A influenciadora digital Isabel Veloso, conhecida por compartilhar nas redes sociais a rotina de tratamento contra um câncer, causou repercussão na mídia após revelar a gravidez do primeiro filho neste mês. A jovem de 18 anos compartilhou que a gestação é de alto risco e está em cuidados paliativos.
Segundo a influenciadora, apesar de ter uma expectativa de seis meses de vida, ela não está mais em fase terminal e a doença se encontra estabilizada, sendo “apenas expectativa médica, não tempo certeiro”. A influenciadora explicou que seu quadro de saúde era tido como “terminal" devido à "previsão de tempo".
O debate sobre a fase terminal do câncer e os cuidados paliativos levantou dúvidas e provocou uma discussão entre os internautas nas redes sociais.
Isabel foi diagnosticada com Linfoma de Hodgkin, um tipo de câncer que se origina no sistema linfático, conjunto composto por órgãos (linfonodos ou gânglios) e tecidos que produzem as células responsáveis pela imunidade e vasos que conduzem essas células através do corpo.
O que é câncer terminal?
O termo "terminal" é considerado ultrapassado pela Academia Nacional de Cuidados Paliativos, que estabeleceu no Manual de Cuidados Paliativos, de 2009, que não se deve usar terminalidade para se referir ao estágio de um diagnóstico. Na verdade, a instituição recomenda o uso de "doença que ameaça a vida".
Diferenças do estágio da doença
O Instituto Nacional de Câncer (Inca) detalha que o estágio de um câncer é definido pelo grau de disseminação no paciente. Na 6ª edição da revista "ABC do Câncer" (2022), a instituição afirma que o sistema de estadiamento mais utilizado é o preconizado pela União Internacional Contra o Câncer (UICC), denominado Sistema TNM de Classificação dos Tumores Malignos.
Esse esquema de classificação é baseado na extensão anatômica da doença, considerando as seguintes especificidades:
- características do tumor primário (T);
- características dos linfonodos das cadeias de drenagem linfática do órgão onde o tumor se localiza (N);
- presença ou a ausência de metástases à distância (M).
Conforme a obra, esses parâmetros recebem graduações, geralmente de T0 a T4; de N0 a N3; e de M0 a M1, respectivamente.
O estádio de um tumor reflete não apenas a taxa de crescimento e a extensão da doença, mas também o tipo de tumor e a sua relação com o hospedeiro. Assim, além do TNM, a classificação das neoplasias malignas deve considerar também: localização, tipo histopatológico, produção de substâncias e manifestações clínicas do tumor, além de sexo, idade, comportamentos e características biológicas do paciente".
O que são cuidados paliativos
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define que os cuidados paliativos consistem na abordagem multidisciplinar focada em melhorar a qualidade de vida dos pacientes, e de seus familiares, no enfrentamento de doenças que oferecem risco de vida. E isso acontece através da prevenção e do alívio do sofrimento de ambos.
Segundo a geriatra e paliativista Cinara Franco, médica da equipe de Cuidados Paliativos do Hospital Universitário Walter Cantídio, os cuidados paliativos integram uma área nova da medicina que se propõe a tratar pacientes e familiares que estão passando por uma doença que ameaça a vida e a qualidade de vida. Não necessariamente esses pacientes precisam estar no fim da vida.
“É uma área nova da medicina que cuida de pacientes que têm doenças graves, que ameaçam a vida e a qualidade de vida, com uma abordagem holística, na tentativa de controlar sintomas físicos como a falta de ar, náuseas, vômitos, mas também controlar outros sintomas como o sofrimento espiritual, social, do ponto de vista psicológico. São muitos os desafios que a pessoa que está enfrentando uma doença grave precisa”, afirma a especialista.
A profissional destaca que esse cuidado é feito por uma equipe, com vários aspectos abordados de forma holística. “Geralmente, tem um médico, a enfermeira, psicóloga, assistente social, mas a equipe pode ser bem maior, outros profissionais podem estar nesse cuidado que se destina ao paciente que tem uma doença grave”, explica.
Cinara Franco destaca que esse cuidado pode acontecer em qualquer fase da doença, tanto numa fase inicial como em estágios terminais.
“Você pode cuidar daquele paciente para que ele passe pelo tratamento, por aquela fase com controle dos sintomas e com melhor qualidade de vida. Cuidado paliativo não significa que o paciente está morrendo, está em terminalidade, porque você pode oferecer os cuidados paliativos para um paciente que ainda tem chance de cura”, disse.
“Temos divulgado muito a importância de esclarecer para a sociedade, para os pacientes, para as famílias, de que o cuidado paliativo não significa morte, significa dar qualidade de vida a quem está sofrendo muito. Então, é um cuidado a mais por uma equipe especialista em trabalhar o paciente de forma holística”, sublinhou.
Segundo a "ABC do Câncer", são objetivos da modalidade:
- Promover alívio da dor e de outros sintomas que causam sofrimento, buscando a melhora da qualidade de vida do paciente, o que pode influenciar positivamente o curso da doença;
- Integrar os aspectos físico, psicológico e espiritual no cuidado ao paciente, por meio de equipes interdisciplinares, com profissionais preparados para esse tipo de abordagem;
- Promover os cuidados e as investigações necessárias para melhorar a compreensão e o manejo das complicações clínicas que causam sofrimento ao paciente, evitando procedimentos invasivos que não levem à melhoria da qualidade de vida;
- Oferecer suporte para auxiliar os pacientes a terem uma sobrevida o mais útil possível, de preferência usufruindo do ambiente familiar;
- Oferecer suporte para a família no período da doença e depois do óbito, em seu próprio processo de luto;
- Respeitar a morte como um processo natural do ciclo da vida, não buscando a sua antecipação ou o seu adiamento.
A instituição internacional recomenda que todos os pacientes com doenças graves, progressivas e incuráveis devem receber cuidados paliativos desde o diagnóstico. Ou seja, ser um indivíduo em cuidados paliativos não tem relação com estágio de avanço ou espalhamento de uma patologia.
Atualmente, existem critérios estabelecidos de recomendação para cuidados paliativos: no momento do diagnóstico; quando a doença é detectada em estágio em que a possibilidade de cura é questionável; ou quando já se esgotaram todas as possibilidades de tratamento curativo ou de manutenção da vida e a doença progride.”
No último caso citado pelo Inca na revista, geralmente, os pacientes apresentam sofrimento de moderado a intenso. O recomendado é que o encaminhamento para a abordagem de cuidados paliativos seja realizado enquanto o paciente apresenta condições de autocuidado, estimulando a autonomia dele pelo maior período possível.
Quais as diferenças das abordagens?
O tratamento de um câncer em estágio avançado, com ameaça à vida, e a aplicação de cuidados paliativos são abordagens que envolvem terapias e técnicas diferentes. No entanto, ambas possuem o mesmo objetivo: proporcionar melhor qualidade de vida ao paciente.
Segundo a "ABC do Câncer", o tratamento oncológico utiliza métodos como cirurgia, radioterapia e quimioterapia para curar, prolongar e melhorar a qualidade de vida do paciente. Já os cuidados paliativos recorrem a uma equipe multidisciplinar — que incluem médico, enfermeiro, assistente social, nutricionista e fisioterapeuta —, e consideram aspectos físico, social, emocional e espiritual para oferecer conforto e autonomia para o enfermo e os familiares.
Apesar de serem frequentemente associados a pacientes oncológicos em situação crítica, os cuidados paliativos também são opção para outras pessoas que possuem doenças graves, progressivas e incuráveis.