De morte a ordens de facção: motoristas de App listam ‘bairros inseguros’ para trafegar em Fortaleza

Devido a casos recentes, condutores estão proibidos de frequentar locais da Capital

A insegurança durante uma viagem solicitada por meio de aplicativos particulares é percebida pelos dois lados: o do motorista e o do passageiro. No Ceará, o cotidiano dos 'motoristas de APP' é marcado pelo temor se irão sobreviver ao dia de trabalho.

A reportagem do Diário do Nordeste apurou uma lista de bairros em Fortaleza tidos como 'inseguros' e evitados pela maioria. "A verdade é que a gente não tem liberdade pra andar em qualquer lugar, se a gente quiser resguardar a vida", conta um motorista.

Há pelo menos duas semanas, os condutores "estão proibidos" de transitarem no Pici. Agora, o impedimento foi estendido ao Genibaú. A Associação de Motoristas de Aplicativos do Ceará (AMAP) confirma que a determinação partiu de um comunicado emitido por uma facção criminosa.

Conforme Rafael Keylon, presidente da Associação, a mensagem veio em formato de 'salve': "No comunicado eles dizem que motoristas de aplicativo e entregadores de aplicativo não entrem no Pici pelos próximos dias, sob risco de serem alvejados. Há uma promessa de retaliação e confronto por lá depois da morte de uma criança", diz.

A criança foi vítima de bala perdida durante tiroteio iniciado por um homem que chegou em uma moto, se passando por condutor de aplicativo. Situação similar aconteceu no Genibaú, no sábado 27 de agosto. 

"Se for para deixar alguém nesses locais é só se for morador da comunidade. A regra é baixar o vidro e acender a luz interna do carro"
Rafael Keylon

A AMAP diz não haver uma lista fixa de "onde motoristas não possam ir", mas assume existir indicações e um consenso adotado dentre a categoria, que prefere se precaver de estar em determinados bairros, baseado em episódios violentos anteriores.

VEJA LOCAIS EVITADOS PELOS CONDUTORES:

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O presidente da Associação explica que o Canindezinho, por exemplo, "é onde tem mais registros de assaltos a motoristas". Já o Henrique Jorge integra a lista por ter dois casos de motoristas assassinados, nesse bairro.

"Nem toda periferia é perigosa. No Vicente Pinzón, por exemplo, não temos problema. Lá tem uma onda de respeito pelos motoristas. A gente também percebe esse respeito no Jangurussu, que há muito tempo não temos registros de violência", disse o representante da categoria.

MORTES

Em 2022, três motoristas de APP foram assassinados enquanto trabalhavam, no Ceará. As vítimas foram identificadas como: José Renato Pereira dos Santos, 36; Francinildo Antônio de Paiva de Oliveira, 48; e Jorge Alysson das Chagas Soares, de 23 anos.

Conforme a Polícia, José Renato e Francinildo foram vítimas de latrocínio (roubo seguido de morte). Os corpos dos dois foram encontrados na localidade de Sítio Serra dos Pequis.

Dois suspeitos pelo duplo homicídio foram detidos. Wesley Wilkinson Anjos dos Santos, já respondia por porte ilegal de arma de fogo, estelionato, apropriação indébita, e Álisson Barbosa da Silva não possuía antecedentes criminais.

Consta no processo que Wesley confessou ser autor dos dois homicídios, junto ao seu comparsa. Os crimes aconteceram nos dias 8 e 29 de março, em Barbalha. Alisson Barbosa agora pede absolvição sumária alegando insuficiência de provas. A a ação penal segue em tramite no Judiciário.

Já sobre o crime que vitimou Jorge Alysson, a Polícia Civil disse ter concluído o inquérito, mas não informou o nome do suspeito. A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) disse que as investigações do caso foram realizadas pela 5ª Delegacia do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa e os autos remetidos à Justiça.

COMBATE AO CRIME

A SSPDS informa que as forças de Segurança do Estado adotam uma série de estratégias para combater e prevenir ações criminosas que têm como vítimas motoristas de aplicativo. Um dos trabalhos citado é a "Operação Corrida Segura", desenvolvida pela Polícia Militar do Ceará (PMCE).

Conforme a Pasta, a operação funciona como ação preventiva de abordagem, para que os profissionais e os usuários sigam seus trajetos de forma segura.

"As ações policiais são realizadas a partir das análises de dados criminais, que apontam os dias, horários e locais onde são registrados os crimes com mais frequência. Com base no diagnóstico dos índices criminais, é possível realizar ações de combate a crimes nos transportes. Por meio desses levantamentos, estratégias diferentes são implementadas visando intensificar e qualificar as abordagens", disse a Secretaria.

"Durante a realização das ações policiais, os agentes da segurança pública contam com o auxílio de equipes do policiamento especializado e das câmeras do Núcleo de Videomonitoramento (Nuvid) da Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops/SSPDS), que cobrem as principais vias da Capital, Região Metropolitana de Fortaleza e algumas cidades do interior do Estado. O chamado “cerco inteligente”, ou seja, quando há acionamento de viaturas policiais e acompanhamento de operadores do Nuvid, é utilizado como ferramenta para abordar veículos considerados suspeitos de envolvimento em crimes".

A Pasta ainda destaca que paralelo ao policiamento ostensivo está a Polícia Civil, que trabalha na identificação e captura de infratores envolvidos com crimes contra esse público. "É imprescindível que os casos sejam comunicados às autoridades por meio de Boletim de Ocorrência (BO), feito em qualquer delegacia, ou via Delegacia Eletrônica (Deletron), pelo site: https://www.delegaciaeletronica.ce.gov.br/", pede as autoridades.