economia é o número de leitos de UTI disponíveis. Se ele for pagar só pelo leito que tem pessoa deitada, vai contra esse critério. Então, nós pedimos uma reavaliação, que seja feito pelo menos um escalonamento: paga-se cheio o leito que está ocupado e paga-se, por exemplo, 70% do que está reservado, disponível", disse Donizette.

A Frente de Prefeitos ainda cobrou o ministro pelo envio de vacinas. Segundo o Ministério da Saúde, 4,7 milhões de doses do imunizante devem ser liberadas aos estados e municípios nesta semana. 

De acordo com o cientista político Francisco Moreira Ribeiro, a pressão que prefeitos e governadores passaram a fazer no Governo Federal é resultado de um vácuo deixado nacionalmente. “Essas articulações nascem em função da ausência de articulação do Governo Federal. Na prática, a política brasileira foi sempre muito centralizada, com decisões que partiam do Governo Federal. Agora, o Governo vai a reboque da pressão dos governadores, que agem na medida em que não há atuação efetiva do Governo Federal”, avalia. 

Para Josênio Parente, cientista político e professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece), a disputa de forças na pandemia evidencia ainda mais a importância da política em momentos de crise. “A política deveria ser a busca pelo bem comum, mas é uma correlação de forças. O presidente tem força, mas outra parte fica com a oposição, então é um poder relativo, daí a divisão de poderes, que obriga a quem manda também obedecer. Na prática, um poder controla o outro”, explica. 

Calamidade pública

No Ceará, o Legislativo tem feito articulações para dar celeridade às ações de contenção da pandemia. Na última sessão ordinária da Assembleia, os deputados estaduais estenderam o prazo de calamidade pública até junho de 2021 para Fortaleza, Antonia do Norte, Cariús, Catunda, Fortim, Ibiapina, Jaguaretama, Jucás, Maracanaú, Santana do Acaraú e Tarrafas. 

Na prática, a autorização permite que os municípios não precisem seguir prazos de prestação de contas e limites de gastos na Lei de Responsabilidade Fiscal. Esses gestores também podem aumentar gastos públicos nos próximos meses e ficam protegidos de eventuais enquadramentos por irregularidades fiscais. No ano passado, 174 dos 184 municípios cearenses decretaram calamidade pública por causa da pandemia.

Atendendo a uma proposta do governador, os parlamentares aprovaram ainda, na última quinta-feira (18), medidas de assistência ao setor de eventos, incluindo a concessão de um auxílio financeiro de R$ 1 mil aos profissionais da área. Outra medida aprovada pelos deputados foi a isenção de taxas do setor de eventos por seis meses para a realização de eventos em equipamentos culturais do Estado, quando o retorno das atividades da área for liberado. 

Além das ações externas, a Casa também passa por mudanças internas diante da segunda onda de Covid-19. Entre as ações, foi suspenso o atendimento ao público pelos órgãos da Assembleia. As ações plenárias também passam a ser realizadas de forma híbrida, com a recomendação de reduzir a presença no plenário. Solenidades e homenagens foram suspensas.

“Estamos em um quadro muito próximo ao que tivemos no pico da pandemia, que ocorreu em abril do ano passado. Por isso é de grande importância respeitarmos essas recomendações do Governo do Estado, que tem como principal objetivo salvar vidas”, disse o presidente da Casa, Evandro Leitão (PDT).

Câmara dos Deputados

Em Brasília, o novo coordenador da bancada cearense, Genecias Noronha (SD), já colocou a saúde como assunto que será priorizado nas articulações com o Governo Federal. Na próxima quarta-feira (24), ele deve comandar uma reunião com os parlamentares do Estado para decidir o destino de R$ 241 milhões em emendas da bancada. 

“Eu defendo que a metade vá para a construção do Hospital Universitário do Ceará. A outra metade fica de acordo com o interesse deles. Cada deputado terá R$ 8 milhões, caso metade vá para o Estado, ainda sobram R$ 4 milhões para os municípios”, disse. 

"O Ceará é um estado pobre e depende do Governo Federal. Quero ajudar o nosso Estado e o governador com os pleitos do Ceará. Vivemos nesse momento de crise, crise da Saúde e unir a bancada é o principal", acrescentou.

Judiciário

Além do Executivo e do Legislativo, o Judiciário cearense também passa por mudanças diante do avanço da pandemia. O Tribunal de Justiça do Ceará decidiu prorrogar o trabalho remoto obrigatório até 31 de maio. Magistrados, servidores, estagiários e demais colaboradores continuam atuando por teletrabalho.

Na Câmara de Fortaleza, um projeto da Mesa Diretora que restringia o número de vereadores em plenário, aumentava o número de sessões e estabelecia votação remota foi alvo de polêmica já na primeira sessão deliberativa da Casa, no último dia 2. As medidas começaram a ser aplicadas na Casa antes mesmo de terem sido votadas, o que foi motivo de queixa da oposição. 

A proposta acabou sendo aprovada com modificações por emendas coletivas, obrigando a presença obrigatória no plenário ou nas dependências da Casa para votações de matérias que tratem sobre: Lei Orgânica, Plano Diretor, Uso e Ocupação do Solo, Códigos da Cidade e Tributário, Sistema Previdenciário, LDO, LOA, entre outras. Além disso, as sessões ficaram às terças, quartas e quintas, no formato híbrido, com até 20 vereadores em plenário.