Um total de 15.896 casos de dengue e chikungunya foram confirmados no Ceará até o início deste mês de dezembro. Apesar da redução nas estatísticas em relação a 2022, o Estado registrou uma média de mais de 1,4 mil casos dessas arboviroses por mês. Houve também 10 mortes confirmadas pelas duas doenças ao longo deste ano.
Os dados foram compilados pela Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) em um boletim epidemiológico publicado no dia 8 de dezembro. O documento tem como base notificações de dengue, chikungunya e zika registradas no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) e de dados do Sistema Gerenciador de Ambiente Laboratorial (GAL) das semanas epidemiológicas 1 a 49 deste ano — período de 1º de janeiro a 9 de dezembro.
Na última quinta-feira (14), o Ministério da Saúde anunciou que irá destinar para o Ceará mais de R$ 1,2 milhão para ações de fortalecimento da vigilância e enfrentamento a arboviroses. Além desse valor direcionado para o Estado, Fortaleza irá receber mais de R$ 2 milhões. Os recursos, provenientes do Piso Fixo de Vigilância em Saúde e do Fundo Nacional de Saúde, serão efetivados até o fim de 2023, em parcela única.
A doença com maior número de casos no Estado em 2023 foi a dengue, com 13.972 confirmações. Com isso, o coeficiente de incidência foi de 433,1 casos por 100 mil habitantes no Ceará. Desses casos, 220 foram de dengue grave e dengue com sinal de alarme. Também houve 8 mortes pela doença.
A Sesa apresenta uma redução no total de casos notificados (que incluem confirmados e descartados) na comparação com o mesmo período do ano passado. Em 2023, foram notificados 38.081 casos, frente a 104.611 em 2022. A queda no indicador foi de 63%.
Os casos confirmados de dengue concentraram-se na faixa etária de 20 e 39 anos. Ao todo, 43,1% dos casos — o que corresponde a 6.023 confirmações — ocorreu nessa população, enquanto 26,5% (3.626) foram registrados em menores de 19 anos. Além disso, a Secretaria Estadual aponta que mais da metade das pessoas com dengue foram mulheres (55,8%).
Dos 184 municípios cearenses, seis tiveram incidência muito alta da doença — quando o índice é maior que 1 mil casos por 100 mil habitantes. Foram eles: Brejo Santo, Groaíras, Jaguaribe, Jaguaretama, Porteiras e Tabuleiro do Norte. Já em relação aos 220 casos de dengue grave e dengue com sinais de alarme, 55,9% (123) ocorreram em residentes da Capital e 44,1% (97) em moradores do Interior.
Os 8 óbitos por dengue ocorreram em Fortaleza (2), Jaguaribe (2), Brejo Santo (1), Caucaia (1), Limoeiro do Norte (1) e Pacatuba (1). A Sesa destaca que as mortes ocorreram em pacientes com idades entre 10 e 77 anos e que 7 dessas mortes ocorreram entre mulheres.
Uma queda expressiva foi registrada nos índices relacionados à chikungunya. Neste ano, a Sesa apontou 1.924 confirmações doença enquanto 49.894 foram computados em 2022. A redução foi de 96,1%. A incidência acumulada foi de 21,9 casos por 100 mil habitantes, considerada baixa.
No período de 2016 a 2023, foram confirmados 191.279 casos dessa arbovirose, com epidemias registradas nos anos 2016, 2017 e 2022, "sendo 2017 o ano com maior número de casos confirmados e o mais impactante no cenário das arboviroses no Estado". Comparado ao triênio 2020 a 2022, o número de casos notificados em 2023 é superior aos registros de 2020 e 2021, mas 8,7 vezes menor que os notificados em 2022, pontua o documento.
O município de Tamboril teve destaque com incidência muito alta de chikungunya neste ano, enquanto Catunda registrou incidência alta e Jati e Jaguaribara tiveram incidência baixa. Dos dois óbitos confirmados pela doença, uma vítima foi uma menina de 10 anos residente de Choró. A outra foi um idoso de 88 anos morador de Catunda.
Também foi apresentado os dados relacionados à zika, que teve 11 casos confirmados entre os 1.073 casos suspeitos neste ano — o que corresponde a 1% de confirmação. O cenário é de baixa transmissão da doença no Estado.
Ana Cabral, coordenadora de Vigilância Epidemiológica da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), afirma que os dados refletem uma baixa circulação viral no Estado, ainda que tenham ocorrido "casos pontuais" das arboviroses em alguns municípios. Apesar da redução, ela aponta que o Estado tem clima propício para a reprodução do mosquito transmissor das doenças e, por isso, é "imprescindível" a população manter cuidados preventivos.
