Proposta de Plano Diretor coloca Edifício São Pedro em zona onde novos prédios só vão até 12m de altura
O novo Plano Diretor está em discussão e deve ser votado esse ano. Com a proposição, o terreno do São Pedro ficaria em uma área protegida. Hoje o limite é de até 48 metros de altura na região em que a edificação está localizada
O Edifício São Pedro, na Praia de Iracema, em Fortaleza, aos poucos se converte em ruínas e a projeção da Prefeitura é de que a demolição iniciada na terça-feira (5) siga por 90 dias. Mas, a história da icônica edificação guarda ainda outros elementos: um deles é o fato de que Prefeitura no novo Plano Diretor (lei municipal que define de que modo a cidade deve crescer), que está em discussão na Capital e deve ser votado esse ano, propõe enquadrar o prédio ou, agora, o terreno dele, em uma zona de proteção em que há mais restrições para a construção de empreendimentos altos. No caso, nessa zona, a altura máxima das edificações é 12 metros. Para se ter dimensão, o Edifício São Pedro tem 22 metros.
A proposta do Plano Diretor de Fortaleza, disponibilizada publicamente pela Prefeitura no processo de revisão da atual norma, ainda não é definitiva. Logo, o que está esboçado nela poderá sofrer alteração até que o Plano, de fato, seja aprovado na Câmara Municipal e vire lei. Mas, o que está posto no documento sinaliza os entendimentos da gestão, a partir do processo de revisão do plano anterior e da projeção dos percursos futuros.
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Pelo atual Plano, que vigora desde 2009 e deveria ter sido atualizado em 2019, o Edifício São Pedro está em uma zona onde a altura máxima das edificações é 48 metros. Nesse cenário, pode ocorrer dos prédios serem maiores de forma legal em 2 situações:
- se tiverem sido construídos antes de 2009, quando esse limite passou a valer ou;
- se o construtor utilizar a Outorga Onerosa, um mecanismo no qual a Prefeitura concede o direito, mediante a análise e o pagamento de um valor por parte do construtor, de o imóvel ter uma altura acima do limite estabelecido inicialmente.
Agora, na proposição do novo Plano, o Edifício São Pedro passa a ser incluído em uma área específica da Praia de Iracema, chamada Zona de Patrimônio Cultural (ZPC). Nessas zonas há uma maior atenção aos bens culturais e a tentativa de preservação deles. Elas estão previstas também em trechos de outros bairros de Fortaleza e, em geral, guardam a semelhança de serem bem restritivas à construção de novas edificações.
No caso do trecho da Praia de Iracema, uma dessas limitações é a altura. Com esses parâmetros, a ZPC da Praia de Iracema pode ter prédios que tenham entre 4 e 6 andares, por exemplo, já que o limite é 12 metros. A atual edificação tem 22 metros e 7 andares. Mas, vale ressaltar que esse limites só passariam a valer após aprovação do Plano Diretor. Se alguma construção no local for autorizada antes, o limite é de 48 metros de altura, podendo ser mais alto em caso de concessão da Outorga Onerosa.
O que é essa mudança?
O Plano Diretor de Fortaleza está em revisão e a projeção é que o novo seja aprovado nos próximos meses. Esse plano é uma das principais leis municipais na área do planejamento urbano e é atualizado a cada 10 anos. O documento organiza e orienta como as cidades devem se desenvolver.
Nele, em geral, o município é dividido em zonas, que são marcações atribuídas a partir das características urbanas de cada bairro ou trecho dele. Cada zona não corresponde necessariamente a um bairro. Há casos em que um mesmo bairro é cortado por várias zonas diferentes.
Em Fortaleza, dentre outras definições, essas zonas são usadas, para estabelecer o limite de altura das edificações em cada porção dos 121 bairros. Logo, assim como na situação do Edifício São Pedro, a partir do zonamento do Plano é possível saber em quais trechos as edificações estão enquadradas e quais limites se impõem para novas construções naquele espaço específico.
