Apesar do crescimento em relevância nas últimas décadas, em que passou a ser notada, a Caatinga ainda tem um longo caminho a percorrer para se tornar uma prioridade em termos de proteção ambiental, apesar de toda a riqueza em biodiversidade. O Ceará, que está quase que integralmente nesse bioma, ao todo, 2,51% de seu território em Unidades de Conservação, sendo menos de 0,18% com Proteção Integral.
A situação é semelhante em todos os seis dos nove estados do Nordeste onde está a Caatinga, segundo estudo da Universidade Federal do Ceará. A pesquisa observou que 1,3% da área do bioma está em UCs com proteção integral, áreas naturais delimitadas por lei federal por serem passíveis de proteção pelas características especiais que possuem. O dado preocupa cientistas e protetores do bioma e alerta para a implementação de políticas públicas ambientais.
A área de Caatinga abrange mais de 70% do Nordeste e cerca de 11% do Brasil, que já é um dos maiores países do planeta. Uma área rica em fauna, que tem onça pintada assim como a Amazônia; em flora, com espécies vegetais encontradas apenas nela e com resiliência às condições climáticas.
A Caatinga é isso e muito mais. Do tupi “Mata Branca”, por muito tempo, até a primeira metade do século XX, era desprestigiada pela ciência - muito embora, curiosamente, foi destino da primeira (e única) expedição científica imperial, enviada por D. Pedro II na segunda metade do século XIX.
Muito tempo depois, mais precisamente em 2018, o pesquisador Lucas Teixeira, do curso de Ciências Ambientais da Universidade Federal do Ceará (UFC) decidiu mergulhar no seco do semiárido da Caatinga, conhecer nos papéis os dados oficiais e levantamentos feitos até hoje, até partir para sua própria jornada pelo conhecimento, fazendo do Bioma exclusivamente brasileiro seu objeto de estudo, que ultrapassou a graduação e hoje, tem avanços durante o mestrado.
“Acabei fazendo uma avaliação especial das Unidades de Conservação ao longo das ecorregiões da Caatinga. Ou seja, não a caatinga delimitada pelo IBGE, porque a diversidade desse bioma é possível agrupar em ecorregiões, que tem características congruentes”, explica Lucas Teixeira.
Ele observou as UCs do país e suas características, isso porque elas são divididas em grupos de proteção integral (onde estão as florestas, por exemplo) e de uso sustentável, que como o próprio nome diz pode sofrer a intervenção humana.
O problema encontrado é que observadas as duas áreas e cruzadas com as áreas que delimitam as ecorregiões, as Unidades de Conservação ocupam uma parte mínima, que de tão pequena chega a 1,3% do bioma. Todo o “restante”, portanto, é área desprotegida.
“A caatinga está entre os três biomas com menores extensões de áreas protegidas, com apenas 7,5% de unidades de conservação”, aponta o levantamento.
“Comecei esse trabalho numa disciplina da graduação e depois seguimos desenvolvendo esse estudo”, conta o pesquisador, que tem a orientação do professor Marcelo Moro.
A maior parte desse território são Áreas de Preservação Ambiental (APAs), que são passíveis de uso sustentável, mas na prática não é o que nós vemos em geral
São oito as ecorregiões da Caatinga:
- Complexo de Campo Maior
- Complexo Ibiapaba-Araripe
- Depressão Sertaneja Setentrional
- Planalto da Borborema
- Depressão Sertaneja Meridional
- Dunas do São Francisco
- Complexo da Chapada Diamantina
- Raso da Catarina
O Ceará está inserido na ecorregião Depressão Sertaneja Setentrional (DSS).
Desproteção
De posse de tantos dados e leituras georreferenciadas, o pesquisador Lucas Teixeira chegou à conclusão de que, comparado a outros biomas, as Unidades de Conservação na Caatinga são bastante tímidas, o que na prática representa desproteção.
“É preciso mudar essa realidade e vejo duas formas principais, sendo a principal delas o interesse da administração pública (nas três esferas) em querer instituir espaços protegidos, como as UCs. Mas isso vai da consciência do gestor público”, explica Lucas Teixeira.
O pesquisador cita como exemplo de iniciativa o Programa Cientista-Chefe Meio Ambiente, uma parceria entre Governo do Estado e universidades com a finalidade de aproximar gestores dos cientistas na academia.
Mas a nível federal, o Ministério do Meio Ambiente precisa estabelecer estudos e diretrizes de quais as áreas mais vulneráveis da Caatinga que precisam ter a preservação. Isso ainda não temos
O outro ponto para mudar essa realidade, na visão do cientista Lucas Teixeira, é pela efetividade da educação ambiental.
“Levar a conscientização para a sociedade: órgãos públicos, conselhos, sindicatos, escolas, meios de comunicação. O modelo de educação ambiental que temos hoje é muito superficial. As pessoas não têm a real noção da gravidade das questões climáticas”, explica Lucas, ao alertar para o risco de desertificação provocada pelo aquecimento global.