Pelo menos 110 casos da variante Delta (B.1.671.2) do novo coronavírus foram confirmados no Brasil, com cinco deles evoluindo para óbito, até segunda-feira (19). Diante disso, cresce a preocupação de que a cepa indiana invada o Ceará e volte a elevar os índices de infecção e mortes pela Covid-19, impulsionando a formação de uma terceira onda pandêmica.
Em nota enviada ao Diário do Nordeste, a Secretaria da Saúde do Estado (Sesa) garantiu não existir caso suspeito ou confirmado da variante Delta no Ceará. No momento, há apenas circulação da P1 (Gama).
Também procurada pela reportagem, a Fiocruz Ceará informou possuir um sistema de vigilância “real, constante e ininterrupto desde o início da pandemia” para detectar diferentes cepas e que a “variante P1 está presente em 90% do Ceará”.
Mas de que forma o avanço da Delta no Brasil pode impactar a vacinação no Estado?
Ampliação da cobertura vacinal
De acordo com o epidemiologista e consultor da Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP-CE), Keny Colares, mudanças nas estratégias de vacinação - como aumentar o número de doses das vacinas ou alterar o tempo de intervalo entre elas - são questões de um “debate em aberto”, para as quais ainda não existem respostas prontas.
Porém, como a nova variante possui um nível de transmissibilidade maior, avalia ser ainda mais premente acelerar o ritmo de vacinação no Estado, tanto quanto for possível. De preferência, completando os esquemas vacinais, quando houver duas doses. Sem esquecer de tornar mais rigorosas as medidas de proteção contra o vírus.
“Existe um certo clima no País de que a pandemia acabou, e é preciso que a gente alerte as pessoas que é possível que elas tenham que voltar a adotar medidas de proteção, máscara e distanciamento num rigor maior ou menor, dependendo do que vai acontecer. É possível que a gente precise melhorar essas questões”, destaca o médico.
Epidemiologista, a pesquisadora e professora da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Thereza Magalhães, compartilha da mesma avaliação. “É preciso melhorar medidas sanitárias e vacinar mais rápido as duas doses porque só com as duas se fica protegido. É necessário correr com a vacinação, enquanto as vacinas ainda são eficazes contra a variante Delta. Principalmente para evitar internação e óbito”.
Apesar de variante Delta representar uma ameaça e o uso de doses de reforço seja uma tendência natural das doenças respiratórias virais, destaca a pesquisadora, ainda não há comprovação da necessidade de aumento de doses dos imunizantes disponíveis para contê-la.
"Já a diminuição no intervalo entre as doses, havendo dose suficiente, é algo interessante. Sobretudo, nos intervalos que favoreçam maior titulação de defesa imunológica".
Thereza Magalhães afirma ainda que, até o momento, a Delta é a “cepa mais contagiosa” do SARS-CoV-2. E por estar “bem adaptada”, deve se tornar a variante “soberana” no Brasil. Por provocar sintomas semelhantes aos de um resfriado comum, é mais difícil de ser diagnosticada.
“Ela transmite quase o dobro da primeira cepa original e tem 50% mais de transmissão que as outras cepas. Exceto a Gama”, cuja diferença é menor, de 34%.
Mais estudo e sequenciamento
Além do maior ritmo da vacinação e do rigor com as medidas sanitárias, os especialistas atentam para a necessidade de mais estudo e sequenciamento dos genomas de vírus detectados. O que ocorre de forma ainda tímida em todo o Brasil.
A Sesa, por sua vez, garante que o Ceará vem reforçando os protocolos de identificação e controle de circulação de novas variantes do coronavírus. Uma das ações é o acompanhamento, junto às unidades de saúde e ao Centro de Hematologia e Hemoterapia do Ceará (Hemoce), dos casos de Covid indicados para sequenciamento genômico.
“A Vigilância epidemiológica das novas variantes continua sendo realizada com objetivo de identificar outras cepas que já circulam no Brasil”, soma a Pasta.
Para Keny Colares, o Ceará vem, de fato, avançando nesse sentido, conseguindo identificar com maior celeridade e frequência as novas variantes. “Apesar de que tem muito o que a gente melhorar”.
Terceira onda pode chegar ao Ceará
Keny não descarta a chegada de uma terceira onda no Ceará nas próximas semanas, devido à nova cepa. No entanto, como parte da população está vacinada, a tendência é de que seja uma “onda menor”, se comparada às duas anteriores.
“Essa variante provavelmente vai se disseminar no País. É provável que, nas próximas semanas ou no próximo mês, a gente observe um aumento importante no número de casos e tém um aumento, talvez menor, no número de óbitos. Ou seja, uma onda menor do que a gente observou no período em que a gente não tinha a população vacinada”, afirma, ressaltando que a previsão também pode não se concretizar.
O consultor da ESP compara a situação do Brasil à Rússia. Frisa que, mesmo em países com boas coberturas vacinais, como os Estados Unidos, a variante Delta provocou um aumento de diagnósticos positivos de Covid-19. No entanto, a curva de óbitos se manteve estável, demonstrando que as vacinas hoje disponíveis são capazes de evitar as formas mais graves da doença.
“A Rússia está tendo agora um aumento do número de casos, e um aumento do número de óbitos. Claro que não tão acentuado quanto o número de casos, mas está tendo, mostrando que quem não tem vacina nenhuma está completamente desprotegido. Quem está com uma população muito vacinada vai ter problemas com essa variante, mas talvez mais de casos do que de óbitos”.
Rastreamento de casos e contatos
Tal como um maior sequenciamento do vírus, Keny Colares defende o rastreamento mais efetivo de casos e contatos com Covid-19.
“A gente não conseguiu desenvolver essa estratégia tão bem aqui no nosso País, que é desenvolver um sistema de vigilância baseado em equipes e em laboratório que consiga detectar rapidamente o indivíduo que tem sintoma, testar os seus contatos” e afastá-los do convívio presencial, em caso de diagnóstico positivo.
“Isso tem sido feito em alguns países com grande eficiência, fazendo com que se controle a circulação do vírus com essas medidas de vigilância bem restritas, bem cuidadosas”.
Vacinação no Ceará
O Ceará já ultrapassou a marca de 5 milhões de doses aplicadas, totalizando 5.075.031. Destas,
3.635.895 foram primeiras doses (D1) e 1.297.915 segundas doses (D2). O restante (141.221), de doses únicas (DU). Os dados são do Vacinômetro da Sesa, atualizados às 17h do domingo (18).
Em Fortaleza, foram aplicadas 1.726.093 doses dos imunizantes contra a Covid, sendo 1.295.027 D1 e 431.066 D2. O Vacinômetro da Prefeitura atualizou os dados pela última vez às 23h55 do último dia 14. Com isso, a Capital já alcançou 50% da população vacinada contra a Covid-19.