Foram registrados 1.830 focos de calor sobre o território cearense durante o mês de novembro, o que corresponde ao 4º maior número do País, conforme relatório publicado pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme). Esses são pontos onde a temperatura chega a 47°C e há risco de incêndio florestal.
O Estado só ficou atrás do Pará (8.188), Mato Grosso (3.705) e Maranhão (2.893) durante o mês. O dia 10 de novembro foi o mais crítico no Ceará com 333 detecções, quando liderou o monitoramento nacional.
Ao todo, o mês de novembro de 2023 teve o 2º maior número de focos de calor no Ceará, que teve uma situação superior apenas em 2011, quando foram 2.062 focos. A série histórica desse índice tem dados desde 1998. No momento, são usados 10 satélites para o acompanhamento.
“Nem sempre se torna uma queimada, mas na grande maioria das vezes sim: cerca de 75% dos focos”, explica o físico e doutor em meteorologia Francisco Vasconcelos Junior. São usados filtros para evitar confundir chaminés e outras estruturas industriais como foco de calor.
Os relatórios são encaminhados para a Defesa Civil como parte da estratégia para combater o fogo. A Secretaria do Meio Ambiente e Mudança do Clima (Sema) também analisa as informações.
“Tivemos muitos eventos no Sul e no Centro do Estado, associados às maiores temperaturas, baixa umidade e falta de chuvas, porque a vegetação fica seca”, detalha Francisco sobre as localidades mais afetadas.
No mês, as maiores temperaturas máximas foram registradas nos municípios de Barro (41.7ºC), Jaguaribe (40.7ºC) e Crateús (40.1ºC).
O monitoramento das cidades com os maiores números de focos de calor utiliza dados de todos os satélites e, por isso, a soma dos valores supera o total do Estado. Contudo, essa lista é usada para acompanhar a situação no Ceará:
- Mombaça: 1259
- Acopiara: 1104
- Icó: 597
- Crateús: 591
- Boa Viagem: 569
- Ipueiras: 550
- Granja: 510
- Tauá: 498
- Pedra Branca: 370
- Saboeiro: 368
Uma das explicações para o maior número dos focos de calor está na presença de mais matéria orgânica, que facilita as queimadas, nos municípios. “Nós tivemos uma estação chuvosa muito boa e a vegetação recuperada, então temos matéria orgânica para a queima”, frisa o especialista.
Para dezembro, a perspectiva é de ter mais chuvas por causa pré-estação, então os picos de calor devem diminuir ao longo do mês.
Áreas de preservação
Os focos de calor, que ao se tornarem incêndios ameaçam a vegetação e animais das localidades, afetam Áreas de Preservação Ambiental (APA) no Estado. Os satélites detectaram focos de calor em APA Federal, Estadual e em terras indígenas.
Em relação às áreas protegidas pelo governo federal, as unidades da Chapada do Araripe e da Serra da Ibiapaba tiveram maior incidência dos focos de calor.
Já na APA Estadual, a maior concentração de focos aconteceu na unidade de conservação Boqueirão do Poti, entre os municípios de Crateús, Poranga e Ipaporanga. Nas terras indígenas, assim como em meses anteriores, a unidade de conservação Tapeba teve o maior índice.
El Niño e o calor
O segundo semestre do ano no Ceará costuma ser mais quente pela ausência de chuvas e a maior incidência solar. Outubro, inclusive, é o mês com maior incidência da radiação solar. Mas neste ano, a formação do El Niño eleva o calor.
De acordo com Francisco Vasconcelos Junior, a sensação é de chaleira. "Temos uma baixa nebulosidade, o ar descendo impossibilitando a formação de nuvens e um vento mais fraco -- não temos o transporte de umidade que esfria o ambiente".
Além dessas condições de grande escala, que afetam muitas regiões do mundo, também há um cenário regional.
"Estamos com o Oceano muito mais quente no Hemisfério Norte e os ventos alísios não entram no nosso continente e essa característica se traduz em maiores temperaturas e menores umidades”, acrescenta sobre a situação.
Situação de seca
O Ceará voltou a ter 100% das regiões com áreas de seca relativa após 27 meses, segundo o Monitor de Secas de outubro, elaborado no último dia 20 de novembro. A situação não era vista desde julho de 2021, conforme o levantamento.
O Monitor das Secas é um acompanhamento regular e periódico do cenário de seca, da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), com a contribuição de outras instituições governamentais, estando disponível para acesso em locais como o site da Funceme.
Em 2021, o Estado vivenciou um baixo regime de chuvas que comprometeu o abastecimento dos açudes. O cenário só veio a melhorar com a pré-estação chuvosa de 2022. Em julho do ano seguinte, a seca atingia 16% do território.
Já em 2023, com uma boa quadra chuvosa alavancada pelo melhor mês de março em 15 anos, o Estado chegou a passar quatro meses sem seca relativa, entre março e junho.
Porém, em julho, a situação se alterou mais uma vez e a seca retornou a 33,7% das áreas. Com o decorrer dos meses, houve piora. Em setembro, apenas 18% do território estava livre do fenômeno, correspondendo a áreas do litoral.