O socorro e a prevenção a desastres ambientais, como os deslizamentos que mataram três pessoas na serra de Aratuba e comprometeram outras comunidades em Uruburetama e Itapipoca, começa com a destinação de recursos financeiros. Nas três esferas de Governo - municipal, estadual e federal -, há orçamento previsto todos os anos para desenvolver essas atividades.
No Brasil, esses entes formam o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil (Sinpdec). Cada um deles possui responsabilidades específicas, e o Diário do Nordeste consultou os Portais da Transparência para verificar que recursos são previstos para o atendimento às ocorrências.
É importante lembrar que, na prática, a previsão orçamentária não significa que todo o valor é, de fato, usado pelo Governo. Além disso, não há impedimento para que outras secretarias destinem verbas para resolver problemas que entrem em suas áreas de atuação.
A nível federal, a União realiza transferências a Estados e Municípios em situação de emergência (SE) ou estado de calamidade pública (ECP), bem como para a execução de ações de prevenção em áreas de risco de desastres.
Para pleitear esse apoio, é fundamental o reconhecimento federal da situação de emergência e/ou estado de calamidade pública. Todas as etapas, desde a solicitação até a prestação de contas, são tramitadas por meio do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres (S2iD).
Por meio dele, Municípios e Estados precisam preencher formulários detalhando tanto as informações sobre o desastre e de quais ações de resposta ou reconstrução necessitam, bem como apresentar planos de trabalho.
Para o atendimento dessas demandas em 2023, o Governo Federal reservou R$1,17 bilhões. Embora pareça muito, é o menor valor em 14 anos, segundo levantamento da Associação Contas Abertas, especialista em orçamentos públicos. No ano passado, por exemplo, a previsão era gastar R$1,94 bilhões.
O Ministério do Planejamento e Orçamento explicou que a gestão anterior previa destinar, para 2023, recursos na ordem de R$671 milhões. O valor foi alterado e cresceu após negociação do governo de transição.
Neste ano, em atualização até o dia 17 de março, segundo o Portal da Transparência, R$237,5 milhões já foram empenhados (reservados para pagamento). Eles ajudam a custear sistemas de drenagem urbana em municípios sujeitos a inundações; obras de contenção de encostas em áreas urbanas; e a realização de projetos e obras de amortecimento de cheias.
Na observação da doutora em Meio Ambiente e Desenvolvimento e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC), Maria Elisa Zanella, um dos aspectos mais importantes ao se analisar as prioridades dos investimentos “é investir na retirada das pessoas das áreas de risco e reduzir a vulnerabilidade delas”, destinando “locais mais apropriados para a moradia”.
Orçamento no Ceará
Nas últimas semanas, as equipes da Defesa Civil do Estado Ceará têm atuado mais ativamente em municípios atingidos por chuvas intensas, prestando apoio a ações de gestão de desastres. Os recursos previstos no orçamento da área fazem parte do Fundo de Defesa Civil do Estado, responsável por gerir recursos para riscos e desastres. As ações incluem:
- Assistência a vítimas de desastres
- Restabelecimento dos serviços essenciais colapsados por desastres
- Recuperação de infraestruturas danificadas por desastres
- Execução de obras preventivas aos efeitos de desastres
Para 2023, estão reservados R$10,57 milhões, valor abaixo dos R$14,99 milhões do orçamento de 2022 e dos R$15 milhões de 2021.
Conforme balanço dos anos anteriores, nem tudo foi gasto. No ano passado, o valor total empenhado foi de R$1,81 milhões, de acordo com o Portal da Transparência - cerca de 12% do valor anual previsto. Em 2021, foram utilizados R$2,6 milhões, ou 17% do total.
Ao Diário do Nordeste, a Coordenadoria Estadual de Proteção e Defesa Civil do Ceará (Cedec) explicou que o orçamento se baseia na execução dos anos anteriores. Como nos períodos prévios nem tudo foi gasto, a diminuição foi possível.
Porém, isso não impede que aditivos financeiros sejam solicitados. “Diante da imprevisibilidade da ocorrência de desastres, são abertos créditos orçamentários na unidade gestora do Corpo de Bombeiros, com pequenos valores, os quais podem ser suplementados em momentos de crise que demandem montantes mais expressivos”, explicou em nota.
A previsão orçamentária contempla, por exemplo, a aquisição de material de ajuda humanitária, como cestas de alimentos, lençóis, toalhas e colchonetes.
A Defesa Civil estadual também atua no suporte técnico aos municípios, incluindo inspeções em áreas de risco e apoio à decretação de situação de emergência ou à elaboração de planos de assistência e restabelecimento da normalidade.
O órgão também complementou que, além do Fundo, conta com recursos do Governo Federal para custear a operacionalização da Operação Carro-Pipa nas sedes dos municípios em situação de emergência decretada por seca e estiagem.
A nível estadual, na última quarta-feira (22), deputados estaduais também aprovaram o projeto de lei do Governo do Ceará que prevê medidas a serem adotadas para enfrentar situação de emergência e calamidade pública, com foco no suporte às famílias que fiquem desabrigadas. A Secretaria de Proteção Social (SPS) poderá inclusive celebrar convênios com órgãos públicos municipais ou estaduais para efetivar as ações.
Aumento em Fortaleza
Na Capital cearense, situações adversas provocadas pelas chuvas se repetem ano a ano, como riscos de desabamentos, alagamentos e inundações. Em 2020 e 2022, os recursos previstos inicialmente chegaram a ser insuficientes diante da demanda, conforme o Portal da Transparência do Município.
Por isso, a gestão municipal tem destinado mais recursos ao atendimento a essas ocorrências. Em 2023, a Lei Orçamentária Anual (LOA) prevê a aplicação de R$1,32 milhões para “Proteção e Defesa Civil”. Até o fim de fevereiro, foram empenhados R$185 mil.
Em 2022, por exemplo, a LOA previa o uso de R$980 mil, mas o ano finalizou com R$1,24 milhões empenhados. Caso semelhante ao de 2020, quando se utilizaram R$983 mil, contra R$960 mil da previsão.
Segundo o coronel Eduardo Holanda, secretário municipal da Segurança Cidadã de Fortaleza, a ampliação do orçamento qualifica ações de prevenção de sinistros na Capital, que ocorrem durante todo o ano e especialmente antes do período mais intenso de chuvas.
“No ano passado, no que pese termos tido a quadra mais intensa dos últimos 20 anos, a gente não teve nenhuma família desabrigada ou desalojada porque a gente investiu e continua investindo na prevenção”, ressalta.
Conforme o secretário, o trabalho atua mais fortemente na limpeza de:
- 114 canais
- 7 mil bocas de lobo
- 24 sangradouros de lagoas
Ainda segundo o gestor, a Defesa Civil municipal recebe apoio de outras pastas, como a Secretaria de Infraestrutura, para a mitigação de áreas de risco através de medidas como drenagem e pavimentação. Há vários anos, havia 89 localidades com esse perfil, número que agora caiu para 65
“São áreas suscetíveis a inundação, deslizamento, deslocamento de massa, mas nem toda área que acontece alagamento necessariamente é de risco. Hoje já estamos com números bem relevantes em precipitação, as chuvas estão mais intensas, mas estamos suportando bem”, considera Holanda.