"Principalmente nesse momento que temos um número reduzido de casos, é um momento que temos para limpar o terreno, para nos prepararmos para uma fase chuvosa e um possível aumento de casos", afirma.
O infectologista Guilherme Henn, membro da diretoria da Sociedade Cearense de Infectologia (SCI), explica que, especialmente no Nordeste, existe uma variação natural na ocorrência dos casos das doenças. Ao observar as curvas epidêmicas ao longo dos anos, é possível perceber períodos de pico com um intervalo em que são registrados poucos casos.
“Estamos no período de 'vale', em que a coisa aparentemente fica mais calma. Mas, em geral, esses períodos de vale são seguidos depois de um tempinho de um novo período de pico”, afirma o médico.
Na visão de especialistas, é um erro gestores atribuírem esses períodos de “vale” unicamente a resultado de medidas de controle. “Em geral, essas coisas têm muito mais relação com a flutuação natural da curva epidêmica — já muito bem conhecida, há décadas — e com o baixo índice pluviométrico”, afirma Henn.
No caso da chikungunya, o infectologista explica que o vírus voltou a circular após anos sem casos expressivos da doença e encontrou uma grande população suscetível a ele. Até onde se tem conhecimento, só é possível pegar chikungunya uma vez. Isso tem influência na curva epidêmica da doença, que tende a não ter novos picos tão elevados quanto os anteriores, visto que há menos pessoas sem imunidade.
Provavelmente não vamos ter um boom de casos como tivemos lá na primeira onda, na segunda metade da década passada. (Naquela época) todo mundo era suscetível ao vírus. Agora provavelmente vamos ter alguns anos de ‘tranquilidade’, uma redução de casos, e provavelmente, daqui a alguns anos, as pessoas que não tiveram chikungunya ainda vão ter contato com o vírus.
A dengue, por outro lado, pode ser contraída até quatro vezes devido à existência de quatro sorotipos diferentes do vírus: DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4. Nesse contexto, o médico alerta para a recente volta da circulação do sorotipo 3 no Brasil após 15 anos.
Inicialmente, a identificação ocorreu em Roraima e no Paraná, no primeiro semestre de 2023, em estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Em novembro, casos da doença causados pelo sorotipo 3 também foram registrados em São Paulo, Santa Catarina (um caso importado de outro país) e Pernambuco.
Com isso, estão suscetíveis à infecção por esse sorotipo tanto as pessoas que não tiveram dengue tipo 3 no passado quanto todos com menos de 15 anos. “Isso é um prenúncio de uma explosão de casos”, destaca Henn. “Se tivermos uma temporada chuvosa mais abundante no final de ano, no início de 2024, é provável que a população de Aedes aumente e, se juntar à introdução do sorotipo 3, é muito provável que tenhamos um aumento expressivo de casos”, complementa.
CENÁRIO DAS ARBOVIROSES EM FORTALEZA
O 15º boletim epidemiológico produzido pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Fortaleza traz dados sobre o cenário das arboviroses na Capital. Publicado no dia 24 de novembro, o documento traz informações das semanas epidemiológicas 1 a 46 de 2023 (período de 1 de janeiro a 18 de novembro).
Até o começo de novembro (semana epidemiológica 44), houve 4.912 casos confirmados de dengue, enquanto no mesmo período de 2022 foram 16.586, demonstrando um cenário de baixa transmissão neste ano, quando comparado ao ano anterior. Em todo o intervalo analisado para 2023, foram confirmados 108 casos de dengue com sinais de alarme e 5 de dengue grave e dois óbitos.
Os casos de dengue registrados pela Prefeitura concentram-se de formas diferentes na Capital. Nas regionais I, II, III e IV foram identificadas áreas com alta intensidade de casos. Além de casos dispersos em outros bairros da Cidade, os focos de ocorrência em cada regional são:
Regional I
- Barra do Ceará
- Cristo Redentor
- Pirambu
Regional II
- Vicente Pinzón
- Cais do Porto
Regional III
- Pici
- Bela Vista
Regional IV
- Jardim América
- Bom Futuro
- Parreão
- Montese
- Vila União
A SMS também aponta cenário de baixa transmissão de chikungunya em Fortaleza. Enquanto entre janeiro e o início de novembro de 2022 teve 20.431 casos confirmados da doença, o mesmo período de 2023 registrou 313. Não houve óbito causado pela chikungunya neste ano, enquanto foram registradas 19 mortes na Cidade em 2022.