Além disso, o Plano também apresenta outros parâmetros urbanísticos (recuos, área construída, índice de aproveitamento, dentre outros) para cada zona que podem restringir ou ampliar a dimensão das edificações que venham a ser construídas em cada território.
Situação do São Pedro
Na proposta em discussão, no novo Plano, o São Pedro fica na ZPC da Praia de Iracema. Essas zonas são previstas para trechos de alguns bairros de Fortaleza considerados territórios com bens culturais cujas características arquitetônica, artística, histórica, arqueológica e paisagística são significativos da memória da cidade. Elas estão em trechos dos seguintes bairros:
- Aldeota - ZPC 1
- Benfica - ZPC 2
- Centro - ZPC 3
- Jacarecanga - ZPC 4
- José de Alencar - ZPC 5
- Parangaba - ZPC 6
- Porangabussu (bairro Rodolfo Teófilo) - ZPC 7
- Praia de Iracema - ZPC 8
Mas, como já mencionado, essa zona não marca o bairro inteiro. Na Praia de Iracema, inclui um trecho que engloba o São Pedro e desce rumo à Rua dos Tabajaras e o entorno, incluindo prédios como o Estoril e Caixa Cultura, por exemplo.
Pelo atual plano, conforme estabelecido na Lei de Uso e Ocupação do Solo em Fortaleza (Lei Complementar 236/2017), a cidade tem algumas Zonas Especiais de Preservação do Patrimônio Paisagístico, Histórico, Cultural e Arqueológico (ZEPH), que pode ter semelhanças com as ZPC proposta agora. Inclusive há uma zona desta na Praia de Iracema mas, o Edifício São Pedro não está enquadrado nela.
Um dos limites para a ZEPH da Praia de Iracema é a Rua dos Arariús, que passa ao lado do São Pedro. No atual formato, o Edifício São Pedro está um subzoneamento dentro da Zona da Orla (ZO) da Praia de Iracema.
Na prática, em termos de altura, por estar na ZO Praia de Iracema, as edificações construídas na área do São Pedro podem ter até 48 metros de altura. Se estivesse na ZEPH poderia ter apenas 10,5 metros.
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Outro ponto é que na nova proposta, se o São Pedro estivesse na zona vizinha - que pega parte da Praia de Iracema e faz limite com a ZPC, a chamada Zona de Centralidade de Orla (ZCO) II, o limite de altura dos prédios vai para 72 metros.
Por que há uma proposta de mudança?
O Diário do Nordeste questionou à Prefeitura de Fortaleza o que fez o São Pedro ser enquadrado na ZPC e a titular da Coordenadoria Especial de Programas Integrados (Copifor), Manuela Nogueira, informou que a proposta é preliminar e que a inclusão do São Pedro na ZPC foi uma medida “alinhada pelos técnicos como um mecanismo de preservação da ambiência urbana”.
No caso, diz ela, embora esteja próximas a ZPC e a Zona de Centralidade de Orla, as características da Praia de Iracema o colocam na ZPC, pois está “em uma zona que tem toda uma característica para preservar a paisagem e ambiência urbana”, na qual há aspectos culturais e histórico a serem protegidos, bem como potenciais desta ordem, como as dimensões arqueológicas.
Ela acrescenta que normativas anteriores já evidenciam que a Praia de Iracema é uma “área que já está salvaguardada da função histórica da cidade”.
A arquiteta e urbanista e pesquisadora do Observatório das Metrópoles, Bruna Santiago, que tem acompanhado a tramitação do Plano Diretor de Fortaleza, diz que a inclusão no São Pedro na ZPC é um dos temas que não se tem clareza ainda sobre o porquê ocorreu.
“Não temos uma justificativa específica do porquê a mancha da ZPC da Praia de Iracema foi delimitada daquela forma. O São Pedro tem um papel importante nisso, embora eu ache que vai ser demolido antes da aprovação do Plano Diretor”.
A limitação da altura garante a preservação?