Houve uma concentração de casos confirmados nos bairros Cristo Redentor/Pirambu e Farias Brito, da Regional I. Outras pequenas aglomerações foram observadas nos bairros Bonsucesso (Regional III), Vila União, Aeroporto, Montese, Dendê (Regional IV), Planalto Ayrton Senna (Regional V) e Parque Dois Irmãos (Regional VI).
Quanto à zika, houve 201 suspeitas registradas na Capital em 2023. Destes casos, nenhum foi confirmado, 194 foram descartados e três estão inconclusivos. "Cenário de baixa transmissão e sem indicativo de mudança”, aponta a Secretaria Municipal.
MEDIDAS DE PREVENÇÃO
Adotar medidas de controle do vetor, o mosquito Aedes aegypti, é a principal forma de prevenir e controlar arboviroses urbanas, como dengue, zika e chikungunya. Deve-se estar atento para eliminar os criadouros, manter quintais limpos e recolher ou cobrir objetos que possam acumular água — como pneus velhos, recipientes plásticos, latas, tampas de garrafas e copos descartáveis, entre outros.
Essas medidas de prevenção e controle devem ser mantidas pela população durante o ano inteiro, "Independentemente de estar em um período chuvoso ou seco", destaca a coordenadora de Vigilância Epidemiológica da Sesa.
O principal local de transmissão, é realmente intradomiciliar. Então, cada um pode fazer a supervisão do seu quintal, ver aqueles recipientes que podem acumular água e lavar direitinho esses recipientes para evitar que haja a proliferação do mosquito. A (Secretaria da) Saúde trabalha tentando fazer o controle vetorial, o controle ambiental, mas a população também é um importante parceiro.
Viajantes e residentes de áreas de transmissão também devem adotar medidas de proteção individual — principalmente durante o dia. São elas: proteger áreas do corpo que o mosquito possa picar com o uso de calças e camisas de mangas compridas, aplicar repelente e utilizar itens como mosquiteiros sobre a cama e telas em portas e janelas.
Para a dengue também existe vacina. Aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em março, a vacina Qdenga, do laboratório Takeda, está disponível na rede privada.
“É uma vacina que tem bons resultados nos estudos, do ponto de vista de reduzir o número de casos e o potencial de gravidade da doença, e que recomendamos para os pacientes que possam pagar em uma clínica privada, enquanto ela não está disponível no SUS (Sistema Único de Saúde)”, diz o infectologista Guilherme Henn.
PRINCIPAIS SINTOMAS DAS ARBOVIROSES
DENGUE
Muitas vezes, pessoas infectadas não apresentam sintomas. Quando eles estão presentes, duram cerca de 3 a 5 dias. Na maioria dos casos, Guilherme Henn explica que os pacientes melhoram com adotando medidas como repouso e hidratação. “Uma proporção pequena das pessoas que têm dengue sintomática pode evoluir com dengue grave ou dengue com sinais de alarme”, complementa.
- Febre alta (acima de 38°C)
- Dor no corpo e articulações
- Dor atrás dos olhos
- Mal-estar
- Falta de apetite
- Dor de cabeça
- Manchas vermelhas no corpo
CHIKUNGUNYA
Ao contrário do que ocorre na dengue, a maioria dos infectados com chikungunya apresenta sintomas. “Os sintomas são parecidos. A diferença principal é que a chikungunya costuma ter mais dor nas articulações e a dengue costuma ter mais dor muscular. Nem sempre essa diferença fica clara tanto para a pessoa como para o médico que está atendendo”, explica o infectologista.
Outra diferença é que as complicações que levam ao óbito são mais raras que na dengue. Além disso, a chikungunya pode causar dores crônicas e necessitar de tratamento prolongado.
- Febre
- Dores intensas nas articulações
- Dor nas costas
- Dores pelo corpo
- Erupção avermelhada na pele
- Dor de cabeça
- Náuseas e vômitos
- Dor atrás dos olhos
- Dor de garganta
- Calafrios
- Diarreia e/ou dor abdominal (mais presentes em crianças)
ZIKA
A infecção pelo vírus da zika pode ser assintomática ou sintomática, geralmente com quadros leves e sem complicações severas na maioria das pessoas. O médico explica que a principal preocupação em relação à zika é com as gestantes, uma vez que o vírus é neurotrópico (tem afinidade pelos neurônios) e pode atingir o sistema nervoso central em formação do bebê, levando a alterações neurológicas, como microcefalia.
- Febre baixa (de até 38,5 °C) ou ausente
- Exantema (irritação na pele) de início precoce
- Conjuntivite não purulenta
- Cefaleia, artralgia, astenia e mialgia
- Aumento dos linfonodos (as chamadas ínguas)