Para a arquiteta Bruna Santiago, o limite de altura pode ser um dos parâmetros que podem ajudar na redução da especulação em áreas de interesse histórico, pois, avalia ela, essa limitação “desestimula, de certa forma, a construção dos empreendedores imobiliários especialmente ali naquela porção da orla onde o interesse é colocar o máximo de unidades habitacionais ou salas comerciais dentro de um mesmo terreno para maximizar os lucros”.
Mas ela reforça que a restrição da altura não serve como um instrumento isolado e para garantir, de fato, a preservação em determinadas áreas da cidade é preciso utilizar outros instrumentos, inclusive os que já são previstos em leis existentes.
Já arquiteto e urbanista, conselheiro Estadual do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU/Ceará) e professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), Rérisson Máximo, pondera que embora a área tenha o limite de altura de 12 metros, outros parâmetros como o Coeficiente de Aproveitamento básico (que é quantas vezes é possível construir em metros quadrados acima de um terreno) podem gerar “pressão por parte de proprietários de imóveis e de agentes do setor imobiliário em construir edificações de maior altura”.
Nesse caso, pondera ele, “há o receio de que esses parâmetros possam ser flexibilizados, como aconteceu a partir da nova Lei de Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo de Fortaleza, sancionada em 2017 e que alterou bastante o zoneamento previsto inicialmente no Plano Diretor de 2009”.
O arquiteto também destaca que no processo de revisão de um plano diretor, “índices e parâmetros urbanísticos são sempre objetos de disputa. No caso do plano diretor em elaboração, essas disputas já vem ocorrendo mesmo antes de iniciado o processo de revisão”.
Ele também reforça que “o setor imobiliário tem interesse direto no aumento de alguns parâmetros urbanísticos, como os que permitiriam mais área construída em um terreno. Espera-se que o executivo municipal possa apresentar e o legislativo aprovar uma proposta final que equilibre essa correlação de forças e esses interesses conflituosos”.
Se tiver algum projeto agora, pode construir mais alto?
O arquiteto e professor Rérisson Máximo também pondera que a proposta do plano cria limitações e “de partida, a gente pode pensar que vai ser demolido e só vai poder ser construído prédios de 12 metros de altura”. Mas, acrescenta, no direito há o chamado direito de protocolo, portanto, “se já tiver sido solicitado, registrado ao na Prefeitura considerando a legislação anterior para construir prédios maiores, então o novo plano diretor não impactaria nisso”.
Ele complementa: “é possível que seja aprovado o plano diretor com essa restrição, mas ainda assim surjam alguns grandes prédios nessa região da praia de Iracema”.
O empresário Francisco Philomeno Gomes Júnior, integrante da família que detém 65% do São Pedro, questionado pelo Diário do Nordeste disse que os proprietários têm ciência dessa proposta que limita a altura das construções no terreno do São Pedro.
“O Plano Diretor considera aspectos culturais e históricos da Praia de Iracema. Entendemos isso. Mas sabemos também que precisamos de condições para fazer um empreendimento digno. Não estou falando do mais alto, nem com o melhor índice, mas a luz do que a Outorga trouxe para Fortaleza, a gente precisa de uma liberdade”.
Ele acrescenta que está acompanhando junto à Prefeitura o assunto e acredita que “vamos acabar chegando em um consenso sobre o que pode ser melhor para desenvolver um empreendimento legal lá”. Philomeno também avalia que na Praia de Iracema, para o lado da Av. Beira Mar “há um perfil” e no sentido da rua dos Tabajaras “há outro”.
“Vamos conseguir conciliar uma solução boa para a cidade e que a gente consiga fazer algo diferenciado por ali. Tenho conhecimento (da proposta do Plano Diretor). Apesar de saber que não há um entendimento completamente fechado. Estamos na mesa trabalhando e discutindo as oportunidades e soluções. Se pensamos no novo empreendimento, pensamos em algo que tenha envergadura. Mesmo que seja com um Plano Diretor com condições limitadas de solução”, ressaltou.
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